sábado, 20 de junho de 2020

Teria sido mais adequado às condições brasileiras o Jeep CJ-3B ao invés do CJ-5?

É muito comum supor que um veículo da geração imediatamente anterior de uma linha vá sempre ser "inferior" ao substituto, mas em alguns casos está longe de condizer com a realidade. Considerando a similaridade técnica e construtiva entre diferentes gerações em modelos como o clássico Jeep CJ, fica evidente que uma suposta defasagem pode esconder algumas vantagens práticas que não sobressaem a um primeiro olhar desatento. No caso específico do Jeep, o CJ-3B que chegou somente importado é um daqueles exemplos de quando poderia ter sido melhor prolongar o ciclo do modelo supostamente defasado no mercado brasileiro, ainda que eventuais aperfeiçoamentos pudessem ser aplicados como se chegou a implementar no sucessor.

Comprimento, largura, distância entre-eixos e diâmetro de giro um pouco menores em comparação ao CJ-5 que teve produção nacional fariam do CJ-3B mais indicado para enfrentar algumas condições de rodagem no interior ao proporcionar maior mobilidade diante de alguns obstáculos que pudessem ser encontrados. E mesmo considerando ainda uma intensa urbanização que o Brasil vivenciou durante o regime militar, exatamente o porte compacto ainda o mantinha satisfatório para atender ao público de grandes centros urbanos numa época em que o Fusca reinava absoluto, de modo que a rusticidade até certo ponto excessiva seria compreensível. Tendo em vista que por alguns anos o Jeep CJ-5 chegou a ter um preço menor que o de um Fusca 0km, não seria o caso de se duvidar que um CJ-3B poderia ter alcançado um valor até mais competitivo mesmo que tivesse saído de fábrica com uma capota rígida semelhante às que eram oferecidas como acessórios, em função da menor quantidade de chapa de aço necessária para produzir a carroceria e por ter usado só o motor com 4 cilindros da série Hurricane ao invés duma versão de 6 cilindros inicialmente usada pelo CJ-5 brasileiro antes de ser substituído pelo motor OHC do Ford Maverick com 4 cilindros.

No tocante a motores, o fato do CJ-3B se diferenciar do antecessor CJ-3A principalmente na altura do cofre do motor se devia à substituição do motor Go-Devil de válvulas no bloco pelo Hurricane que já tinha as válvulas de admissão no cabeçote, o que por si só já se mostrava tão favorável à adaptação de motores mais complexos quanto o CJ-5. Vale destacar que na Espanha o CJ-3B foi produzido com os motores Perkins 4.108 e Barreiros C-24/C-65 dada a preferência pelo Diesel naquele mercado, indo ao menos até '83 quando no Brasil encerrou-se a produção do CJ-5, e portanto já cabe até destacar o quão equivocado pode ser tratar uma geração mais antiga de um mesmo modelo como algo "inferior". Enfim, considerando que um tamanho mais compacto poderia beneficiar boa parte dos operadores, e melhorias de ordem técnica como novos motores e freios dianteiros a disco foram incorporadas em versões espanholas do CJ-3B a exemplo do que aconteceu com o CJ-5 no Brasil, eventualmente teria sido mesmo precipitado descartar o CJ-3B durante o ciclo de produção nacional do Jeep CJ.

terça-feira, 16 de junho de 2020

3 pretextos para preferir um motor com menos cilindros

Às vezes pode parecer que a quantidade de cilindros vá ser especialmente determinante para algumas características de um motor, desde a suavidade de marcha até a eficiência geral, passando pelo custo de fabricação. Um exemplo interessante foi o do motor BMW M10, usado em modelos como o 1602 da década de '70 e cujo bloco também serviu de base para o motor M12 destinado à Fórmula 1 com o qual Nelson Piquet conquistou o 2º de 3 campeonatos na categoria em '83 com apenas 4 cilindros em meio aos V6 que dominavam a primeira "era turbo". Mas nem mesmo algumas vitórias na vitrine de tecnologia automotiva que a Fórmula 1 representou durante algumas décadas conseguiram convencer o público generalista de que um motor com menos cilindros possa ser efetivamente melhor em alguns casos, embora haja uma série de outros pretextos mais práticos que possam ressaltar tais condições.

1 - menos partes móveis: além do custo envolvido nos processos industriais de forja e usinagem que a produção de uma maior quantidade de componentes acarreta, não se pode ignorar reduções no atrito e na inércia que por exemplo um comando de válvulas mais simples, compacto e leve já proporciona, bem como efeitos na economia de combustível e redução de emissões. Não é à toa que às vezes um motor mais pé-duro com 4 cilindros como o Cummins ISF2.8 que equipa o caminhão Volkswagen Delivery 6.160 parece uma opção razoável apesar da potência e torque desproporcionalmente mais modestos em comparação a um V6 de 3.0L como o Ford Lion/Jaguar AJD ainda usado no Land Rover Discovery 5 Td6 cuja complexidade é bastante conhecida. Só pelo ISF2.8 ter os 4 cilindros dispostos em linha, já tem um cabeçote a menos, e ainda tem um eixo único de comando de válvulas enquanto o AJD V6 tem 2 para cada cabeçote, totalizando 4 eixos de comando;
2 - avanços na mitigação do turbo-lag: naturalmente quando um motor com os cilindros em V usa 2 turbocompressores de tamanho menor em cada bancada ao invés de um único pode parecer melhor, tendo em conta a mitigação do turbo-lag tanto devido ao posicionamento mais próximo aos coletores de escapamento quanto por terem uma menor inércia individual, mas não cabe ignorar que um turbo único com tamanho maior possa proporcionar bons resultados num motor com 4 cilindros em linha tanto por já estar mais próximo do coletor de escape quanto por ser possível recorrer a uma turbina twin-scroll ou "bipulsativa" que proporciona maior eficiência na pressurização. E apesar de que as tubulações mais complexas que a configuração twin-turbo requer, bem como resfriadores de ar (intercooler) separados para cada linha de pressurização, não há impedimento para que seja usada em motores com os cilindros em linha, de modo que seria tecnicamente possível até mesmo uma eventual nova geração de motores turbodiesel com 4 cilindros comparável ao Cummins ISF2.8 substituir o AJD sem deixar saudades;

3 - refrigeração mais homogênea: não é novidade que o Fusca e outros modelos equipados com o motor Volkswagen boxer de 4 cilindros refrigerado a ar costumam apresentar uma deficiência na refrigeração, de modo que frequentemente o 3º cilindro costuma apresentar temperaturas mais altas que os demais.
Irregularidades no percurso do ar de impacto ao redor das camisas de cilindro e dos cabeçotes seriam menos intensas num motor boxer de 2 cilindros por exemplo, e não há impedimento para a produção de motores flat-twin refrigerador a ar e óleo com uma cilindrada compatível a um bom desempenho num modelo do porte do Fusca, tomando por referência o bom e velho motor BMW "oilhead" que tão bem serviu a motocicletas como a BMW R 1150 GS;

Naturalmente é impossível estabelecer uma verdade absoluta no tocante a motores, como a própria BMW Motorrad demonstra ao abranger desde as G310 R e GS com o motor de 1 cilindro projetado originalmente em função de atender às condições de mercado da Índia numa parceria com a empresa TVS até a opulência das K1600 com um glorioso "seis canecos" que já seria capaz até de movimentar um carro de porte médio. Mas a princípio, assim como a BMW demonstrou numa circunstância mais extrema ao levar um motor com 4 cilindros à glória máxima do automobilismo na década de '80, uma solução técnica mais modesta como recorrer a uma quantidade menor de cilindros pode servir bem a algumas utilizações.

quarta-feira, 10 de junho de 2020

5 motivos que ainda me fariam considerar a hipótese de comprar um Fusca

Dentre tantos carros que marcaram a história do Brasil, não há dúvidas de que o Fusca se destaca pela relevância que alcançou como um sucesso comercial durante o primeiro ciclo de produção, e também por haver sido alçado à condição de um verdadeiro ícone cultural. Em conversas com estrangeiros, às vezes a popularidade do besouro no país chega a ser objeto de mais atenção que temas como o samba, o futebol, a cachaça e a feijoada. E por mais que já não seja tão comum se deparar com um Fusca em uso cotidiano como ainda era por volta de 15 anos atrás, ainda há uma série de motivos que me levam a não considerar tão absurda a possibilidade de comprar um.

1 - o fator nostalgia: não posso negar que esse eventualmente seja o motivo mais relevante. Mesmo que um carro "popular" moderno pareça uma opção um tanto óbvia, além do mais que recentemente é mais incomum encontrar assistência técnica independente que não trate o Fusca com algum descaso, é inegável que deixou marcas na memória afetiva da imensa maioria dos brasileiros com mais de 20 anos;

2 - aptidão para trafegar em condições ambientais severas: não só o velho mote de que "o ar não ferve nem congela", amplamente reverberado na publicidade, mas também a configuração de motor e tração traseiros favorecendo a trafegabilidade nas mais variadas condições de terreno ainda são bons argumentos a favor do Fusca. Se usar pneus mais cravudos atrás e em último caso adaptar um sistema de frenagem seletiva manual individual das rodas traseiras, chega a lugares onde muitos veículos 4X4 destinados a um mero exibicionismo jamais chegarão;

3 - flexibilidade para fazer uma restomod: pode parecer contraditório defender um carro "velho" e demonstrar alguma simpatia por alterações substanciais na parte mecânica, mas a bem da verdade um Fusca bem reformado mesmo que se altere da motorização aos freios passando pelas suspensões para não ficar devendo em praticamente nada a modelos mais modernos nesse aspecto ainda preservaria uma parte considerável da imagem nostálgica. E se fosse o caso de radicalizar mais, o fato de contar com um chassi separado da carroceria possibilita até algo mais drástico como fazer um chassi novo já incorporando até algumas melhorias que inicialmente pareçam impossíveis ou muito improváveis de implementar num Fusca, mas manter as linhas básicas originais ao olhar somente pelo lado de fora;

4 - tamanho suficientemente compacto em comparação a modelos modernos: por mais que possa ser questionada a capacidade volumétrica para bagagens, e o acesso ao interior seja prejudicado pela configuração de apenas duas portas, o entre-eixos curto e a largura total abaixo da média dos modelos mais vendidos na atualidade fazem com que um Fusca não esteja tão desfavorecido. O comprimento não chega a ser tão favorecido nesse aspecto, mas também não chega a estar numa desvantagem que se faça notar;

5 - motivação cultural: por mais que alguns ignorantes possam subestimar a preservação de veículos clássicos como atividade de cunho cultural, especialmente em meio à demonização que tem sido feita com relação ao automóvel por setores da mídia e da política sob falsas premissas "ecológicas", não se pode negar que um resgate da memória industrial e do desenvolvimento urbano do Brasil deve incluir a importância do Fusca na pauta. Desde o fato de tornar o automóvel próprio mais próximo da classe média em outros períodos históricos, passando pela hegemonia que a Volkswagen chegou a dispor no mercado automobilístico brasileiro com o sucesso do Fusca e derivados, também é conveniente frisar o ressurgimento como ícone tanto em meio a uma cultura mais conservadora quanto na contracultura que remonta à época dos hippies junto à qual sem dúvidas o projeto eficiente e minimalista do Fusca ainda encontra alguma simpatia maior do que qualquer outro carro "popular" de fora da Cortina de Ferro encontraria. Pode-se considerar o Fusca praticamente um pacificador, dada a capacidade que tem de atrair e eventualmente congregar públicos muito diferenciados.

quinta-feira, 4 de junho de 2020

Veleiro de 2 cascos

Embarcações com 2 cascos, mais conhecidas como catamarã, me chamam a atenção entre outros aspectos pela maior estabilidade que costumam apresentar mesmo em trechos de mar mais revolto. Esse foi o primeiro veleiro que eu vi com essa configuração, embora não seja o único e muito menos o primeiro.


terça-feira, 2 de junho de 2020

Momento nostalgia: Suzuki GSX-R 750 SRAD 2000

Uma daquelas motos esportivas que se destacavam pela modernidade na época que eram novas, mas que hoje não são mais tão comuns de se ver regularmente, a Suzuki GSX-R 750 da primeira geração a contar com o sistema SRAD (Suzuki Ram Air Direct) para captação do fluxo de ar de admissão em zonas com maior pressão aerodinâmica em altas velocidades tornou-se uma clássica. Originalmente lançada em '96 com uma revisão mais extensa no ano 2000 sendo produzida até 2003 sem alterações muito substanciais, teve em '99 introduzida a injeção eletrônica que era então uma raridade em motos. No ano 2000, além de revisões no chassi e na carenagem, o próprio sistema SRAD também recebeu alguns aperfeiçoamentos, além da injeção eletrônica ter passado a proporcionar uma compensação de variações na pressão atmosférica mais efetiva, proporcionando uma experiência de pilotagem ainda mais satisfatória em trajetos montanhosos. Também é digno de nota o fato da Suzuki ter sido a última das fabricantes japonesas a dar mais atenção à faixa de cilindrada de 750cc que as ditas "superbikes" passassem a adotar a faixa de 1000cc como padrão.

segunda-feira, 1 de junho de 2020

Reflexão: Volkswagen Logus e Pointer e a mudança na preferência das carrocerias de duas para 4 portas

Dentre tantas transformações do mercado brasileiro nos anos '90, sem sombra de dúvidas juntamente à reabertura das importações e da ascensão dos "populares" figurou a perda de espaço para os carros de duas portas. No segmento dos médios, pode-se creditar a falta da opção por 4 portas como um dos motivos que levaram o Volkswagen Logus a não ter sido um grande sucesso comercial e ser hoje uma raridade, embora não seja o único exemplo dessa mudança na preferência do público generalista. Em que pese o fato de ter usado uma plataforma da Ford, mais especificamente a do Escort Mk.5 e que de certa forma despertava uma rejeição por parte do público tradicional da Volkswagen, fica evidente a menor receptividade por uma carroceria de duas portas num modelo de pretensões mais familiares.

Outro derivado do Escort que foi oferecido pela Volkswagen, o Pointer contou com a configuração de 4 portas mas também penou pela rejeição a alguns produtos da joint-venture AutoLatina que uniu as operações da Ford às da Volkswagen no Brasil e na Argentina, apesar da praticidade ter feito com que alguns consumidores abrissem mão de uma maior capacidade do bagageiro do Logus por um acesso mais cômodo para os passageiros do banco traseiro. E apesar do próprio encerramento da AutoLatina em '96 ter abreviado o ciclo de produção do Logus originalmente lançado em '93 e do Pointer que foi lançado posteriormente em '94, não se pode negar que também era de certa forma contraditório que só o hatch supostamente "inferior" ao sedan/cupê com o qual dividia a plataforma ter a configuração de portas que viria a se tornar favorita do mercado após aquele momento de transição.
Num momento em que a carroceria hatch passava a ser preterida apesar da maior praticidade para uso em centros urbanos de características coloniais européias em comparação aos sedans, que por sua vez tinham o formato da carroceria associado equivocadamente a uma imagem de "prestígio" tão comum aos olhos do público generalista nos países do terceiro mundo, não deixa de ser oportuno destacar que o fim da obsessão brasileira por carros de duas portas marcava o fim de uma influência que remonta ao sucesso comercial do Fusca em outras épocas, que entretanto não se refletiu na fase "Itamar" entre '93 e '96 quando o fato de ter duas portas a bem da verdade parecia ser o menor dos problemas para quem o considerava defasado. Enfim, se por um lado ainda tem quem se atraia por um apelo supostamente "esportivo" ou se iluda com a idéia de menos manutenção e eliminação do risco de abertura acidental por crianças antes do advento das travas de segurança, a década de '90 certamente ficou marcada também como o período em que a carroceria de duas portas foi do céu ao inferno junto ao público brasileiro.

sexta-feira, 22 de maio de 2020

Chevrolet Bolt

Com a alta expectativa que se criou em torno dos carros elétricos, frequentemente apontados como a opção mais promissora para assegurar a viabilidade futura do transporte motorizado, até fabricantes tradicionais como a General Motors tem apresentado algum modelo. E o primeiro veículo totalmente elétrico da empresa a ser oferecido no Brasil é o Chevrolet Bolt, um meio-termo entre um hatch e uma minivan.
O desenho até bastante simples, sem pretensões tão futurísticas que desagradem a um público mais conservador que rejeita elementos estilísticos voltados a conferir uma maior diferenciação aos carros elétricos,  podia muito bem ter sido aplicado a um híbrido ou mesmo a um modelo com motor de combustão interna que não ficaria inadequado. Em que pese acarretar em algumas rupturas com o que um público mais tradicional tanto no tocante ao estilo quanto à propulsão acabaria esperando, não dá para negar que a aparência do Chevrolet Bolt é até agradável.
A disposição dos principais componentes mecatrônicos sob o capô, num layout até relativamente parecido com o observado em veículos tradicionais com motor de combustão interna, a princípio é outro fator que pode facilitar o treinamento para assistência técnica e ajudar a vencer resistências por parte de alguns mecânicos. No entanto, é conveniente lembrar que os controles eletrônicos comuns a veículos modernos mesmo considerando modelos dotados de motor de combustão interna ao invés de um elétrico como o Bolt já pressupõem uma maior complexidade diante de um imaginário equivocado que pudesse levar a crer que seja mais similar a um eletrodoméstico a ponto de permitir que um eletricista predial dispense algum treinamento adicional em eletrônica antes de tentar executar algum serviço de manutenção no modelo.
É interessante observar que, para fins de homologação junto ao Inmetro, foi necessário declarar uma equivalência entre a eletricidade armazenada nas baterias e a a mesma proporção de energia contida num volume de gasolina. Foram declarados um consumo de 45,33 km por equivalente de litro de gasolina no tráfego urbano e 36,31 km pela mesma medida em tráfego rodoviário, e além de consumir menos energia na cidade o tempo de recarga da bateria também reforça a maior aptidão dos veículos elétricos em geral para o tráfego estritamente urbano, o que os mantém mais adequados para atender a um público muito limitado que pode se dar ao luxo de contar com mais de um veículo.

quinta-feira, 21 de maio de 2020

Rodízio de veículos em São Paulo e alterações nas regras durante a crise do vírus chinês: um eventual motivo para reconsiderar o triciclo como uma boa opção?

O fato de motocicletas e similares serem isentos do rodízio de veículos em São Paulo já tornou-se um pretexto válido para alguns paulistanos considerarem a motocicleta como uma opção para contorná-lo no dia de restrição à circulação de um automóvel, ou até em alguns casos para substituir totalmente o carro. Naturalmente, considerando desde o quão disposto a abrir mão de algumas comodidades ou até em função do maior custo inicial que um automóvel híbrido ou elétrico também isento do rodízio tem em comparação a modelos mais convencionais, passando também pela efetiva necessidade de espaço para carga ou passageiros e alguma eventual restrição de saúde que impeça andar de moto, a princípio pode ser o caso de lançar um olhar para outra alternativa dentre os ditos similares. Apesar do rodízio de veículos em São Paulo ter como alegado objetivo reduzir os congestionamentos, e para os quais a manobrabilidade das motos em espaços exíguos as torna coerentes, vale destacar que é ilegal por não ser baseado na única possibilidade prevista no Código de Trânsito para a implementação de medidas análogas que seria uma condição de baixa qualidade do ar.
Considerando a questão das normas de emissões veiculares, e mesmo que para motos seja defasada em comparação ao que se aplica a veículos novos, também já é relevante o fato de motos novas serem enquadradas nas normas Promot 4 equivalentes à Euro-4 e alguns motores de moto como o usado na Honda XRE 300 na prática tendo capacidade para até movimentar por exemplo um Fusca que não era submetido a normas de emissões durante o primeiro ciclo de produção do modelo no Brasil, porém de qualquer maneira o modelo do rodízio hoje em vigor viola a legislação de trânsito do país. Não que o rodízio em função das condições ambientais seja efetivamente desejável, tanto pela causa quanto pelo efeito, mas o que já era ruim piorou com a forma desastrosa que teve o ordenamento alterado durante a crise do coronavírus chinês com o objetivo de fomentar o "isolamento social" ao desincentivar o uso de veículos particulares. Vale destacar que num primeiro momento o rodízio de veículos chegou a ser suspenso, tendo em vista que um automóvel particular não deixa de oferecer um menor risco para o contágio do vírus em comparação ao transporte coletivo por ônibus e metrô, então o prefeito Bruno Covas de certa forma caiu numa contradição ao retomá-lo e de forma ainda mais esdrúxula que a original que prevê a restrição de acordo com o dígito final da placa durante um dia por semana só no centro expandido, e passou a alternar placas pares e ímpares de acordo com o dia durante toda a semana incluindo sábados e domingos por todo o território da cidade de São Paulo.
Embora persista no Brasil a mentalidade de que o carro seja inerentemente "superior" às motos ou aos triciclos, que de certa forma acaba tornando o público generalista menos receptivo mesmo que já seja comum se deparar com algum triciclo em aplicações estritamente utilitárias, não é oportuno ignorar a adaptabilidade para diferentes condições de uso desde pequenas cargas até transporte de passageiros. E naturalmente, enquanto qualquer carro com uma mecânica mais convencional normalmente já sofre restrições com o rodízio de veículos em São Paulo, o fato dum triciclo ser assemelhado à motocicleta se reflete na livre circulação em qualquer dia da semana dentro e fora do centro expandido. Até pode parecer que um triciclo com motor na faixa de 125 a 150cc não seja suficiente, e de fato fica difícil de se alcançar uma velocidade máxima superior a 60km/h com uma relação final que fica normalmente mais curta que a de uma moto comum, mas para um uso essencialmente urbano não chega a ser um empecilho, ainda que alguns até cheguem por volta dos 90km/h e consigam se manter com um pouco mais de desenvoltura em eventuais trechos rodoviários mesmo que se recomende permanecer na faixa da direita junto aos demais veículos lentos...
A persistência da popularidade de triciclos derivados de motos como uma espécie de táxi alternativo no Peru e imitações do Piaggio Ape na Índia, o que até confere um ar "exótico" a esse tipo de veículo e poderia favorecer um uso para o transporte de passageiros em regiões turísticas, a princípio não se refletiria de imediato numa maior aceitação junto ao público generalista para aplicações particulares como complemento ao automóvel e muito menos como substitutivo, mesmo que outras categorias de veículos originalmente destinados a aplicações profissionais hoje até tenham sido alçados à condição de um símbolo de status para a classe média urbana. O custo inicial por sua vez poderia atrair não só eventuais interessados numa opção prática para burlar o rodízio como também fomentar a "renovação de frota" que não tem saído do papel mesmo que venha sendo discutida por mais de 20 anos, embora uma melhoria no tocante ao desempenho que viabilize também eventuais percursos rodoviários ainda seja essencial para garantir algum sucesso nas diversas condições operacionais às quais um carro que eventualmente seja o único veículo motorizado à disposição do proprietário e família deva atender. É algo que ainda pode ser considerado também diante da deturpação do conceito de carro "popular" nos últimos anos, e como os triciclos poderiam constituir uma opção mais racional mesmo em localidades onde não foi implementado o rodízio, tendo em conta também a manobrabilidade em espaços exíguos e ainda uma diminuição de consumo de combustível e emissões que contribuiria para reduzir chances de ser implementado um rodízio de veículos em função de condições ambientais.
Se por um lado aplicações de triciclos no transporte de passageiros permaneçam um tabu, e também enfrentariam uma resistência por parte dos taxistas que já estão insatisfeitos com a ascensão do Uber e de outros aplicativos, por outro é inegável a adequação para atender às necessidades no transporte de cargas e distribuição urbana que além do rodízio ainda sofrem pesadas limitações à circulação de caminhões pelo centro expandido de São Paulo em função de dimensões externas e peso bruto total. E mesmo que pareça difícil supor que o público generalista deixe o orgulho de lado para aproveitar as vantagens que um triciclo tenha a oferecer como veículo particular, é natural que boas experiências em usos comerciais passem a se refletir numa maior atenção a essa possibilidade. E evidentemente, não se pode ignorar que as alterações arbitrárias nas regras do já infundado rodízio de veículos de São Paulo seriam um bom pretexto para apresentar vantagens dos triciclos por serem considerados similares a motocicletas.

sexta-feira, 15 de maio de 2020

Mercado motociclístico: possivelmente se recupere mais rapidamente da crise do coronavírus chinês

Em meio a politicagens ineficazes que tem sido implementadas sob o alegado pretexto de diminuir a disseminação do coronavírus mas que na prática se revelam mais nocivas à economia que benéficas à saúde pública, como restrições à operação dos ônibus urbanos em Florianópolis e a volta do "rodízio" por final de placa em São Paulo que prejudica não apenas o uso particular de automóveis como ainda é um empecilho à modalidade de transporte por aplicativos popularizada nos últimos anos, o mercado automobilístico sofreu uma pesada retração que já ameaça a operação de concessionárias e intensifica o desemprego. Levando em consideração fatores como o temor de uma maior disseminação do vírus chinês em ambientes com aglomeração e renovação de ar deficiente, como normalmente é o caso dos ônibus urbanos, bem como a eventual necessidade de alguns profissionais por um segundo veículo só para burlar o estúpido "rodízio", motocicletas de pequena cilindrada podem tornar-se uma alternativa satisfatória não apenas durante o estado de emergência sanitária mas também eventualmente sustentar um crescimento dessa faixa do mercado de veículos novos. Dada a ênfase num aspecto estritamente utilitário de alguns modelos de moto, bem como a maior concentração de vendas na faixa de pequena cilindrada, não é de se duvidar que surja um maior interesse do público generalista por motos básicas como a Honda Pop 110i que pode ser apresentada como uma alternativa ao ônibus até em função do baixo custo operacional e de manutenção.
Mesmo que de uns anos para cá tenha aumentado a variedade de modelos e versões de motocicletas, e até faixas de cilindrada alta tenham uma maior participação de mercado, a concentração das vendas em torno dos modelos de entrada já pressupõe que fabricantes generalistas como a Honda consigam manter uma relativa estabilidade na cadeia produtiva da indústria motociclística, ao contrário do que tem ocorrido na indústria automotiva que recentemente buscou fugir da dependência pelo esquema do carro "popular" visando um maior lucro médio por unidade ao invés de uma dependência maior pelo volume total de vendas. Embora os aplicativos de transporte tenham justificado uma parte do público generalista procurar por automóveis com mais equipamentos de conforto e em alguns casos tamanho maior que já se distancia da imagem do hatch "popular" pé-duro que antes garantia os bons volumes de vendas, há de se considerar a demanda pelos serviços de delivery geralmente de alimentos e que foi também impulsionada pelos aplicativos mas não requer muita sofisticação para o transporte dos produtos, isso para não entrar no mérito de serviços de moto-táxi tanto clandestinos quanto os que já são regulamentados em algumas cidades. Enfim, mesmo que os méritos da motocicleta no transporte remunerado de passageiros não recebam o justo reconhecimento em meio à atual crise do coronavírus chinês, a princípio outras circunstâncias no tocante ao transporte remunerado de passageiros e de cargas e encomendas leves seriam um bom indício de que o mercado motociclístico possa apresentar uma recuperação mais rápida que o automobilístico.

sexta-feira, 8 de maio de 2020

Caso para reflexão: Toyota Corolla E210 e desafios para a hibridização avançar junto ao aumento na demanda pelo câmbio automático

A atual geração do Toyota Corolla, que foi lançada no Brasil no ano passado, foi a primeira a trazer a configuração híbrida como opção fora do mercado japonês e de alguns mercados de exportação como Hong Kong e Cingapura. E se por um lado em mercados como o europeu e até mesmo no Marrocos o Corolla sedan já é disponibilizado exclusivamente com a motorização híbrida, por outro ficaria difícil justificar uma abordagem semelhante para o mercado brasileiro até em função de questões referentes à incidência de impostos diferenciada para o segmento de táxis ser convidativa a uma configuração mecânica mais tradicional. Nem mesmo a consolidação do câmbio automático como única opção nas versões nacionais do Corolla E210, que faria pressupor uma maior facilidade para convencer uma parte do público tradicional do modelo a aceitar o sistema híbrido HSD que emula o funcionamento de um câmbio CVT mesmo que o conjunto moto-gerador elétrico substitua um câmbio propriamente dito, seria suficiente para alcançar a todos os consumidores.

No caso específico do mercado brasileiro, o fato das versões não-híbridas usarem somente o motor M20A-FKS de 2.0L com injeção D-4S direta e indireta combinadas até faz causar alguma surpresa os híbridos usarem o 2NZ-FXE de 1.8L dotado somente da injeção sequencial nos pórticos de válvula, mesmo que parecesse melhor valer-se da injeção direta do M20A-FKS e do M20A-FXS que a Toyota e a Lexus usam em alguns híbridos de fabricação estrangeira tendo em vista que ao menos na teoria é mais favorável à partida a frio com o etanol tendo em vista que todas as versões brasileiras do Corolla nacional já são flex. Diga-se de passagem, enquanto a Toyota declara eficiência térmica de 39,5% no 2NZ-FXE ajustado para emular o ciclo Atkinson, para o M20A-FKS é declarado o mesmo parâmetro em 40% e para o M20A-FXS o efeito Atkinson permite alcançar 41% de eficiência térmica de acordo com a Toyota. Considerando a economia de escala que a eventual utilização do sistema híbrido tanto com o motor mais básico quanto o mais sofisticado poderia trazer para atender ao público generalista, tendo em vista uma menor incidência de impostos para veículos híbridos, realmente pareceria mais facilmente justificável até para tentar nacionalizar a fabricação do conjunto moto-gerador ao invés de importar do Japão como também se faz com o câmbio CVT das versões não-híbridas.

Além da expectativa por uma maior economia de combustível que já seria inerente às características de funcionamento de um veículo híbrido, especialmente em meio ao tráfego urbano cada vez mais congestionado, o acionamento elétrico de acessórios também proporciona uma carga menos intensa sobre o motor de combustão e portanto menos perdas de rendimento, além da frenagem regenerativa oferecer um efeito de freio-motor mais forte que contribui para uma maior durabilidade dos freios de serviço de forma análoga à observada em veículos com motorização Diesel ou turbodiesel dotados de dispositivos retardadores de frenagem conhecidos popularmente como freio-motor. No entanto, não é possível desconsiderar fatores como a reciclagem de componentes das baterias de tração em modelos híbridos, que usam compostos químicos diferentes dos que se usa numa bateria de chumbo ácida que normalmente se usa em veículos não-híbridos e é mais facilmente reciclável até num país de terceiro mundo. Enfim, mesmo que possa parecer simples à primeira vista, uma hibridização é muito mais desafiadora do que simplesmente valer-se dum sistema híbrido para substituir um câmbio automático propriamente dito.