Não é de hoje que o consumidor brasileiro vê com algumas ressalvas um tanto injustificáveis a presença de motores com apenas 3 cilindros em alguns veículos, embora no segmento dos "populares" a resistência a esse layout esteja sendo vencida em modelos como o Hyundai HB20 e o Volkswagen Fox BlueMotion.
O próprio Fox, em versões anteriormente exportadas à Europa, contava com motores de 1.2L a gasolina e 1.4L turbodiesel de 3 cilindros. Apesar da menor quantidade de pulsos de torque, estes tem duração e intensidade maiores, favorecendo o desempenho em comparação a motores de 4 cilindros nas mesmas faixas de cilindrada. A menor quantidade de peças móveis gera menos atritos internos, e como cada cilindro passa a ter uma proporção maior sobre o deslocamento total do motor, há menos das chamadas "perdas por bombeamento", e assim ganha-se em eficiência geral.
Um caso emblemático foi quando o Opel Corsa B passou a ser produzido no Brasil em '94: o motor de 1.0L disponibilizado localmente tinha 4 cilindros, ao contrário do similar europeu que nessa mesma faixa de cilindrada já adotava o layout de 3 cilindros. A princípio, a decisão pelo motor de 4 cilindros deveu-se inicialmente a um menor investimento necessário em ferramental para a produção, podendo compartilhar mais elementos com o de 1.4L, mas naturalmente pode-se levar em consideração algum temor por uma rejeição de um mercado que, em função de um profundo isolamento técnico, manteve-se muito conservador. Para efeito comparativo, considerando motores de 1.0L com injeção eletrônica monoponto, duas válvulas por cilindro e comando simples no cabeçote, vale tomar por referência o Suzuki Swift: enquanto o Corsa rendia potência de 50cv a 5800 RPM e torque de 7,8 kgf.m a 3200 RPM, o Swift desenvolvia 55 cv a 5700 RPM e 8 kgf.m a 3300 RPM. Mesmo com o uso de carburador em algumas versões, o Swift não fazia feio com 48 cv a 5100 RPM e 7,8 kgf.m a 3200 RPM.
Durante a década de '80 chegaram até a haver aplicações de motores de 3 cilindros em caminhões leves, como o Agrale 1600D. Contava com o motor MWM D229-3 de 2.9L numa versão de 67 cv. Quando motores Diesel de 4 cilindros e alta rotação ainda não eram uma realidade consolidada no restrito mercado brasileiro, também encontrou alguma popularidade no repotenciamento de pick-ups full-size como as Chevrolet C10 e Ford F100/F1000 em substituição a sedentos motores de 6 ou 8 cilindros a gasolina.
Atualmente, embora não seja um ponto tão amplamente discutido como foi a transição dos motores de 6 cilindros para 4 cilindros em caminhões médios como os Ford Cargo 1317e e Volkswagen 17-190, não seria de se estranhar que num futuro não muito distante surgisse um interesse pela configuração de 3 cilindros, impulsionado sobretudo por uma perspectiva de redução nos custos associados a alguns componentes que vem ficando cada vez mais sofisticados para atender às novas normas de emissões de poluentes, como os bicos injetores. Um único bico usado num motor com injeção eletrônica common-rail chega a ser mais caro que todos os bicos de um motor com injeção 100% mecânica. Pois bem, tomando por referência os motores Cummins ISB4.5 de 4 cilindros com 4.5L de cilindrada, 189 cv a 2300 RPM e 600 Nm entre 1100 e 2100 RPM usado em algumas versões do Cargo até 17 toneladas, o MAN D08 de 4 cilindros com 4.8L, 186 cv a 2500 RPM e 700 Nm entre 1100 e 1600 RPM, e o Cummins ISL de 6 cilindros com 9.0L gerando 400 cv a 2100 RPM e 1700 Nm entre 1100 e 1500 RPM, não seria algo tão inconcebível um motor de e cilindros com 4.5L na faixa de 190 cv com um torque de 800 Nm para uso em caminhões médios...
Ainda com referência a utilitários, um caso interessante a se analisar é o da atual geração da Chevrolet S10: o motor básico oferecido no modelo tem 4 cilindros, 2405cc, e 141 cv a 5200 RPM e torque de 219 Nm (22,3 kgf.m) a 2800 RPM rodando com gasolina, valores que vão a 147 cv e 236 Nm (24,1 kgf.m) nas mesmas faixas de rotação ao usar etanol. Embora pareça absurdo comparar um motor de caminhonete a um motor de motocicleta, considero conveniente mencionar o motor de 3 cilindros e 2294cc da Triumph Rocket III Roadster, que gera 148cv a 5750 RPM e 219 Nm a 2750 RPM ao usar gasolina, levando portanto uma ligeira vantagem na faixa de rotação do pico de torque, que seria até bem apreciável num utilitário. O tamanho mais compacto do motor e o menor peso também seriam benéficos ao aproximar mais a concentração de peso ao centro do veículo.
Para quem considere injusto comparar um motor de 4 válvulas por cilindro e comando duplo no cabeçote contra o de duas válvulas por cilindro e comando simples usado na S10, vale destacar que o motor da Triumph Rocket III Roadster também leva vantagem no torque em comparação com o Duratec de 2.3L usado em algumas versões antigas da Ford Ranger, que entrega 145 cv a 5250 RPM e 209 Nm a 4250 RPM.
No Japão os motores de 3 cilindros fazem ainda bastante sucesso entre os kei-cars, como o Subaru Vivio e o Daihatsu Mira/Cuore que chegaram a ser importados oficialmente durante a década de '90. No caso do Vivio, com 660cc, dentro dos mesmos padrões impostos pelo governo japonês para se encaixar numa faixa de tributação menos pesada, enquanto o Cuore recorria a um motor de 800cc oferecido apenas em mercados de exportação.
Num país com escassos recursos naturais, a menor energia a ser gasta na produção de componentes e montagem final dos motores, além da menor quantidade de matérias-primas requeridas, faz com que esse layout se consolidasse nessas faixas de cilindrada, além do tamanho mais compacto facilitar a otimização do espaço em carros tão pequenos. Até utilitários como o Suzuki Jimny recorrem a essa configuração de motor por lá...
Por mais que um motor de 3 cilindros inicialmente possa soar como uma "economia porca", as vantagens são evidentes em distintos cenários operacionais...
3 comentários:
Ya vi unas pickups en Argentina con motor Deutz de 3 cilindros enfriado por aire.
Daniel, excelente artigo. Muito interessante a comparação dos motores da S-10 e da moto Triumph! Abraço.
Foi justamente esse motor da Triumph que me deixou fissurado pelos motores de 3 cilindros.
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