Por mais que algumas diferenças nem sempre muito óbvias entre os chassis de um utilitário de grande porte e o de um carro mais convencional pudessem levar a conclusões equivocadas quanto à viabilidade de produzir automóveis de perfil mais generalista desde o início da fabricação brasileira de caminhões Ford ainda na década de '50, um aparente descaso com o país já transparecia, e se refletia em gerações de caminhões e pick-ups full-size anteriores à F-250 lançada em '98, que chegavam ao Brasil obsoletas em relação ao mercado americano, enquanto até países como Venezuela e Argentina já acompanhavam mais de perto as evoluções da linha americana. E a bem da verdade, até a F-250 de certa forma expunha bem algumas mancadas da Ford, especialmente no tocante a opções de powertrain mas principalmente a maior disponibilidade de opções destinadas exclusivamente à exportação em determinados momentos na época que África do Sul e Austrália recebiam o modelo fabricado no Brasil com o cockpit à direita e opções que iam da cabine dupla original de fábrica à tração 4X4 cujas respectivas introduções oficiais ao modelo de especificação regional Mercosul eram sempre atrasadas. Mesmo considerando necessária uma regionalização das opções de motor turbodiesel, num primeiro momento com o Cummins B3.9 de 141cv e "só" 4 cilindros e logo em seguida o MWM Sprint 6.07 TCA de 180cv e 6 cilindros em linha que foi o único oferecido na África do Sul e chegou a ser oferecido na Austrália como uma opção mais austera ao V8 Power Stroke de 7.3L que no Brasil só equipou exemplares destinados à exportação com cockpit à direita, o fato de nunca ter sido vendida oficialmente pela Ford no Brasil uma F-250 equipada com câmbio automático entre '98 e 2011, e a tração 4X4 já oferecida desde o início para a Austrália e a África do Sul só ter chegado ao catálogo brasileiro no final de 2005 com uma nova versão de 203cv do motor Cummins incorporando gerenciamento eletrônico, certamente favoreceram outros modelos até de outras categorias e com um tamanho menor.
Lembrando que um chassi totalmente renovado para a linha Super Duty só surgiu nos Estados Unidos com o modelo de 2017, quando a F-250 já estava fora do mercado brasileiro e o relançamento da F-350 e F-4000 em 2014 ignorou qualquer alteração estética dos equivalentes estrangeiros e também deixava de lado a opção pela cabine dupla de fábrica na F-350, coube exatamente à Tropical Cabines como uma transformadora homologada pela Ford suprir aos clientes que desejavam ou efetivamente necessitavam desse recurso. Nesse caso já cabe até traçar um paralelo com a forma que a Tropical Cabines recorria ao plástico reforçado com fibra de vidro para a fabricação própria de componentes para a transformação de cabine simples em cabine dupla, e a forma como a Gurgel usou à exaustão esse mesmo material, apesar de caber uma ressalva pela Tropical ter sempre usado os chassis originais das caminhonetes ao contrário da Gurgel que chegou a produzir chassis próprios, podendo também ser feita até uma analogia entre as pick-ups transformadas e o encarroçamento de um chassi para ônibus. Tendo em vista a complexidade dos processos de homologação de veículos no Brasil atualmente, que no caso de alguns utilitários pode envolver desde um chassi básico até opções de carrocerias especializadas, eventualmente a Ford ainda pudesse ter aproveitado melhor a experiência da Tropical Cabines, concentrando-se apenas no chassi e opções de motor e transmissão, enquanto um fornecedor especializado que nos últimos anos de atuação esteve efetivamente devotado à Ford podia até haver implementado uma maior similaridade estética dos modelos nacionais com os similares americanos.
Por mais que a fábrica de São Bernardo do Campo onde era produzida a F-250 nacional tivesse sido um barril de pólvora no âmbito de ações judiciais trabalhistas e outros problemas entre a Ford e o sindicato dos metalúrgicos do ABC, a empresa ter desativado aquela operação que havia se tornado especializada em veículos pesados num mesmo momento que dependia do outsourcing junto à Otosan na Turquia no intuito de retomar a presença no mercado de caminhões na Europa Ocidental e com a Changan e a JMC na China visando atender tanto a segmentos de carros mais tradicionais quanto os SUVs e os utilitários para trabalho em geral soa um tanto incoerente. Tendo em vista que até hoje uma caminhonete full-size segue praticamente a mesma "receita" dos calhambeques acrescida de alguns "ingredientes" modernos, e portanto se enquadra naquela zona de conforto que a Ford buscou se posicionar, é inegável que havia um aproveitamento mais viável da operação brasileira no contexto de reestruturação a nível mundial. Enfim, mesmo à primeira vista parecendo "só" mais uma daquelas "brasilidades" difíceis de explicar a um estrangeiro que visita o Brasil pela primeira vez, uma F-250 com cabine dupla Tropical torna-se um bom exemplo de como a Ford negligenciou demasiadamente o mercado brasileiro mesmo quando tinha plenas condições de atender com mais empenho.
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