sábado, 21 de janeiro de 2023

Há espaço para a moto TVS Sport 110i no mercado generalista brasileiro?

Uma motocicleta que chegou ao Brasil por iniciativa da startup Mottu, que as oferece em planos de aluguel que de certa forma me lembram o leasing, a TVS Sport 110i feita na Índia e trazida em CKD para ser montada na Dafra em Manaus já ganhou apreciadores, e certamente a aparência mais convencional diante da principal concorrente na mesma faixa de cilindrada exerce um efeito nesse sentido. Tendo em vista que a TVS e a Dafra já mantinham uma cooperação antes de ser trazida a Sport 110i especificamente para a operação da Mottu com o aluguel voltado ao uso profissional junto aos motoboys, chega a ser curioso que permaneça indisponível para a venda varejista nas concessionárias Dafra por todo o Brasil, além do mais que a Mottu tem uma presença menor a nível nacional, e portanto há uma oportunidade inexplorada fora dessa aplicação tão específica. E apesar de uma motocicleta nessa faixa de tamanho e cilindrada parecer pouco convidativa para algumas condições de uso que envolvam um eventual tráfego por trechos de rodovia nos perímetros urbanos, ainda pode constituir uma opção a mais em um mercado cada vez mais receptivo à motocicleta no contexto da "mobilidade urbana" e até no fomento de atividades comerciais que requeiram uma agilidade no transporte de pequenas cargas.

Além da economia de combustível ser uma das principais razões para motos pequenas terem uma demanda forte no Brasil, em que pese estarem concentradas em faixas de cilindrada tão permissivas no tocante à segurança que a TVS Sport 110i ainda vem com freios a tambor em ambas as rodas e portanto seja incompatível com a eventual instalação do sistema ABS pelo simples fato de freios a tambor em motocicletas terem o acionamento 100% mecânico ao invés de hidráulico como em carros, a simplicidade tem seus méritos aos olhos de uma parte do público que também cogita aderir às motos como uma alternativa perante deficiências do transporte público tanto em cidades de um porte maior quanto outras menores. É natural que o fabricante ou o importador prefiram tentar desovar junto ao público generalista um modelo pretensamente mais sofisticado que justificasse um preço inicial mais alto, o simples fato de ter sido feita a homologação do modelo no Brasil para uso de um cliente que fomenta um volume de vendas que superou expectativas no ano de 2022 a ponto de fazer a TVS figurar entre as marcas de moto mais vendidas no Brasil sem considerar modelos vendidos com a marca Dafra. Portanto, dada a disponibilidade tão restrita desse modelo, pode-se deduzir que há espaço para a TVS Sport 110i no mercado generalista brasileiro.

domingo, 15 de janeiro de 2023

Suzuki Intruder 125 bobber

Uma das motos custom de pequena cilindrada de maior sucesso comercial no Brasil, a Suzuki Intruder 125 foi oferecida entre 2002 e 2017 pela J. Toledo Motos do Brasil, e tanto exemplares mais próximos da mais absoluta originalidade quanto modificados são facilmente vistos nas principais cidades do país. É natural que sejam suscitadas dúvidas quanto à aptidão de uma moto 125 para o uso recreativo ao que normalmente se propõem as motos custom, mais frequentemente vistas como modelos recomendados a entusiastas de viagens, mas a estética bastante tradicional da Intruder 125 se presta bem a modificações que remetem aos estilos mais tradicionais como as bobbers. A inspiração é nas modificações minimalistas surgidas nos Estados Unidos à medida que veteranos da II Guerra compravam motos Harley-Davidson e suprimiam qualquer ítem que fosse considerado "não-essencial" para o funcionamento, aliviando peso e diminuindo a quantidade de possíveis ocorrências de alguma falha.
Atualmente uma infinidade de opções de motos feitas por outros fabricantes tomou boa parte do espaço que parecia cativo da Harley-Davidson, sobretudo os fabricantes japoneses como a Suzuki pelo custo de aquisição menor, especialmente à medida que as faixas de cilindrada mais austeras nos segmentos mais generalistas eram deixadas de lado por fabricantes americanos e europeus. Normas mais rígidas tornam menos comum levar algumas modificações aos mesmos extremos da época que surgiram as bobbers, de modo que suprimir por exemplo o freio dianeiro ou a lanterna traseira poderia causar problemas ao uso em vias públicas, mas na essência a idéia básica permanece, mesmo que também sejam usadas motos de proposta mais austera em comparação aos modelos de alta cilindrada que eram o padrão no imediato pós-guerra. E mesmo que acabe sendo mais conveniente para uso urbano que longas viagens, é inegável que essa Suzuki Intruder 125 ano 2004 ficou interessante como bobber...

domingo, 8 de janeiro de 2023

Kombi Pick-Up '99: futuro colecionável

Encontrar uma Kombi Pick-Up já da época que passou a usar injeção eletrônica, reconhecível devido à sonda Lambda "espetada" imediatamente antes do catalisador, já tem sido algo raro. Tanto por um uso predominantemente para trabalho pesado que impõe um severo desgaste a utilitários de um modo geral quanto por ter demorado até '98 para a Kombi finalmente receber injeção eletrônica no Brasil, e a Pick-Up ter permanecido em linha só até o ano 2000 enquanto as versões Standard e Furgão seguiram em linha e o motor de arrefecimento a ar continuou até 2005 antes de ser dar lugar a um de arrefecimento a líquido na fase final de produção da Kombi até 2013, tornou-se bastante incomum avistar exemplares com essa configuração. E o mais interessante é a carroceria de madeira, algo verdadeiramente icônico em se tratando de utilitários antigos no Brasil de um modo geral e confere uma aparência mais "séria" que até remete aos caminhões mesmo, trazendo um interessante contraste com o perfil de uso misto e às vezes mais recreativo incorporado às pick-ups modernas.

Embora a Kombi ainda marque uma presença frequente nas ruas, estradas e até trechos mais bravios por esse Brasil afora, tendo em vista a inquestionável versatilidade especialmente atribuída com uma maior ênfase à versão Standard, bem como o valor de revenda normalmente mais alto em comparação ao que se via entre os modelos destinados mais especificamente ao transporte de carga, a Pick-Up já ficou bem mais rara até em antigos redutos da linha Volkswagen clássica de motor traseiro como o Rio Grande do Sul e Santa Catarina. Mesmo com um tamanho bastante conveniente para uso estritamente profissional, e com um daqueles motores que acaba sendo considerado "à prova de burro" aos olhos do brasileiro, no fim das contas a Pick-Up sofreu mais com a concorrência tanto nacional quanto importada logo após a reabertura das importações na década de '90, tendo em vista as pick-ups passando a ser um símbolo de status enquanto a Kombi Standard e a versão Furgão permaneciam menos ameaçadas mesmo em meio à chegada de concorrentes modernos. E assim, a Kombi Pick-Up da última fase de produção tende a ser mais apreciada como um futuro colecionável.

domingo, 18 de dezembro de 2022

Caso para reflexão: cabine dupla Tropical e muitas mancadas da Ford no mercado brasileiro

Já é público e notório que o Brasil não é para principiantes, e um daquelas situações que exemplificam bem o quão peculiar é esse país são as transformações antigas de pick-ups para cabine dupla como as da extinta Tropical Cabines, cuja atividade nos últimos anos esteve perigosamente centrada na linha Ford e acabou comprometendo a própria sustentabilidade desse modelo de negócio. Lembrando que a Ford faz basicamente a mesma coisa desde a época dos calhambeques, fomentando uma dependência excessiva por um único tipo básico de produto a ponto de agora tentar se posicionar mais como especializada nos veículos utilitários, é ainda mais bizarra a sucessão de erros culminada nos encerramentos de fabricação brasileira. E por mais que aquelas cabines duplas que apresentam um perfil mais parecido ao dos sedans acabem fugindo um pouco daquelas pretensões essencialmente utilitárias, e tivessem servido como um paliativo desde a época da restrição às importações entre '76 e '90, além de atenderem a quem preferia os motores Diesel a qualquer custo e por isso partiam para utilitários transformados desde quando ainda não se falava tanto de SUV, uma Ford F-250 com a cabine dupla Tropiclassic traz à tona alguns vacilos que remontam até mesmo à época que Amaral Gurgel foi funcionário da operação brasileira da Ford...

Por mais que algumas diferenças nem sempre muito óbvias entre os chassis de um utilitário de grande porte e o de um carro mais convencional pudessem levar a conclusões equivocadas quanto à viabilidade de produzir automóveis de perfil mais generalista desde o início da fabricação brasileira de caminhões Ford ainda na década de '50, um aparente descaso com o país já transparecia, e se refletia em gerações de caminhões e pick-ups full-size anteriores à F-250 lançada em '98, que chegavam ao Brasil obsoletas em relação ao mercado americano, enquanto até países como Venezuela e Argentina já acompanhavam mais de perto as evoluções da linha americana. E a bem da verdade, até a F-250 de certa forma expunha bem algumas mancadas da Ford, especialmente no tocante a opções de powertrain mas principalmente a maior disponibilidade de opções destinadas exclusivamente à exportação em determinados momentos na época que África do Sul e Austrália recebiam o modelo fabricado no Brasil com o cockpit à direita e opções que iam da cabine dupla original de fábrica à tração 4X4 cujas respectivas introduções oficiais ao modelo de especificação regional Mercosul eram sempre atrasadas. Mesmo considerando necessária uma regionalização das opções de motor turbodiesel, num primeiro momento com o Cummins B3.9 de 141cv e "só" 4 cilindros e logo em seguida o MWM Sprint 6.07 TCA de 180cv e 6 cilindros em linha que foi o único oferecido na África do Sul e chegou a ser oferecido na Austrália como uma opção mais austera ao V8 Power Stroke de 7.3L que no Brasil só equipou exemplares destinados à exportação com cockpit à direita, o fato de nunca ter sido vendida oficialmente pela Ford no Brasil uma F-250 equipada com câmbio automático entre '98 e 2011, e a tração 4X4 já oferecida desde o início para a Austrália e a África do Sul só ter chegado ao catálogo brasileiro no final de 2005 com uma nova versão de 203cv do motor Cummins incorporando gerenciamento eletrônico, certamente favoreceram outros modelos até de outras categorias e com um tamanho menor.

Lembrando que um chassi totalmente renovado para a linha Super Duty só surgiu nos Estados Unidos com o modelo de 2017, quando a F-250 já estava fora do mercado brasileiro e o relançamento da F-350 e F-4000 em 2014 ignorou qualquer alteração estética dos equivalentes estrangeiros e também deixava de lado a opção pela cabine dupla de fábrica na F-350, coube exatamente à Tropical Cabines como uma transformadora homologada pela Ford suprir aos clientes que desejavam ou efetivamente necessitavam desse recurso. Nesse caso já cabe até traçar um paralelo com a forma que a Tropical Cabines recorria ao plástico reforçado com fibra de vidro para a fabricação própria de componentes para a transformação de cabine simples em cabine dupla, e a forma como a Gurgel usou à exaustão esse mesmo material, apesar de caber uma ressalva pela Tropical ter sempre usado os chassis originais das caminhonetes ao contrário da Gurgel que chegou a produzir chassis próprios, podendo também ser feita até uma analogia entre as pick-ups transformadas e o encarroçamento de um chassi para ônibus. Tendo em vista a complexidade dos processos de homologação de veículos no Brasil atualmente, que no caso de alguns utilitários pode envolver desde um chassi básico até opções de carrocerias especializadas, eventualmente a Ford ainda pudesse ter aproveitado melhor a experiência da Tropical Cabines, concentrando-se apenas no chassi e opções de motor e transmissão, enquanto um fornecedor especializado que nos últimos anos de atuação esteve efetivamente devotado à Ford podia até haver implementado uma maior similaridade estética dos modelos nacionais com os similares americanos.

Por mais que a fábrica de São Bernardo do Campo onde era produzida a F-250 nacional tivesse sido um barril de pólvora no âmbito de ações judiciais trabalhistas e outros problemas entre a Ford e o sindicato dos metalúrgicos do ABC, a empresa ter desativado aquela operação que havia se tornado especializada em veículos pesados num mesmo momento que dependia do outsourcing junto à Otosan na Turquia no intuito de retomar a presença no mercado de caminhões na Europa Ocidental e com a Changan e a JMC na China visando atender tanto a segmentos de carros mais tradicionais quanto os SUVs e os utilitários para trabalho em geral soa um tanto incoerente. Tendo em vista que até hoje uma caminhonete full-size segue praticamente a mesma "receita" dos calhambeques acrescida de alguns "ingredientes" modernos, e portanto se enquadra naquela zona de conforto que a Ford buscou se posicionar, é inegável que havia um aproveitamento mais viável da operação brasileira no contexto de reestruturação a nível mundial. Enfim, mesmo à primeira vista parecendo "só" mais uma daquelas "brasilidades" difíceis de explicar a um estrangeiro que visita o Brasil pela primeira vez, uma F-250 com cabine dupla Tropical torna-se um bom exemplo de como a Ford negligenciou demasiadamente o mercado brasileiro mesmo quando tinha plenas condições de atender com mais empenho.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2022

Críticas ao Fusca: algumas fazem sentido

Um carro que transcendeu da condição de mera ferramenta, e foi alçado a uma posição de ícone histórico e cultural, o Fusca sempre desperta reações intensas, tanto no exterior quanto no Brasil. Naturalmente, passa longe de ser uma unanimidade, tornando-se alvo de eventuais críticas chegando à proporção do ódio em alguns casos. O conturbado ciclo de produção do modelo, que efetivamente só ganhou impulso porque um oficial inglês das forças de estabilização da Alemanha durante o imediato pós-guerra entendeu que haveria uma oportunidade de fomento econômico e oferta de empregos à população da cidade de Fallersleben/Wolfsburg com a Volkswagen renascendo dos escombros, também passou por momentos distintos no Brasil, como um relançamento politicamente motivado que deu origem ao Fusca Itamar de '93 a '96.

Tal circunstância podia parecer óbvia para "blindar" o Fusca de críticas, tendo em vista que havia passado 7 anos fora de produção no Brasil iniciada em '59 e desativada em '86. A bem da verdade, por mais que o Fusca até conseguisse atender bem a um público mais específico fora da "bolha" das capitais e de alguns centros regionais com infraestrutura mais desenvolvida, é natural que o projeto já antigo à época do primeiro encerramento da fabricação brasileira acarretasse em alguns compromissos que o público generalista via como inaceitáveis diante da nova geração de carros "populares" que surgia na década de '90. E por mais que o bom e velho motor com refrigeração a ar tenha seus méritos diante de negligências na manutenção que ainda se vê muito por esse Brasil afora, já começa por aí uma reflexão quanto a eventuais descasos por parte da Volkswagen quanto a possíveis melhorias como a injeção eletrônica que já se usava no Fusca mexicano antes que fosse retomado o ciclo brasileiro na fase Itamar.

A suspensão dianteira com barras de torção, que ocupavam um espaço imenso na frente, era um empecilho para ampliar capacidades do bagageiro frontal e também do tanque de combustível, além do bagageiro interno que se localiza entre o encosto do banco traseiro e o quadro de fogo ter acesso mais difícil em comparação ao bagageiro de um hatch com motor dianteiro. Para quem podia dispensar a capacidade de trafegar por trechos severos nas periferias ou no interior, era previsível a preferência por uma melhor ergonomia para a acomodação de bagagens e cargas leves, já relegando o Fusca a um público "de nicho" e teoricamente pouco rentável. Pode ser que a própria Volkswagen não tenha mais sabido segmentar a propaganda para alcançar aos clientes com um perfil devidamente ajustado ao Fusca, que na prática se via totalmente livre de concorrência tanto em meio ao fim da Gurgel e os custos de utilitários 4X4 que poderiam ser considerados mais parelhos no tocante à aptidão off-road.

Ter somente duas portas, que já influenciou até modelos de segmentos mais prestigiosos ao ponto de terem versões de duas portas só para o Brasil, era algo indesejável aos olhos de uma parte expressiva do público quando o Fusca Itamar surgiu. Por mais que ainda se veja muito carro "popular" de gerações mais novas com só duas portas, a ascensão das 4 portas no mercado brasileiro já atrapalhava a competitividade mesmo antes do Itamar ter a produção encerrada em '96. A pequena área envidraçada, característica que já tinha sido revista na Europa enquanto o Fusca no Brasil se mantinha sem grandes alterações durante o ciclo de produção original que foi até '86, também se revelava um problema e desencorajava potenciais compradores, bem como a falta de ventilação forçada que era especialmente injustificável em um país com climas tão extremos em algumas localidades, por mais que aqueles ventiladores de camelô para ligar ao acendedor de cigarros às vezes quebrassem um galho...

A perfeição é francamente impossível de se alcançar, e diferentes graus de evolução nas indústrias e uma exigência também maior do público generalista acabam por levar um antigo sucesso a ter as limitações expostas a uma avaliação mais severa. No caso do Fusca mais especificamente, que era favorecido no Brasil pela falta de um efetivo concorrente especialmente antes da reabertura das importações, ficava até mais previsível uma acomodação da Volkswagen do Brasil, bem como resignação de uma parte expressiva do público que comprava Fusca mais em função das condições de uso severas. Enfim, apesar de terem se firmado outros parâmetros no mercado brasileiro que atrapalhavam uma continuidade do Fusca, algumas críticas ao modelo já se mostravam justificáveis, em que pese ter se tornado um ícone cultural.

quarta-feira, 30 de novembro de 2022

Momento nostalgia: Honda CBX 150 Aero

Uma daquelas motos que a Honda ofereceu especificamente no Brasil, a CBX 150 Aero foi produzida entre 1988 e 1993 com a missão específica de atrair a uma parte do segmento de pequena cilindrada que desejava algo além daquela austeridade então apresentada pela CG. Com o lançamento ocorrido durante o governo Sarney, e a desastrosa política do Controle Interministerial de Preços (CIP) implementada no intuito de conter a inflação também afetando o mercado motociclístico à medida que as motos até 150cc tinham os preços tabelados, alterar o motor de 148cc como previsto no projeto original para 151cc foi o artifício usado pela Honda para estabelecer o preço com mais liberdade. Incorporando características como o freio dianteiro a disco e a partida elétrica que só chegariam na CG 125 ao fim de 1999, também se destacava por um desenho com pretensões esportivas, destacando as formas aerodinâmicas da rabeta com a lanterna integrando os indicadores de direção, chegando a ter sido oferecida como opcional uma carenagem integral que eu nunca vi ao vivo...

Nunca foi exatamente um modelo comum, mas já foi bem mais fácil ver um exemplar tão íntegro como o das fotos que é do ano de lançamento, e possivelmente o fato da Aero ter escapado ao tabelamento de preços pesou contra um maior volume de vendas, bem como a reabertura do mercado brasileiro a carros e motos importados já durante o governo Collor. O motor já ter incorporado o comando de válvulas no cabeçote com sincronização por corrente, que hoje parece tão óbvio mesmo nas motos utilitárias, podia ser considerado outro eventual empecilho sob o ponto de vista comercial em comparação à austeridade do motor que a CG usava à época, com comando no bloco e sincronização direta por engrenagens mais resiliente diante de alguns eventuais desleixos na manutenção como atrasos entre as trocas de óleo. No fim das contas, em meio a tantas peculiaridades do mercado brasileiro que desafiam a lógica, a Honda CBX 150 Aero é um dentre tantos modelos que vem sendo alçados à condição de clássicos mais pela própria raridade que por alguma característica técnica específica.

quinta-feira, 17 de novembro de 2022

Clássico revisitado: Ford Crestline Victoria 1953

Ao que tudo indica o último remanescente desse modelo em Porto Alegre, esse Ford Crestline Victoria 1953 já me era conhecido ao menos desde 2009. Naturalmente já chama a atenção pelo simples fato de ser um modelo da primeira metade da década de '50 ainda em plena operação, e com uma cor mais viva que destoa do binômio preto/prata visto mais frequentemente em carros atuais.

O interior traz aquele layout bastante tradicional dos carros full-size americanos clássicos, incluindo os bancos inteiriços tanto atrás quanto na frente e a alavanca de câmbio na coluna de direção, liberando o espaço para um passageiro no centro do banco dianteiro em que pese a intrusão do túnel de transmissão. Chama a atenção por ainda ter câmbio manual de 3 marchas, que pela posição da alavanca é conhecido por "three-on-the-tree", embora a prosperidade do pós-guerra tenha feito o câmbio automático ganhar o apreço do público americano com uma celeridade incomparavelmente maior que no Brasil...

Um aspecto marcante do ano-modelo 1953 na linha Ford foi ter sido o último ano que o motor Flathead V8 foi usado em automóveis, com exceção do Canadá, da Austrália e na França onde era oferecido até 1954. Nesse exemplar específico, o motor é de 3.9L ou 239 polegadas cúbicas.
Já se tratando do motor EAB, introduzido no ano-modelo anterior com um aumento de 6,8:1 para 7,2:1 na taxa de compressão, com 110hp de potência a 3900 RPM e 27kgfm de torque a 2000 RPM, levando em consideração que essas faixas de rotação tão baixas são bem características de motores com válvulas laterais (no bloco) como o próprio nome dos motores Flathead V8 indica. Mas uma característica que me chamou a atenção quando o proprietário abriu o capô para mostrar o motor foi o calor que começou a ser exaurido, e o motor Flathead V8 realmente costuma ter temperaturas bastante altas até em função do direcionamento do fluxo de escape por dentro do bloco para sair pelas laterais, tendo em vista que as válvulas ficam no "vale" do V entre as bancadas de cilindro.

terça-feira, 25 de outubro de 2022

Kombi: ainda teria viabilidade se fosse disponível 0km?

Um tanto estigmatizada como "inferior" em comparação a utilitários mais modernos, e tendo deixado de ser produzida ao final de 2013 em antecipação à obrigatoriedade de freios ABS para os automóveis e utilitários novos comercializados no Brasil a partir de 2014, a Kombi até poderia ter seguido em linha ao menos em algumas versões beneficiadas pela isenção da obrigatoriedade de airbag duplo que passou a vigorar no mesmo período. Naturalmente, a necessidade de carteira de habilitação na categoria D que é necessária para conduzir veículos de transporte escolar por exemplo desencorajaria uma grande parte do público da versão Standard, com apenas 9 lugares já contando o do motorista, enquanto a Escolar era homologada com 15 lugares e a Lotação com 12 lugares, e o modelo Furgão ainda pode ser conduzido com CNH categoria B mas ter apenas 3 lugares seria inviável para o uso misto que tanto notabilizou a Kombi ao longo das décadas. Outros fatores como o recrudescimento das normas de emissões a partir de 2022 também levariam a crer que a Kombi teria uma sobrevida muito curta para justificar o eventual uso de freios ABS, embora a princípio encontrar algum espaço para instalar um cânister de capacidade maior para versões flex ou até instalar um motor turbodiesel moderno com toda a parafernália associada ao controle de emissões como um filtro de material particulado (DPF) e um tanque para o fluido-padrão AdBlue/ARLA-32 usado pelo sistema SCR estivesse longe de ser totalmente impossível, mesmo sendo o caso do molho mais caro que o peixe...
Apesar do álcool/etanol ser inviável na maior parte do país, e o gás natural também ter atingido preços um tanto exorbitantes, a recente guerra entre Rússia e Ucrânia fez com que pela primeira vez o diesel se tornasse mais caro que a gasolina até no Brasil, e nisso a Kombi ainda estaria bem servida com o motor flex, contrastando com a hegemonia dos motores turbodiesel em vans e pick-ups médias modernas com capacidades semelhantes tanto no transporte de carga quanto de passageiros. Para aqueles operadores de perfil mais tradicional, dos quais a Volkswagen de um modo geral parece estar se distanciando, ainda é justificável crer que a Kombi permaneceria desejável se tivesse permanecido em linha, embora algumas melhorias no conforto como direção assistida e ar condicionado também se tornassem mais demandadas para reter alguns potenciais clientes que de outra maneira fariam a transição para outros utilitários com um projeto mais moderno.Enfim, por mais tecnicamente desafiador que seria manter a Kombi dentro de normas de segurança e emissões mais restritivas que foram implementadas no Brasil desde quando teve a produção encerrada, uma série de circunstâncias que vão desde o intenso conservadorismo por parte do público de veículos comerciais no mercado nacional até a praticidade que o porte mais compacto em comparação a utilitários de capacidades próximas tende a oferecer em algumas condições operacionais, é possível crer que a Kombi ainda teria alguma demanda caso tivesse permanecido em produção.

terça-feira, 11 de outubro de 2022

Fusca '67 sem pintura

Me chamou a atenção esse Fusca 1300, ano '67, pela ausência de uma pintura externa. Ao contrário de tantou outros Fuscas que sobrevivem como veículos de uso normal nas mãos de motoristas com perfil mais austero, esse parece ser daqueles que caíram nas mãos de alguém com perfil de uso recreativo por assim dizer. Entre entusiastas de modelos antigos da Volkswagen, um grupo que acaba tendo esse viés é o dos que apreciam o estilo HoodRide ou RatVolks, que tem uma predileção pela aparência com marcas do tempo como a ferrugem aparente, embora de forma controlada na medida do possível e sem afetar a integridade estrutural dos veículos.
Desconheço qualquer tratamento que possa ter sido feito na carroceria desse Fusca para restringir uma eventual expansão dos pontos de oxidação, como por exemplo uma fosfatização ou o recobrimento com verniz incolor para manter aparente a cor natural da chapa de aço pelo lado externo. O painel no entanto preserva a pintura na cor branca, ao que tudo indica a cor original desse exemplar antes que tivesse sido decapado. É difícil deduzir simplesmente ao observar esse Fusca se a remoção da pintura foi feita por meios inteiramente mecânicos como lixando, ou se foi feita com solventes para remover a tinta por ação química.
Outra modificação que chama a atenção imediatamente é o uso das rodas de liga-leve conhecidas como "roda gaúcha", que foram muito populares em outras épocas, mencionadas até na música "Pelados em Santos" do grupo Mamonas Assassinas. Bastante apropriada a escolha dessas rodas para um Fusca em Porto Alegre, diga-se de passagem... E embora alguns puristas rejeitem a aparência sem pintura, ficou um aspecto até interessante, com a incidência do sol ressaltando algumas marcas de ferrugem e refletida nas partes que ainda preservam o brilho do metal.

terça-feira, 27 de setembro de 2022

5 aspectos pelos quais me surpreende o Jeep da II Guerra Mundial nunca ter sido equipado com o motor do Ford Modelo T em nenhuma configuração

Um utilitário versátil tanto em campo de batalha quanto no âmbito civil, cujo primeiro contato de tropas brasileiras deu-se quando a Força Expedicionária Brasileira botou a cobra para fumar na Itália, o Jeep é sem sombra de dúvidas um modelo marcante, assim como ao seu tempo foi o Ford Modelo T. Apesar de parecer um tanto improvável a comparação entre o Willys MB e um carro que hoje mais me lembra um trator, uma série de aspectos que transcendem o fato de terem ambos recorrido à configuração de chassi separado da carroceria com suspensão por eixo rígido e feixe de molas me parece justificar observações mais peculiares. Tendo em vista que o Ford Modelo T cujo ciclo de produção foi de 27 de setembro de 1908 a 26 de maio de 1927 teve o motor mantido em linha até 4 de agosto de 1941, exatamente 4 meses e 3 dias antes do ataque japonês a Pearl Harbor que motivou a entrada formal dos Estados Unidos na II Guerra Mundial, convém destacar ao menos 5 aspectos que tornam a meu ver surpreendente que nunca tenha sido usado em qualquer versão do Jeep o motor do eterno "Ford Bigode":

1 - configuração semelhante de válvulas laterais e 3 mancais de virabrequim: o motor Willys L134 "Go Devil" que equipava os primeiros Willys MB seguia uma concepção bastante tradicional à época, e apesar de apresentar uma taxa de compressão mais alta e operar em faixas de rotação impensáveis para o motor do Ford Modelo T considerando ambos nas configurações originais, o fato de ambos contarem com válvulas no bloco e somente 3 mancais de virabrequim leva a crer que com algumas melhorias já experimentadas por tantos fornecedores de acessórios e mecânicos independentes durante a época áurea do Ford Modelo T seria possível ter proporcionado uma sobrevida a esse motor para atender ao esforço de guerra que se iniciava. Cabeçotes e pistões especiais para aumentar a compressão, eixos de comando de válvulas com outras graduações, carburadores diferentes, uma série de melhorias já conhecidas podia ser aplicada, e eventualmente o motor Willys apesar de mais "girador" teria um concorrente à altura, já considerando a diferença de mais de 40% nas faixas de cilindrada e como o Go Devil era originalmente menos "amarrado" que o motor do Ford Modelo T;

2 - familiaridade dos recrutas: embora tanto o Jeep quanto o Ford Modelo T fossem projetos voltados às condições americanas das respectivas épocas, esse aspecto também pode ser considerado pertinente em relação aos expedicionários brasileiros, tendo em vista tanto as faixas etárias quanto a probabilidade das primeiras experiências com veículos motorizados terem ocorrido justamente com o Ford Modelo T, que acabou sendo visto como um "carro velho comum" em áreas rurais, mais de 20 anos após passada a guerra. Talvez nem a disposição pouco convencional dos comandos de um Ford Modelo T se tornasse um empecilho para a maioria dos militares à época, lembrando que até viaturas militares costumam ter um acelerador manual além do pedal que se tornou padrão em veículos civis;

3 - aptidão para enfrentar condições ambientais severas: o sistema de ignição costumava ser muito mais vulnerável à umidade em motores equipados com distribuidor, como o Willys Go Devil, enquanto o Ford Modelo T dispunha de um sistema mais resiliente a tais condições com o magneto integrado ao volante do motor e um comutador, que distribuía a tensão para as bobinas de acordo com a ordem de fogo para elevarem a tensão antes de centelhar nas velas. O comutador podia parecer um distribuidor melhorado, mas o princípio de funcionamento era o inverso, ao transferir corrente de baixa tensão para bobinas individuais que transmitiam alta tensão para as velas, enquanto um distribuidor receberia alta tensão de uma única bobina e serviria a vela de cada cilindro;

4 - a experiência de Jesse Livingood: mesmo que a tração 4X4 só tenha sido massificada junto ao grande público no pós-guerra por influência do Jeep, vale lembrar que kits de adaptação para o Ford Modelo T já haviam sido apresentados, e o mais conhecido foi desenvolvido por Jesse Livingood. Seria improvável que o mesmo sistema acabasse sendo incorporado ao Jeep, tendo em vista que mantinha o precário sistema de freios original do Modelo T por cintas no câmbio e com tambores apenas nas rodas traseiras para o freio-de-mão, apesar de também terem sido oferecidos como acessórios para o Modelo T melhorias como o sistema Rocky Mountain que incorporava o acionamento dos tambores ao pedal de freio e até kits de freio a tambor nas 4 rodas. No entanto, considerando a necessidade da tração 4X4 no Jeep, a experiência de Jesse Livingood com adaptações servia como prova da aptidão do motor do Ford Modelo T a essa necessidade;

5 - o Willys MB também ter sido produzido pela Ford: em meio ao esforço de guerra, dentre tantas empresas que acabaram produzindo suprimentos militares, a Ford chegou a produzir também o Willys MB, que nas versões fabricadas pela Ford foi renomeado GPW. Portanto, se ao menos uma versão do Jeep original tivesse saído com o motor do Ford Modelo T, poderia ser até fácil de explicar, lembrando de situações inusitadas envolvendo a adaptação de motores e componentes destinados ao público civil para atender às necessidades daquele momento.