Como o inferno está cheio de boas intenções, entidades governamentais sempre aparecem com alguma resolução esdrúxula, e não foi diferente com o Conselho Nacional de Transito (Contran) que, sob o falso pretexto de promover a segurança veicular, simplesmente proíbe ou cria entraves burocráticos sem nenhum fundamento técnico. Se por um lado podem argumentar que a intenção é evitar alterações
Para os adeptos do off-road recreativo, por exemplo, é comum o uso de pneus mais altos, mas tal modificação é "perigosa" de acordo com os burocratas do Contran. De fato, um diâmetro maior dos pneus altera a calibração do velocímetro, ainda que não seja tecnicamente inviável recalibrar para permanecer de acordo com margens de segurança.
Alterar a suspensão é um ponto que acende polêmicas: há quem acredite ainda ser proibido o rebaixamento, quando as restrições em vigor referem-se às suspensões reguláveis, sem diferenciação entre suspensões "de rosca", eletropneumática (a ar), ou eletro-hidráulica (Hydroactive) como é usada em diversos modelos da Citroën.
Não havendo embasamento técnico para justificar a proibição, a altura do facho dos faróis serve de pretexto. Nada impede, no entanto, a adaptação de um sistema de ajuste automático do facho, já exigido para o uso de faróis de xenônio, e que resolve facilmente o entrave com as suspensões auto-ajustáveis.
Não custa nada recordar a evolução notável proporcionada pela suspensão eletropneumática ao conforto nos ônibus, filtrando melhor as irregularidades de diferentes terrenos, e por manter o nivelamento da carroceria sob condições adversas até melhora a estabilidade direcional. Em caminhões, promove uma maior segurança no transporte de cargas sensíveis e/ou perigosas.
Além disso, ao permitir alterações no vão livre de acordo com os obstáculos a serem encontrados no trajeto, viabiliza uma significativa redução no consumo de combustível ao trafegar numa via com boa pavimentação devido a uma diminuição no arrasto aerodinâmico ao manter uma menor distância livre do solo, sem impor um comprometimento definitivo à capacidade de incursão em terrenos hostis.
Outro ponto que trouxe incomodações está relacionado à substituição de chassis, atrapalhando colecionadores de modelos antigos. Por exemplo, substituir o antigo chassi original de uma International KB-1 da década de 40 pelo chassi de uma Ford F-1000 mais recente, mantendo o veículo documentado de acordo com a carroceria ao invés do chassi.
A substituição de chassi uma boa alternativa para manter a segurança veicular quando o original está muito deteriorado ou danificado, além de eventualmente ser uma forma de facilitar a manutenção de um modelo mais raro ou com peças escassas, como foi o caso de alguns carros franceses durante o período em que a importação de automóveis e componentes estava mais restrita devido às leis de reserva de mercado. Pode-se dizer sem medo de errar que, durante a década de 70, a adaptação de chassis de Fusca em carros franceses, como o Simca 8, salvou alguns exemplares de um destino sombrio em algum ferro-velho...
E com as substituições de chassi, vem outro ponto controverso: alterações no sistema de suspensão. Trocar um vetusto eixo rígido com feixe de molas por uma suspensão dos tipo McPherson, Double Wishbone, braços semi-arrastados com mola helicoidal ou até mesmo os arcaicos semi-eixos oscilantes usados na traseira do Fusca e na dianteira de pickups Ford, por mais que possa melhorar o conforto e na maior parte dos casos a estabilidade, vem sendo usado em alguns casos como pretexto para impedir a emissão do Certificado de Segurança Veicular. Diante do cenário em alguns mercados mais desenvolvidos, onde é possível comprar um chassi 0km para uso em modelos clássicos já com os upgrades adequados para enfrentar as atuais condições de tráfego com o máximo de segurança e conforto, parece uma piada de extremo mau-gosto...
Outro aspecto controverso é quanto a freios: no caso da Chevrolet S10 da foto acima, transformada num monster truck, o uso de freios a tambor nas 4 rodas me parece um contra-senso, ao considerar que no modelo original há discos ao menos para as rodas dianteiras. Trata-se de um veículo restrito a exibições, não podendo trafegar por vias públicas, mas o caso serve apenas para fins ilustrativos. Em outras situações, onde há o interesse em substituir precários freios a tambor por freios a disco, o proprietário do veículo pode enfrentar uma verdadeira via-crucis junto ao Detran caso a alteração seja constatada numa inspeção veicular...
Mais um absurdo burocrático está relacionado à substituição de motores: de acordo com as atuais diretrizes, só seria permitido substituir um motor por outro que tivesse uma diferença de potência até a ordem de 10%. Na prática, não é difícil encontrar alguns motores às vezes com mais do que o dobro da potência original, ou em outros casos menos da metade, sendo adaptados em veículos diferentes. Fatores como o torque e relações de marcha são tão importantes quanto a potência considerando a manutenção de um desempenho compatível com a segurança.
Tomando por referência o Gurgel BR-800, cujo motor original tem modestos 32cv, atualmente é mais fácil encontrar motores motociclísticos numa faixa de potência semelhante. No entanto, apresentam faixas de rotação mais elevadas e curvas de torque inadequadas ao uso em um carro popular. O torque, em valores absolutos, também
Logo, como em tantas outras situações, é fácil constatar que a estupidez burocrática habitual na República das Bananas é uma ameaça mais grave à segurança veicular e rodoviária do que algumas modificações em automóveis...