sábado, 20 de junho de 2020

Teria sido mais adequado às condições brasileiras o Jeep CJ-3B ao invés do CJ-5?

É muito comum supor que um veículo da geração imediatamente anterior de uma linha vá sempre ser "inferior" ao substituto, mas em alguns casos está longe de condizer com a realidade. Considerando a similaridade técnica e construtiva entre diferentes gerações em modelos como o clássico Jeep CJ, fica evidente que uma suposta defasagem pode esconder algumas vantagens práticas que não sobressaem a um primeiro olhar desatento. No caso específico do Jeep, o CJ-3B que chegou somente importado é um daqueles exemplos de quando poderia ter sido melhor prolongar o ciclo do modelo supostamente defasado no mercado brasileiro, ainda que eventuais aperfeiçoamentos pudessem ser aplicados como se chegou a implementar no sucessor.

Comprimento, largura, distância entre-eixos e diâmetro de giro um pouco menores em comparação ao CJ-5 que teve produção nacional fariam do CJ-3B mais indicado para enfrentar algumas condições de rodagem no interior ao proporcionar maior mobilidade diante de alguns obstáculos que pudessem ser encontrados. E mesmo considerando ainda uma intensa urbanização que o Brasil vivenciou durante o regime militar, exatamente o porte compacto ainda o mantinha satisfatório para atender ao público de grandes centros urbanos numa época em que o Fusca reinava absoluto, de modo que a rusticidade até certo ponto excessiva seria compreensível. Tendo em vista que por alguns anos o Jeep CJ-5 chegou a ter um preço menor que o de um Fusca 0km, não seria o caso de se duvidar que um CJ-3B poderia ter alcançado um valor até mais competitivo mesmo que tivesse saído de fábrica com uma capota rígida semelhante às que eram oferecidas como acessórios, em função da menor quantidade de chapa de aço necessária para produzir a carroceria e por ter usado só o motor com 4 cilindros da série Hurricane ao invés duma versão de 6 cilindros inicialmente usada pelo CJ-5 brasileiro antes de ser substituído pelo motor OHC do Ford Maverick com 4 cilindros.

No tocante a motores, o fato do CJ-3B se diferenciar do antecessor CJ-3A principalmente na altura do cofre do motor se devia à substituição do motor Go-Devil de válvulas no bloco pelo Hurricane que já tinha as válvulas de admissão no cabeçote, o que por si só já se mostrava tão favorável à adaptação de motores mais complexos quanto o CJ-5. Vale destacar que na Espanha o CJ-3B foi produzido com os motores Perkins 4.108 e Barreiros C-24/C-65 dada a preferência pelo Diesel naquele mercado, indo ao menos até '83 quando no Brasil encerrou-se a produção do CJ-5, e portanto já cabe até destacar o quão equivocado pode ser tratar uma geração mais antiga de um mesmo modelo como algo "inferior". Enfim, considerando que um tamanho mais compacto poderia beneficiar boa parte dos operadores, e melhorias de ordem técnica como novos motores e freios dianteiros a disco foram incorporadas em versões espanholas do CJ-3B a exemplo do que aconteceu com o CJ-5 no Brasil, eventualmente teria sido mesmo precipitado descartar o CJ-3B durante o ciclo de produção nacional do Jeep CJ.

terça-feira, 16 de junho de 2020

3 pretextos para preferir um motor com menos cilindros

Às vezes pode parecer que a quantidade de cilindros vá ser especialmente determinante para algumas características de um motor, desde a suavidade de marcha até a eficiência geral, passando pelo custo de fabricação. Um exemplo interessante foi o do motor BMW M10, usado em modelos como o 1602 da década de '70 e cujo bloco também serviu de base para o motor M12 destinado à Fórmula 1 com o qual Nelson Piquet conquistou o 2º de 3 campeonatos na categoria em '83 com apenas 4 cilindros em meio aos V6 que dominavam a primeira "era turbo". Mas nem mesmo algumas vitórias na vitrine de tecnologia automotiva que a Fórmula 1 representou durante algumas décadas conseguiram convencer o público generalista de que um motor com menos cilindros possa ser efetivamente melhor em alguns casos, embora haja uma série de outros pretextos mais práticos que possam ressaltar tais condições.

1 - menos partes móveis: além do custo envolvido nos processos industriais de forja e usinagem que a produção de uma maior quantidade de componentes acarreta, não se pode ignorar reduções no atrito e na inércia que por exemplo um comando de válvulas mais simples, compacto e leve já proporciona, bem como efeitos na economia de combustível e redução de emissões. Não é à toa que às vezes um motor mais pé-duro com 4 cilindros como o Cummins ISF2.8 que equipa o caminhão Volkswagen Delivery 6.160 parece uma opção razoável apesar da potência e torque desproporcionalmente mais modestos em comparação a um V6 de 3.0L como o Ford Lion/Jaguar AJD ainda usado no Land Rover Discovery 5 Td6 cuja complexidade é bastante conhecida. Só pelo ISF2.8 ter os 4 cilindros dispostos em linha, já tem um cabeçote a menos, e ainda tem um eixo único de comando de válvulas enquanto o AJD V6 tem 2 para cada cabeçote, totalizando 4 eixos de comando;
2 - avanços na mitigação do turbo-lag: naturalmente quando um motor com os cilindros em V usa 2 turbocompressores de tamanho menor em cada bancada ao invés de um único pode parecer melhor, tendo em conta a mitigação do turbo-lag tanto devido ao posicionamento mais próximo aos coletores de escapamento quanto por terem uma menor inércia individual, mas não cabe ignorar que um turbo único com tamanho maior possa proporcionar bons resultados num motor com 4 cilindros em linha tanto por já estar mais próximo do coletor de escape quanto por ser possível recorrer a uma turbina twin-scroll ou "bipulsativa" que proporciona maior eficiência na pressurização. E apesar de que as tubulações mais complexas que a configuração twin-turbo requer, bem como resfriadores de ar (intercooler) separados para cada linha de pressurização, não há impedimento para que seja usada em motores com os cilindros em linha, de modo que seria tecnicamente possível até mesmo uma eventual nova geração de motores turbodiesel com 4 cilindros comparável ao Cummins ISF2.8 substituir o AJD sem deixar saudades;

3 - refrigeração mais homogênea: não é novidade que o Fusca e outros modelos equipados com o motor Volkswagen boxer de 4 cilindros refrigerado a ar costumam apresentar uma deficiência na refrigeração, de modo que frequentemente o 3º cilindro costuma apresentar temperaturas mais altas que os demais.
Irregularidades no percurso do ar de impacto ao redor das camisas de cilindro e dos cabeçotes seriam menos intensas num motor boxer de 2 cilindros por exemplo, e não há impedimento para a produção de motores flat-twin refrigerador a ar e óleo com uma cilindrada compatível a um bom desempenho num modelo do porte do Fusca, tomando por referência o bom e velho motor BMW "oilhead" que tão bem serviu a motocicletas como a BMW R 1150 GS;

Naturalmente é impossível estabelecer uma verdade absoluta no tocante a motores, como a própria BMW Motorrad demonstra ao abranger desde as G310 R e GS com o motor de 1 cilindro projetado originalmente em função de atender às condições de mercado da Índia numa parceria com a empresa TVS até a opulência das K1600 com um glorioso "seis canecos" que já seria capaz até de movimentar um carro de porte médio. Mas a princípio, assim como a BMW demonstrou numa circunstância mais extrema ao levar um motor com 4 cilindros à glória máxima do automobilismo na década de '80, uma solução técnica mais modesta como recorrer a uma quantidade menor de cilindros pode servir bem a algumas utilizações.

quarta-feira, 10 de junho de 2020

5 motivos que ainda me fariam considerar a hipótese de comprar um Fusca

Dentre tantos carros que marcaram a história do Brasil, não há dúvidas de que o Fusca se destaca pela relevância que alcançou como um sucesso comercial durante o primeiro ciclo de produção, e também por haver sido alçado à condição de um verdadeiro ícone cultural. Em conversas com estrangeiros, às vezes a popularidade do besouro no país chega a ser objeto de mais atenção que temas como o samba, o futebol, a cachaça e a feijoada. E por mais que já não seja tão comum se deparar com um Fusca em uso cotidiano como ainda era por volta de 15 anos atrás, ainda há uma série de motivos que me levam a não considerar tão absurda a possibilidade de comprar um.

1 - o fator nostalgia: não posso negar que esse eventualmente seja o motivo mais relevante. Mesmo que um carro "popular" moderno pareça uma opção um tanto óbvia, além do mais que recentemente é mais incomum encontrar assistência técnica independente que não trate o Fusca com algum descaso, é inegável que deixou marcas na memória afetiva da imensa maioria dos brasileiros com mais de 20 anos;

2 - aptidão para trafegar em condições ambientais severas: não só o velho mote de que "o ar não ferve nem congela", amplamente reverberado na publicidade, mas também a configuração de motor e tração traseiros favorecendo a trafegabilidade nas mais variadas condições de terreno ainda são bons argumentos a favor do Fusca. Se usar pneus mais cravudos atrás e em último caso adaptar um sistema de frenagem seletiva manual individual das rodas traseiras, chega a lugares onde muitos veículos 4X4 destinados a um mero exibicionismo jamais chegarão;

3 - flexibilidade para fazer uma restomod: pode parecer contraditório defender um carro "velho" e demonstrar alguma simpatia por alterações substanciais na parte mecânica, mas a bem da verdade um Fusca bem reformado mesmo que se altere da motorização aos freios passando pelas suspensões para não ficar devendo em praticamente nada a modelos mais modernos nesse aspecto ainda preservaria uma parte considerável da imagem nostálgica. E se fosse o caso de radicalizar mais, o fato de contar com um chassi separado da carroceria possibilita até algo mais drástico como fazer um chassi novo já incorporando até algumas melhorias que inicialmente pareçam impossíveis ou muito improváveis de implementar num Fusca, mas manter as linhas básicas originais ao olhar somente pelo lado de fora;

4 - tamanho suficientemente compacto em comparação a modelos modernos: por mais que possa ser questionada a capacidade volumétrica para bagagens, e o acesso ao interior seja prejudicado pela configuração de apenas duas portas, o entre-eixos curto e a largura total abaixo da média dos modelos mais vendidos na atualidade fazem com que um Fusca não esteja tão desfavorecido. O comprimento não chega a ser tão favorecido nesse aspecto, mas também não chega a estar numa desvantagem que se faça notar;

5 - motivação cultural: por mais que alguns ignorantes possam subestimar a preservação de veículos clássicos como atividade de cunho cultural, especialmente em meio à demonização que tem sido feita com relação ao automóvel por setores da mídia e da política sob falsas premissas "ecológicas", não se pode negar que um resgate da memória industrial e do desenvolvimento urbano do Brasil deve incluir a importância do Fusca na pauta. Desde o fato de tornar o automóvel próprio mais próximo da classe média em outros períodos históricos, passando pela hegemonia que a Volkswagen chegou a dispor no mercado automobilístico brasileiro com o sucesso do Fusca e derivados, também é conveniente frisar o ressurgimento como ícone tanto em meio a uma cultura mais conservadora quanto na contracultura que remonta à época dos hippies junto à qual sem dúvidas o projeto eficiente e minimalista do Fusca ainda encontra alguma simpatia maior do que qualquer outro carro "popular" de fora da Cortina de Ferro encontraria. Pode-se considerar o Fusca praticamente um pacificador, dada a capacidade que tem de atrair e eventualmente congregar públicos muito diferenciados.

quinta-feira, 4 de junho de 2020

Veleiro de 2 cascos

Embarcações com 2 cascos, mais conhecidas como catamarã, me chamam a atenção entre outros aspectos pela maior estabilidade que costumam apresentar mesmo em trechos de mar mais revolto. Esse foi o primeiro veleiro que eu vi com essa configuração, embora não seja o único e muito menos o primeiro.


terça-feira, 2 de junho de 2020

Momento nostalgia: Suzuki GSX-R 750 SRAD 2000

Uma daquelas motos esportivas que se destacavam pela modernidade na época que eram novas, mas que hoje não são mais tão comuns de se ver regularmente, a Suzuki GSX-R 750 da primeira geração a contar com o sistema SRAD (Suzuki Ram Air Direct) para captação do fluxo de ar de admissão em zonas com maior pressão aerodinâmica em altas velocidades tornou-se uma clássica. Originalmente lançada em '96 com uma revisão mais extensa no ano 2000 sendo produzida até 2003 sem alterações muito substanciais, teve em '99 introduzida a injeção eletrônica que era então uma raridade em motos. No ano 2000, além de revisões no chassi e na carenagem, o próprio sistema SRAD também recebeu alguns aperfeiçoamentos, além da injeção eletrônica ter passado a proporcionar uma compensação de variações na pressão atmosférica mais efetiva, proporcionando uma experiência de pilotagem ainda mais satisfatória em trajetos montanhosos. Também é digno de nota o fato da Suzuki ter sido a última das fabricantes japonesas a dar mais atenção à faixa de cilindrada de 750cc que as ditas "superbikes" passassem a adotar a faixa de 1000cc como padrão.

segunda-feira, 1 de junho de 2020

Reflexão: Volkswagen Logus e Pointer e a mudança na preferência das carrocerias de duas para 4 portas

Dentre tantas transformações do mercado brasileiro nos anos '90, sem sombra de dúvidas juntamente à reabertura das importações e da ascensão dos "populares" figurou a perda de espaço para os carros de duas portas. No segmento dos médios, pode-se creditar a falta da opção por 4 portas como um dos motivos que levaram o Volkswagen Logus a não ter sido um grande sucesso comercial e ser hoje uma raridade, embora não seja o único exemplo dessa mudança na preferência do público generalista. Em que pese o fato de ter usado uma plataforma da Ford, mais especificamente a do Escort Mk.5 e que de certa forma despertava uma rejeição por parte do público tradicional da Volkswagen, fica evidente a menor receptividade por uma carroceria de duas portas num modelo de pretensões mais familiares.

Outro derivado do Escort que foi oferecido pela Volkswagen, o Pointer contou com a configuração de 4 portas mas também penou pela rejeição a alguns produtos da joint-venture AutoLatina que uniu as operações da Ford às da Volkswagen no Brasil e na Argentina, apesar da praticidade ter feito com que alguns consumidores abrissem mão de uma maior capacidade do bagageiro do Logus por um acesso mais cômodo para os passageiros do banco traseiro. E apesar do próprio encerramento da AutoLatina em '96 ter abreviado o ciclo de produção do Logus originalmente lançado em '93 e do Pointer que foi lançado posteriormente em '94, não se pode negar que também era de certa forma contraditório que só o hatch supostamente "inferior" ao sedan/cupê com o qual dividia a plataforma ter a configuração de portas que viria a se tornar favorita do mercado após aquele momento de transição.
Num momento em que a carroceria hatch passava a ser preterida apesar da maior praticidade para uso em centros urbanos de características coloniais européias em comparação aos sedans, que por sua vez tinham o formato da carroceria associado equivocadamente a uma imagem de "prestígio" tão comum aos olhos do público generalista nos países do terceiro mundo, não deixa de ser oportuno destacar que o fim da obsessão brasileira por carros de duas portas marcava o fim de uma influência que remonta ao sucesso comercial do Fusca em outras épocas, que entretanto não se refletiu na fase "Itamar" entre '93 e '96 quando o fato de ter duas portas a bem da verdade parecia ser o menor dos problemas para quem o considerava defasado. Enfim, se por um lado ainda tem quem se atraia por um apelo supostamente "esportivo" ou se iluda com a idéia de menos manutenção e eliminação do risco de abertura acidental por crianças antes do advento das travas de segurança, a década de '90 certamente ficou marcada também como o período em que a carroceria de duas portas foi do céu ao inferno junto ao público brasileiro.