O mercado brasileiro tem experimentado uma série de alterações nos últimos anos, dentre as quais uma menor dependência que vinha sendo observada com relação a hatches "populares" para fazer volume de vendas, embora a demanda por essa categoria ainda justifique desde a adequação de projetos destinados à Índia como o Renault Kwid até o desenvolvimento de um modelo direcionado especificamente para o Brasil como o Hyundai HB20. Naturalmente, é questionável até que ponto uma retração econômica seja um bom parâmetro para avaliar padrões de consumo, sobretudo num país tão complexo quanto o Brasil, mas não deixa de chamar a atenção como a eventual influência de um aplicativo pode fortalecer de uma forma sem precedentes a renovação de frota. Ainda que pudesse ser observada uma maior procura pelos itens de conforto e segurança em modelos generalistas antes da chegada do Uber ao Brasil e de haverem se tornado obrigatórios o airbag duplo e os freios ABS, é difícil negar a influência do aplicativo junto a uma parte considerável do público consumidor tanto de automóveis 0km quanto dos ditos "seminovos".
A prevalência da carroceria com 4 portas, a ponto de hatches generalistas atuais como o Fiat Argo não oferecerem a opção por duas portas nem nas versões mais básicas, contrasta com o que ainda ocorria na época do primeiro Fiat Palio Fire no qual a carroceria de duas portas até encontrava uma quantidade de consumidores que justificasse mantê-la em linha. Seja pelo maior apelo da praticidade das 4 portas para o uso familiar ao qual se propunha um carro "popular", seja por eventualmente ainda ter prevalecido um argumento de que só duas portas simplificaria a manutenção e proporcionaria mais rigidez estrutural em comparação à outra opção e eventualmente acabassem sendo mais utilizados em condições de rodagem severas a ponto de poucos remanescentes em bom estado de conservação serem encontrados, já não era tão imprevisível que a situação ganhasse os contornos atuais. E além da maior oferta de equipamentos de conforto e segurança tornar-se um bom argumento a favor de modelos mais recentes, não é possível ignorar que o limite de idade de até 10 anos para um carro ser utilizável em aplicativos como o Uber já faz com que alguns possam preferir gastar mais no financiamento de um Argo até eventualmente com a intenção de usar para complementar a renda ao invés de um Palio Fire com a carroceria usada até 2007 e que pela idade já estaria impossibilitado de atender a essa função mesmo que pudesse servir bem a um uso estritamente particular.
Por mais que um aspecto meramente racional possa fazer com que dentre modelos mais simples ocorra um maior interesse pela renovação de frota, é evidente que outras motivações mais subjetivas podem ter o efeito oposto mantendo o interesse por modelos usados, mas de categorias superiores a exemplo da 1ª geração da Volvo V70. Não se pode negar que um carro importado de luxo da década de '90 até chegue a ter um preço atrativo no mercado de usados, mesmo que a correta manutenção siga num patamar mais oneroso em comparação a um "popular" nacional ao longo de toda a vida útil estendida, e também que a intensificação de uma renovação de frota em segmentos mais modestos altere a percepção do público de que um carro possa ser visto como "colecionável" antes de completar 30 anos que é a idade na qual já é possível registrar como tal exemplares de qualquer modelo com a originalidade preservada. Seria pouco provável que veículos mais próximos de alcançar esse status corram o risco de serem sucateados mais frequentemente, mas não causaria tanta surpresa que modelos das categorias mais modestas com custos de aquisição e manutenção atrativos a motoristas de aplicativo possam sofrer mais intensamente entre a faixa de 11 a 29 anos de idade esse fenômeno mesmo que não sejam aplicadas restrições à circulação em determinadas cidades com base na idade a exemplo do que ocorre até na Índia onde veículos movidos a gasolina com mais de 15 anos ou Diesel com mais de 10 são proibidos de circular em Nova Délhi.
É previsível que não só o Uber, mas também a terceirização de frotas de empresas a cargo de locadoras, influenciem ainda mais o mercado com a ampliação da oferta dos ditos "seminovos" com menos de 10 anos, e a princípio seria de se esperar que um excesso de demanda justifique uma depreciação mais alta a ponto de tornar-se atraente a uma parte do público que atualmente busca por veículos já por volta dos 15 a 20 anos de idade que passariam a correr um risco maior de serem destinados ao sucateamento ou a usos tão severos que reduzam muito o que ainda possam oferecer de vida útil estendida. Naturalmente, a hipótese de um Ford Ka da atual geração ao chegar a 9 anos de uso ser visto da mesma forma que um Ford Fiesta dos primeiros a usarem motor Zetec Rocam é visto hoje já na faixa dos 20 anos poderia soar inicialmente exagerada, mas o mercado brasileiro tem sofrido algumas mudanças muito significativas nesse meio-tempo. Enfim, mesmo que outros fatores já exercessem alguma influência, é difícil negar que a ascensão do Uber possa ser o estopim que faltava para a renovação de frota deixar de parecer tão distante da realidade brasileira.
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