quarta-feira, 12 de fevereiro de 2025

5 concorrentes um tanto improváveis que o Toyota Bandeirante precisou enfrentar no Brasil

Interpretação abrasileirada da série 40 do Toyota Land Cruiser, modelo que foi responsável por abrir os mercados internacionais para veículos fabricados no Japão, o Toyota Bandeirante até hoje conquista fãs incondicionais. A robustez, o uso de motores Diesel fornecidos inicialmente pela Mercedes-Benz antes de congêneres estrangeiros sequer oferecerem uma opção semelhante, e a tração 4X4 que facilitavam o desbravamento dos mais ermos rincões pelo interior foram fortes argumentos de vendas em uma época que a atual moda de SUV parecia devaneio de ficção científica, mas algumas peculiaridades do Brasil faziam o Toyota Bandeirante precisar enfrentar até modelos com os quais parecia muito improvável de concorrer. Ao menos 5 merecem uma menção:


1 - Fusca: por mais bizarro que possa parecer, em alguns momentos na década de '60 a diferença de preços entre as versões mais austeras do Toyota Bandeirante e o Fusca se mantinha em cerca de 10%, aparentemente irrisória diante das principais diferenças conceituais e técnicas entre ambos os modelos. Naturalmente a incidência de impostos menor para utilitários tinha algum peso, bem como a percepção de um carro de projeto europeu parecer mais prestigioso enquanto veículos como o Toyota Bandeirante eram associados a estereótipos pejorativos quanto à população de áreas rurais. E guardadas as devidas proporções, o Fusca ter motor e tração traseiros que fizeram a boa fama da Volkswagen no início da operação brasileira e mantinham a concentração de peso mais próxima das rodas motrizes em diferentes condições de carga minimizavam as deficiências da tração simples nos terrenos mais bravios onde a tração 4X4 favoreceria o Toyota Bandeirante;


2 - Kombi: outro modelo que valia-se da disposição de motor e tração traseiros, a exemplo do Fusca, e que praticamente definiu a própria categoria no Brasil, acabou tornando-se uma concorrente indireta das versões pick-up do Toyota Bandeirante.
Considerando uma proposta de uso misto, lembrando que a pick-up Toyota Bandeirante dispunha da opção pela cabine dupla, pode até parecer mais razoável em comparação à Kombi;

3 - Gurgel X12/Tocantins: baseado na mesma concepção mecânica do Fusca, numa abordagem que foi competitiva diante da Ford que entre '67 e '83 ainda manteve a produção da linha Jeep incorporada com a aquisição da operação brasileira da Willys-Overland. É possível que a ausência de versões Diesel para o Jeep CJ-5 no Brasil, e o motor Volkswagen boxer refrigerado a ar sendo mais "à prova de burro" que o motor Ford 2.3 OHC usado a partir de '76 no Jeep brasileiro, nivelasse mais a improvável competição, mas pelo lado da Toyota era inegável que oferecer o Bandeirante com motores Diesel dificultasse uma resposta mais contundente da Gurgel até em função das regulamentações excessivamente restritivas no tocante ao uso de motores Diesel no Brasil com base nas capacidades de carga e passageiros ou tração;

4 - Gurgel Carajás: provavelmente o modelo mais peculiar, que recorria a motor dianteiro enquanto o câmbio estava incorporado ao eixo traseiro, e tração somente traseira, ainda baseado em componentes de origem Volkswagen modificados. Como a distribuição de peso entre os eixos era menos favorável na comparação a outros utilitários Gurgel ainda baseados na concepção básica do Fusca, fazia mais falta a tração nas 4 rodas para assegurar uma competitividade perante o Toyota Bandeirante, embora tivesse uma proposta mais urbanizada e análoga à moda de SUV que começou a tornar veículos utilitários mais desejados por um público essencialmente urbano;

5 - Lada Niva: em meio à reabertura das importações de veículos no Brasil no início da década de '90, o comodismo dos fabricantes então instalados no Brasil chegou a ser ameaçado, e até a Toyota que era a principal referência quanto a utilitários dotados de tração nas 4 rodas então praticamente sem nenhuma concorrência sentiu o baque com aquele vôo de galinha que foi a mal-sucedida incursão da Lada pelo mercado brasileiro. E de certa forma, em que pesem os contextos políticos e econômicos diferentes que levaram a exportação de automóveis a ser priorizada pela antiga União Soviética até como escambo por commodities produzidas em outras regiões, o Lada Niva acaba tendo uma fama comparável à do Toyota Land Cruiser J40 a nível mundial, e por extensão ao Toyota Bandeirante, mesmo com o contraste pelo Niva ter estrutura monobloco e suspensão dianteira independente.

sábado, 1 de fevereiro de 2025

Momento nostalgia: Cagiva Super City 125

Uma moto particularmente rara no Brasil, onde chegou através daquele convênio que a Agrale manteve com fabricantes de motocicletas baseados na Itália, a Cagiva Super City 125 foi fabricada entre os anos de '91 e 2001 na Itália, havendo poucos registros precisos sobre a montagem no Brasil em regime CKD a partir de componentes importados que teve início em '94 a cargo de uma antiga subsidiária da Agrale em Manaus, onde os incentivos fiscais da Zona Franca favoreciam a operação. Com o mesmo motor da Cagiva Mito 125, embora tivesse algumas diferenças até para permanecer enquadrada naquele limite de potência até 15cv (11kw) para uma das faixas de habilitação escalonada por potência para motocicletas na Europa, além da proposta de ser uma "funbike" antes que a categoria supermotard fosse consolidada e que acabava interferindo na geometria do sistema de escapamento, tinha um motor bastante moderno para os padrões de uma moto 2-tempos naquela época, embora o público generalista já estivesse muito mais receptivo aos motores 4-tempos por influência da Honda desde a época de mercado fechado para as importadas. A cultura motociclística italiana é muito diferente da brasileira, então o conceito de uma moto como a Cagiva Super City talvez tenha sido pouco compreendido no Brasil até em parte devido à percepção de uma cilindrada mais alta como fator determinante de prestígio.
O exemplar das fotos é do ano '95, e foi uma das atrações em uma exposição de motos no Iguatemi de Porto Alegre em setembro do ano passado, sendo certamente apreciada pelos fãs de motores 2-tempos que vão muito além daquela parte mais conservadora dos adeptos da Yamaha. Apesar dos esforços da Agrale e da Cagiva para trazer motos sofisticadas ao Brasil, o contraste com a abordagem muito mais conservadora das principais fabricantes japonesas já instaladas ou com representação oficial dificultava a inserção de motos com motores 2-tempos de pequena cilindrada que eram então bastante apreciadas na Itália, onde chegaram a haver até versões com motores ainda mais modestos para serem enquadrados nas regulamentações de habilitação que permitiam a condução de um modelo de 50cc até mesmo por adolescentes a partir dos 14 anos. E apesar da marca Cagiva ter deixado de ser usada em motocicletas para consolidar a MV Agusta que desde a década de '90 é mais focada em motos de alta cilindrada com um alto refinamento técnico, a Cagiva Super City 125 é um daqueles exemplos de quando os italianos ainda tentavam competir mais acirradamente com os fabricantes japoneses.

sábado, 25 de janeiro de 2025

Teria em algum momento a Kombi passado a ter uma importância maior que a do próprio Fusca?

Tendo cabido à Kombi a distinção de ser o último veículo da Volkswagen a ser equipado com o motor boxer de refrigeração a ar no final de 2005 para o ano-modelo 2006, tendo em vista o encerramento da fabricação do Fusca no México em 2003, já é um feito notável. Naturalmente a importância do Fusca a nível mundial é inegável, também no Brasil onde o tamanho compacto e a manutenção mais simples em comparação aos full-size tipicamente americanos foi fundamental para tornar o automóvel particular mais difundido, e tendo feito muito sucesso em países do sudeste asiático que ainda tinham uma relação tumultuada com o Japão antes do ex-presidente filipino Ferdinand Marcos promover uma normalização das relações, além de ser mais difícil apontar um automóvel convencional que possa ser considerado um efetivo sucessor para o Fusca tanto no âmbito técnico quanto como ícone cultural. Já no caso da Kombi, mesmo que fabricantes japoneses como a Toyota e a Mitsubishi tivessem obtido sucesso com utilitários leves de cabine avançada, ainda que substituindo a configuração de motor e tração traseiros com suspensão independente nas 4 rodas pelo motor central-dianteiro e tração traseira por eixo rígido, é possível dizer que a Kombi ter exercido maior influência sobre veículos de concepção mais moderna é indicativo de ter se tornado no mínimo tão relevante quanto o Fusca.
Em um país que chegou a ficar fechado às importações de automóveis, como aconteceu com o Brasil de '76 a '90, era de se esperar que Fusca e Kombi tivessem uma sobrevida longa comparada ao que ocorria na Alemanha onde foram desenvolvidos, visto que a concorrência no Brasil ficou praticamente nula, e as condições tanto econômicas quanto geográficas ainda favoreciam a configuração de motor e tração traseiros pela trafegabilidade em terrenos mais bravios mesmo dispensando o custo e complexidade de uma tração 4X4. E apesar do Fusca ter saído de linha no Brasil em '86, para ter uma breve volta entre '93 e '96 por motivos mais políticos que técnicos que beneficiou até a Kombi amparada pela inclusão no programa de carros populares pela mesma norma que beneficiou o Fusca diante dos concorrentes mais modernos com motor de 1.0L e refrigeração líquida, vale lembrar ainda que a Kombi brasileira chegou a ser o único Volkswagen oferecido na Indonésia entre '80 e '85 diante da ascensão dos concorrentes de origem japonesa, além de ter permanecido competitiva no Brasil durante a década de '90 pela facilidade de manutenção e o conservadorismo de uma parte considerável do público. Enfim, tendo em vista tanto uma maior competitividade em meio à ascensão de concorrentes a nível mundial quanto a distição de ter sido o último Volkswagen com motor refrigerado a ar, tendo permanecido em linha por mais 10 anos após o encerramento da produção do Fusca, eventualmente a Kombi possa ter mesmo passado a ter uma importância até maior que a do próprio Fusca...

quinta-feira, 23 de janeiro de 2025

5 motivos pelos quais o motor 2-tempos ainda mereceria uma sobrevida nas motos generalistas

Um tema que desperta discussões acaloradas, tendo em vista um entusiasmo que os motores 2-tempos ainda despertam junto a uma parte dos motociclistas por uma percepção de maior esportividade que se associou aos mesmos no Brasil em contraste com a imagem de simplicidade e resiliência a negligências na manutenção que os caracterizaram aos olhos de muitos asiáticos. Tomando a Yamaha RD 135 como referência por ter sido a última moto de perfil efetivamente generalista com motor 2-tempos vendida no Brasil, onde permaneceu em linha até '99 já como modelo 2000, é inegável que entre tantas diferenças conceituais podem ser apontadas vantagens e desvantagens, bem como alguns desenvolvimentos mais recentes e portanto restritos a modelos incomparavelmente mais especializados e importados podem dar a entender que ainda seria justificável que motores 2-tempos tivessem uma sobrevida nesse segmento. E ao menos 5 motivos me parecem razoáveis para, em que pese na atualidade absolutamente ninguém os levar mais a sério para um eventual uso em carros, a situação no mercado motociclístico ainda poderia ser diferente...

1 - lubrificação automática: embora o câmbio use o mesmo tipo de óleo das motocicletas com motor 4-tempos, muitos modelos que ainda dispunham de motor 2-tempos contavam com um reservatório de óleo separado do tanque de combustível, bem mais prático que tentar calcular a dosagem certa de óleo que deveria ser adicionado à gasolina durante reabastecimentos. Tal método também permitia variações na proporção de óleo em relação ao combustível em diferentes faixas de rotação, gerando economia do lubrificante e minimizando a fumaça, bem como diminuindo a formação de sedimentos carbonizados ao redor do eletrodo da vela de ignição. Vale lembrar que em muitos países asiáticos a antiga preferência pelo motor 2-tempos nas motocicletas devia-se a parecer mais fácil adicionar óleo à gasolina ou manter abastecido um tanque separado de óleo ao invés de fazer a troca de óleo de motores 4-tempos conforme os intervalos especificados pelo fabricante;

2 - evolução dos sistemas de injeção eletrônica: desde aqueles kits para retrofit de injeção direta que a ONG americana Envirofit propunha para uso em motos com motor 2-tempor e carburador nas Filipinas com base na tecnologia desenvolvida pela Orbital Engines australiana, e que ainda chegou a ser testada exaustivamente pela Ford na Europa e na Austrália para usos automotivos que acabaram engavetados, em que pese hoje ser comum a injeção direta em motores 4-tempos para uso automobilístico em meio a uma expansão do uso do turbocompressor, a injeção eletrônica que parecia mais facilmente adaptável a motores 4-tempos de modo geral também teve alguns desenvolvimentos especificamente direcionados a motores 2-tempos para uso em motos KTM e Husqvarna de competição off-road. Mesmo que a injeção direta tenha alguma complexidade, e posteriormente efeitos colaterais como aumentos nas emissões de material particulado devido a uma vaporização incompleta da gasolina antes da ignição e ao menos em motores 4-tempos também ocorrer um aumento dos óxidos de nitrogênio, a KTM ter passado a usar um sistema de injeção nas janelas de transferência (TPI - Transfer Port Injection) é capaz de proporcionar uma eficiência comparável à da injeção direta por só injetar quando as janelas de escapamento estejam fechadas durante a subida do pistão, eliminando perdas de mistura ar/combustível crua que ocorrem em motores carburados. O fato de ser irrelevante o uso de combustíveis gasosos em motos e similares, com exceção da Índia onde alguns triciclos utilitários tem versões aptas a usar gás natural ou gás liquefeito de petróleo (GLP - "gás de cozinha") e da China onde chegaram a ser fabricadas motos movidas a gás, também favoreceria o uso da injeção nas janelas de transferência, tendo em vista que motores 2-tempos poderiam ser ainda mais problemáticos que um motor 4-tempos de injeção direta no tocante à perda de combustível cru se fossem aplicados kits GNV comuns com os injetores adaptados junto ao coletor de admissão como se faz normalmente;

3 - simplicidade de alguns métodos para proporcionar maior elasticidade: enquanto para motores 4-tempos o desenvolvimento do comando de válvulas variável permitiu conciliarem um bom torque em baixa rotação a um desempenho menos "estrangulado" em alta rotação, nos motores 2-tempos o recurso a válvulas do tipo palheta na admissão que abrem pelo vácuo gerado no cárter durante a admissão e de um restritor nas janelas de escape cuja posição varia de acordo com a rotação proporciona resultados de certa forma análogos, permitindo um dimensionamento das janelas que favoreça o desempenho em alta rotação sem deixar o motor demasiadamente fraco em regimes mais modestos. Apesar da Yamaha só ter equipado com o sistema YPVS (Yamaha Power Valve System) no escapamento modelos com proposta mais sofisticada ou especializada que a RD 135, e o controle eletrônico usado nas motos de rua ter sido substituído pelo acionamento mecânico em algumas motos de competição que tinham o óleo misturado à gasolina porque o acionador mecânico para o YPVS era instalado onde de outra maneira poderia ficar a bomba de óleo do Autolube, o fato da injeção eletrônica já ter sido desmistificada nas motos talvez fizesse desconfianças quanto a um acionamento eletrônico do YPVS ficarem para trás;

4 - leveza e tamanho compacto: embora muitos motores 4-tempos atualmente mais usados nas motos generalistas modernas passem longe de ser excessivamente pesados e volumosos, é impossível negar que um motor 2-tempos possa ser invariavelmente mais leve e compacto simplesmente pela ausência de um sistema de válvulas convencional com o respectivo comando, diferença especialmente mais notável no cabeçote e que permitiria até uma posição mais centralizada da vela de ignição que pode favorecer uma propagação mais homogênea da centelha por toda a câmara de combustão;

5 - indução forçada ter pouca demanda nas motos: proporcionalmente em comparação aos carros, menos experiências com o turbocompressor foram feitas em motocicletas, tanto por fabricantes quanto por proprietários, e sempre mais restritas a motores 4-tempos porque um sistema de lubrificação por recirculação do óleo sob pressão é essencial para assegurar a durabilidade de um turbo. Até é possível usar um supercharger/blower em motores 2-tempos porque esse tipo de compressor mecânico pode ser lubrificado por salpico e com um circuito de óleo separado do restante do motor, a exemplo do que foi aplicado em motores 4-tempos pela Ford nas versões Supercharger do motor Zetec-Rocam 1.0 que chegou a concorrer com motores 1.0 Turbo da Volkswagen por um período um tanto curto depois do ano 2000.

terça-feira, 17 de dezembro de 2024

Toyota Rush: seria desejável no Brasil?

Em um mercado com escassas opções de minivans, como lamentavelmente tem sido o caso do Brasil em meio à hegemonia de SUVs que passaram a ser objeto de desejo da classe média urbana, me chama a atenção que especialmente a Toyota deixe passar as oportunidades junto a um público de gostos mais conservadores, tendo em vista a grande variedade de minivans que já oferece em outros países. Possivelmente uma minivan da Toyota que agradaria especificamente a uma parte do público que associa a marca a uma imagem de durabilidade a toda prova seja a Toyota Rush, atualmente produzida só na Indonésia mas também comercializada em países como o Paraguai, de modo que é relativamente fácil avistar exemplares no Brasil durante temporadas turísticas (ou carregando muamba na fronteira). A tração traseira e o motor longitudinal podem dar a impressão de ser um mero calhambeque dos tempos modernos, embora tenha o benefício de proporcionar menos interferências entre o conjunto motriz e a direção, e portanto a manobrabilidade em espaços mais restritos tende a ser melhor pela possibilidade de ter ângulos de esterçamento maiores, e assim o diâmetro de giro diminui e facilita manobras no ambiente urbano.

Apesar do brasileiro médio ter uma imagem mais prestigiosa tanto da Toyota quanto de outros fabricantes de origem japonesa, vale lembrar que em outros países predomina a percepção de serem uma alternativa mais econômica a concorrentes ocidentais, tendo em vista que a expansão da presença global dos japoneses foi às custas de fabricantes que no Brasil ficaram mais acomodadas entre '76 e '90 em decorrência da proibição das importações de veículos novos, e até a Toyota que manteve uma discreta operação mais voltada a utilitários ainda se beneficia da imagem de robustez que remonta àquela época. Mesmo que a linha Toyota oferecida no Brasil tenha hoje um predomínio de veículos de tração dianteira, e até alguns modelos com tração 4X4 tenham o motor em posição transversal, a aparente rusticidade da tração traseira por eixo rígido pode servir bem a uma parte do público já consolidado da Toyota e atrair outros, mas sem o rótulo de "carro popular" que os japoneses tentam evitar ser associados no Brasil, tal qual um cachorro vira-lata argentino que começasse a arrotar pedigree ao atravessar a fronteira com o Brasil. Enfim, por mais que seja praticamente ignorada, a Toyota Rush seria desejável no Brasil.

quarta-feira, 11 de dezembro de 2024

Daelim VT 125 Magma

Uma das poucas motos coreanas que chegaram ao Brasil quando uma euforia em torno dos importados atingia até modelos de pequena cilindrada, a Daelim VT 125 Magma também buscava atrair uma parte do mercado brasileiro insatisfeita com a austeridade então reinante entre modelos de produção nacional na mesma faixa de cilindrada. Outros modelos da Daelim também vieram ao Brasil no final da década de '90, tanto de apelo mais utilitário quanto scooters com uma proposta mais urbana, embora fatores tão diversos quanto as oscilações da cotação do dólar prejudicando uma competitividade do preço frente às motos de fabricação brasileira até uma rede de assistência técnica menos abrangente, antes das motos Daelim deixarem de ser importadas ao Brasil por volta de 2003. Posteriormente a Dafra voltaria a trazer motos Daelim para o Brasil, mas só alguns modelos esportivos, enquanto modelos do segmento custom como a Magma eram provenientes de fabricantes chineses.

quinta-feira, 7 de novembro de 2024

Honda Pop: ainda relevante no mercado brasileiro de motocicletas?

Originalmente lançada em 2006 já para o ano-modelo 2007, e com a declarada proposta de ter um custo operacional menor que o de usar o transporte coletivo, a Honda Pop surgiu inicialmente na versão 100 e ainda equipada com carburador, até que em 2015 já para o ano-modelo 2016 surgia a primeira Pop 110i já com a injeção eletrônica. Embora tenha sempre sido um modelo extremamente básico, a Honda Pop foi certamente decisiva para a Honda marcar território numa época que o dumping chinês no mercado de motocicletas no Brasil ganhava intensidade, especialmente no Nordeste mas também nas periferias de grandes centros das outras regiões, onde a competição no tocante ao custo com relação ao ônibus e a idéia de possuir veículo motorizado próprio é vista como ascensão social.

Agora em 2024 para o ano-modelo 2025, finalmente a Honda Pop 110i passou a dispor da conveniência da partida elétrica, bem como a embreagem automática que a bem da verdade me surpreendia nunca ter sido oferecida nesse modelo por ter sempre compartilhado muitos elementos mecânicos com a Biz, e ao atrair eventualmente usuários sem tanta experiência anterior com motocicletas a embreagem automática já fosse um atrativo tão forte quanto a própria tradição da Honda frente a alguns concorrentes chineses cuja presença no Brasil foi muito breve. A princípio, além de alguns fatores que acabaram fomentando o lançamento da Honda Pop persistirem como a preferência pelo transporte individual em detrimento do público exacerbada pela deflagração da crise do coronavírus chinês em 2020 e o agenciamento de transporte tanto de pequenas cargas quanto de passageiros proporcionando oportunidades de trabalho que rentabilizam o uso da moto, pode-se dizer que a Honda Pop ainda é relevante no mercado brasileiro de motocicletas, e também podendo atrair usuários novatos em função dos preços exorbitantes que os carros "populares" novos tem apresentado.

sexta-feira, 1 de novembro de 2024

Mazda: teria perdido a última oportunidade de reabilitar o motor 2-tempos em automóveis generalistas?

Um dos fabricantes mais reconhecidos a nível mundial pelos avanços na engenharia, a Mazda fez fama com algumas abordagens pouco ortodoxas em diferentes momentos históricos, desde a antiga tentativa de substituir todos os motores convencionais pelos Wankel pouco antes da eclosão das primeiras crises do petróleo até a implementação do programa Skyactiv Technologies que começou durante a 2ª geração do Mazda 3. Inicialmente com esforços direcionados a melhorias nos motores e câmbios, de modo a ser implementado com relativa celeridade antes de uma mudança completa de geração do modelo, chamava a atenção por algumas condições que sugeriam haver espaço para algumas soluções ainda mais radicais eventualmente poderem ser implementadas. No caso dos motores, tendo em vista que a Mazda seguia a abordagem comum a outros fabricantes japoneses que à época priorizavam a aspiração atmosférica em detrimento do turbo, é possível deduzir que havia como reabilitar o motor 2-tempos em automóveis.

O ciclo de produção da 2ª geração do Mazda 3 foi do final de 2008 a meados de 2013, já incluindo uma atualização para o ano-modelo 2012 que incluía a apresentação dos motores Skyactiv-G inicialmente de 2.0L e cabendo ao Mazda 3 essa primazia, já durante aquele período que a Ford diminuía a participação acionária na Mazda, no rescaldo da crise econômica de 2008. E mesmo considerando que os primeiros motores Skyactiv-G são de certa forma uma evolução dos antigos motores L da Mazda, que seguem em uso pela Ford sob a denominação Duratec, já vale destacar que os antigos vínculos com a Ford podiam até eventualmente resultar em oportunidades para testar a mesma tecnologia desenvolvida pela empresa australiana Orbital Engines (atual Orbital UAV - mais focada a sistemas de propulsão para drones) com a qual a Ford chegou a trabalhar no desenvolvimento de um motor 2-tempos para uso automotivo. Pela principal característica em comum que o motor Skyactiv-G mesmo sendo 4-tempos acabava tendo em comum com os protótipos de motor 2-tempos testados pela Ford em parceria com a Orbital é a injeção direta, e que até recentemente ainda poderia ser considerada incomum na produção seriada no tocante a motores de aspiração atmosférica, já dá margem a especulações quanto à eventual serventia de motores 2-tempos em automóveis generalistas até a atualidade, inclusive considerando uma adaptabilidade ao uso de combustíveis alternativos como o álcool/etanol e até combustíveis gasosos.

Posteriormente algumas versões de motores Mazda Skyactiv-G passaram a incorporar o turbo, e assim talvez a economia de escala para produzir um único projeto básico de motor 4-tempos e as respectivas variações para acomodar tanto a aspiração atmosférica quanto a indução forçada inibisse experiências com motores 2-tempos que diferissem mais na cilindrada, além do mais que em algumas regiões como a maior parte da Europa Ocidental permanecia em vigor o uso de uma fórmula matemática diferenciada para calcular a incidência de impostos "corrigida" em desfavor dos motores 2-tempos. Como o avanço do turbo, principalmente em conjunto à injeção direta que permitiu reduzir o enriquecimento da mistura necessário para mitigar o risco de pré-ignição, esteve muito vinculado a um favorecimento burocrático a motores de menor cilindrada observado também no Brasil e partes da Ásia por exemplo, o cálculo da potência fiscal ter abordagens diametralmente opostas quanto ao ciclo 2-tempos que é deliberadamente prejudicado e a indução forçada sobre a qual inexiste qualquer fator de multiplicação passou a ser o fiel da balança. Até seria possível fazer um motor 2-tempos com a cilindrada proporcionalmente diminuída para manter o enquadramento na mesma potência fiscal de um Skyactiv-G, tanto de 2.0L conforme foi usado no Mazda 3 de 2ª geração quanto em outras configurações com cilindrada diferente que viriam a ser lançadas posteriormente, mas pelo fato do turbo invariavelmente depender da lubrificação forçada e por recirculação mais frequentemente associada aos motores 4-tempos qualquer outra abordagem como a possibilidade de usar um compressor mecânico (supercharger/blower) que pode recorrer à lubrificação por salpico com o fluxo do óleo segregado do motor poderia se fazer necessária pela competitividade.

A mesma injeção direta que foi especulada como uma possível "salvação" para os motores 2-tempos na época dos testes conduzidos pela Ford, e que chegou a ter aplicações náuticas recreativas e até militares quando a Bombardier aplicou tecnologia semelhante em motores de popa Evinrude, tem revelado ser na prática uma faca de dois gumes a ponto de já ser exigido em algumas regiões o uso de filtro de material particulado em motores a gasolina ou flex com injeção direta, tal qual já vinha ocorrendo com motores Diesel anteriormente. Portanto, resultados melhores que vem sendo apresentados com o uso da injeção nas janelas de transferência (TPI - Transfer Port Injection) em algumas motocicletas off-road de motor 2-tempos de fabricantes como KTM e Husqvarna talvez pudessem ser replicados em uso automotivo, e a Mazda permanece apostando na aspiração atmosférica em motores a gasolina parece um precedente a ser destacado. No fim das contas, aparentemente a Mazda acabou perdendo aquela que seria a última oportunidade para reabilitar o motor 2-tempos em automóveis generalistas...

sexta-feira, 25 de outubro de 2024

Abrir mão do motor da CG varetada foi um erro da Honda no Brasil?

Que a Honda CG 125 é um grande sucesso, comparável a como o Fusca foi decisivo para consolidar a Volkswagen no Brasil, é inegável, e certamente foi decisivo o motor com comando de válvulas no bloco popularmente conhecido simplesmente por varetado que foi o padrão desde o lançamento nacional em 1976 até 2003 para ser iniciada gradualmente a substituição por um motor com comando de válvulas no cabeçote em 2004. Mesmo tendo seguido em uso o motor 125cc varetado até 2009 quando essa faixa de cilindrada também passou a dispor do comando de válvulas no cabeçote, e em 2004 abrir espaço para a faixa de 150cc já com comando no cabeçote e chegando a 160cc em 2016, com a 125 saindo de linha definitivamente em 2019, as antigas varetadas das 5 gerações que usaram esse motor seguem marcando presença por todo o Brasil. A facilidade de manutenção aliada à robustez fizeram do motor 125 varetado um ícone do motociclismo, figurando também entre os motores mais copiados do mundo.
Lembrando também que a Honda CG 125 de 5ª geração vem sendo a moto mais copiada na China, com inúmeras empresas atuantes em países periféricos fazendo o outsourcing junto aos chineses e aplicando as próprias marcas, como chegou a ocorrer até no Brasil a partir do momento que a Honda já se voltava contra uma imagem de "arcaico" atribuída injustamente a esse motor, é discutível até que ponto abdicar do motor varetado tenha sido uma decisão totalmente acertada. Como a nomenclatura CG acabou sendo apresentada para diferenciar da linha CB que sempre usou comando de válvulas no cabeçote e acionado por corrente, que acabou sendo menos competitiva perante outros fabricantes de motocicletas de origem japonesa por ser mais vulnerável a negligências quanto à observância dos períodos para a troca do óleo do motor, o comando de válvulas no bloco na CG varetada com a sincronização só por engrenagens foi essencial para que a Honda fosse levada a sério no mercado das motos utilitárias de pequena cilindrada antes dominado por motores 2-tempos, tanto de outras japonesas como a Suzuki e a Yamaha quanto das scooters Vespa e Lambretta de origem italiana. E se por um lado o tamanho compacto do motor da CG a princípio dificultasse aplicar algumas modernidades, como a variação de fase no comando de válvulas já aplicada por exemplo no motor Ford Godzilla V8 cujas versões de 6.8L e 7.3L mesmo varetado ainda foi capaz de substituir motores V8 de 6.2L e V10 de 6.8L com comando nos cabeçotes que chegaram a ser usados em caminhonetes full-size, por outro foi precipitado a Honda descartar uma possibilidade de recorrer a algumas melhorias que poderiam manter o motor da CG varetada competitivo e enquadrado às normas de emissões vigentes como a injeção eletrônica e o catalisador.
A presença ainda muito frequente da CG varetada em usos estritamente profissionais no Brasil denota a viabilidade de manter um motor "velho" que ainda poderia ter sido capaz de reter uma parte do público para a Honda diante do forte dumping chinês, e mais recentemente a ascensão de concorrentes indianas que se apresentam como uma opção de custo reduzido entre as motocicletas utilitárias básicas, mesmo diante da necessidade de incluir a injeção eletrônica e o catalisador como até a Kombi já usava antes de ter o motor 1600 boxer refrigerado a ar substituído pelo 1.4 de refrigeração líquida em observância às normas Euro-3. Assim como o próprio motor da CG varetada apresentou algumas evoluções por vezes subestimadas quando o objetivo é simplesmente reputar como obsoleto, como o uso de um jato de óleo sob pressão abaixo do pistão para auxiliar na refrigeração sem depender de uma mistura ar/combustível demasiadamente rica para tal finalidade, medida aplicada a partir de 2004 quando a CG varetada passou a ser disponibilizada só como modelo de entrada nas versões Fan e Cargo, é inegável que ainda poderia receber recursos hoje obrigatórios em praticamente qualquer moto nova à venda no Brasil para atender às normas de emissões Promot 4 que muito em breve darão lugar à Promot 5 como a injeção eletrônica e o catalisador. Naturalmente ainda haveria espaço no mercado brasileiro para os motores com comando no cabeçote em modelos mais voltados essencialmente ao uso particular ou recreativo, tal qual ocorre em regiões mais lenientes no tocante às regulamentações aplicáveis a motocicletas novas que permitem à Honda dar continuidade ao legado da CG varetada, sem entrar no mérito de como fabricantes chineses já chegaram a expandir a cilindrada para faixas de 150 a 200cc a partir do projeto desse mesmo motor.
Certamente a existência de um contingente de hondeiros convictos, e que justificou até a introdução da versão Fan que na época do motor varetado ainda era um modelo de entrada que se valia mais da força da marca para desafiar o dumping chinês que se amparava no baixo preço, proporcionou uma suavidade para a Honda fazer a transição rumo a uma linha completa com motores de comando no cabeçote, mas é impossível apontar pura e simplesmente o comando no bloco como "arcaico". Assim como até motores da linha tradicional da Harley-Davidson mantiveram o comando no bloco, mesmo já usando 4 válvulas por cilindro e corrente de comando nos Milwaukee Eight, deixando claro que um motor varetado nunca foi impedimento para a injeção eletrônica e o catalisador hoje essenciais no Brasil, eventualmente uma parte considerável do antigo público da Honda CG 125 permaneceria fidelizado quando optasse pela aquisição de uma motocicleta 0km sem nem considerar arriscar motores "genéricos" tanto chineses que se resumiam a cópias da CG varetada quanto já com comando no cabeçote de concorrentes tradicionais. No fim das contas, mesmo ainda conseguindo boas vendas tanto pela força da marca quanto pela ampla rede de concessionárias por esse Brasil afora, pode ter sido um erro a Honda abrir mão do motor da CG varetada.

terça-feira, 22 de outubro de 2024

Um desagravo à Kombi com o motor refrigerado a água

Que a Kombi foi o modelo com o mais longo ciclo ininterrupto de produção brasileira já é algo público e notório, bem como ser alvo de tantas críticas quanto ao projeto antigo que recebeu algumas evoluções em doses homeopáticas, culminando ao final de 2005 quando passou a usar o motor 1.4 flex a gasolina e álcool/etanol com refrigeração líquida e 4 cilindros em linha no lugar do boxer 1.6 refrigerado a ar e com os 4 cilindros horizontais em versões só a gasolina ou só a álcool. Tendo resistido à competição com vans importadas a partir da reabertura do mercado brasileiro no começo da década de '90 ainda no governo Collor, e até entrado no programa do carro popular como contrapartida do ex-presidente Itamar Franco para viabilizar junto à Volkswagen um retorno do Fusca ao mercado brasileiro, é constantemente apontada de forma pejorativa como retrato de um atraso do Brasil no tocante aos automóveis nacionais. O que talvez muitos críticos da Kombi ignoram é o próprio público do modelo ainda ter sustentado uma demanda constante que praticamente dispensava investimentos em ações de publicidade e propaganda, tanto em função de uma concepção conservadora e essencialmente voltada ao trabalho quanto algumas condições operacionais a tornarem uma opção mais eficiente e de menor custo.

Tratar como mera gambiarra e desrespeito da Volkswagen para com o público brasileiro a permanência da Kombi no Brasil até 2013 já considerando a substituição do motor, e ignorar algumas condições bem mais complexas tanto da economia quanto de muitas vias públicas pelo interior e pelas periferias, é uma demonstração de profundo distanciamento com relação aos vários contextos especificamente brasileiros que praticamente exigiram uma continuidade do modelo. E sejamos francos, assim como as normas de emissões tiveram um peso para o motor boxer refrigerado a ar sair de cena com a chegada do motor de refrigeração líquida e cilindros em linha, foi necessário um recrudescimento das normas de segurança a partir de 2014 para que fizesse sentido a Volkswagen cogitar um encerramento da fabricação da Kombi, que ainda teria conseguido mais uma sobrevida se fosse oferecido freio ABS e talvez airbag, lembrando que a diferença entre o maior peso do motor refrigerado a água para o boxer foi o que deu causa a uma necessidade de atender também à obrigatoriedade de airbag duplo ao menos para a Kombi Standard em função da capacidade de carga nominal ter ficado abaixo de uma tonelada e acomodar só 8 passageiros além do motorista, portanto ficando de fora da isenção de obrigatoriedade do airbag que foi aplicada a veículos utilitários seguindo o mesmo princípio aplicado para permitir ou vetar o uso de motores Diesel no Brasil. Enfim, a Kombi ainda oferece uma inestimável contribuição para o progresso brasileiro, por mais que alguns insistam em ignorar tal fato em nome da busca pela "modernidade" a qualquer custo...