segunda-feira, 20 de abril de 2020

5 situações que reforçam o atual fracasso do carro "popular"

Que a intenção de alguns dos conceitos de carro popular era válida, não se pode negar. No entanto, em meio às distorções que ocorrem em mercados como o brasileiro, a idéia de considerar a cilindrada como principal parâmetro tornou-se claramente obsoleta à medida que tanto os níveis de exigência do público quanto algumas regulamentações de consumo e emissões levaram a uma maior sofisticação que naturalmente se reflete nos preços iniciais. Há uma infinidade de motivos que podem ser listados entre os que levam o conceito de carro "popular" inicialmente lançado durante o governo Collor e que viria a se consolidar durante a presidência de Itamar Franco a tornar-se ineficaz na atualidade, sendo possível destacar ao menos 5.

1 - negligenciar as necessidades do público rural: tomando por referência o caso do Fusca, que foi relançado entre '93 e '96 beneficiado por uma provisão burocrática que foi essencial para a Volkswagen retomar a produção do modelo ao equiparar para fins da alíquota reduzida de IPI o motor de 1.6L refrigerado a ar com os de 1.0L refrigerados a água usados em outros modelos, é relevante destacar a maior aptidão a condições de terreno mais severas para as quais a configuração de motor e tração traseiros se mantinha mais apropriada em diferentes condições de carga. A prevalência da tração dianteira em compactos de gerações posteriores, por mais que atenda bem ao público urbano, está mais sujeita ao efeito das alterações na distribuição de peso entre os eixos de acordo com a carga, e portanto pode não oferecer a mesma desenvoltura em trechos não-pavimentados. O mais próximo de conciliar uma adequação às necessidades do público urbano sem deixar de atender às necessidades do público rural foi o projeto dos Gurgel BR-800 e Supermini, que mesmo com motor dianteiro e tração traseira contavam com uma distribuição de peso de 50% entre os eixos que se aproximava mais do eixo motriz de acordo com a carga, proporcionando uma capacidade de incursão por terrenos irregulares mais próxima do Fusca que de meras versões depauperadas de modelos generalistas;

2 - inadequação entre um motor eventualmente subdimensionado para um veículo mais pesado: por mais que um motor de 1.0L possa atender bem a um hatch subcompacto como o Renault Kwid, é natural que vá sofrer mais diante do esforço maior para atender por exemplo a um sedan que apesar de ser classificado como compacto é sensivelmente mais pesado mesmo sem estar com carga máxima tomando por exemplo o Renault Logan. Por mais que até na Europa o Logan já seja oferecido com o motor 1.0 de aspiração natural, e em alguns países já é o único motor somente a gasolina oferecido na atual geração, compromete-se em demasia o desempenho e o consumo quando um motor maior pode operar com mais folga valendo-se de faixas de rotação mais modestas e relações de marcha mais longas, beneficiando economia e durabilidade;

3 - downsizing: para beneficiar-se da alíquota de IPI reduzida que beneficia os motores 1.0 diante de similares com cilindrada mais alta, tem ganhado espaço o uso do turbo. Tomando como referência a linha do Hyundai HB20, que na 2ª geração conta com motores 1.0 de aspiração natural com injeção nos pórticos de válvula ou turbo com injeção direta e o 1.6 sempre com aspiração natural e injeção nos pórticos de válvula, chama a atenção o caso do HB20X que vai na onda dos soft-roaders e busca se distanciar das versões mais generalistas ao oferecer além do 1.6 aspirado o 1.0 somente na versão turbo, que a bem da verdade só faz sentido por conta da tributação diferenciada. Ironicamente o sedan HB20S conta com a opção pelo 1.0 aspirado, mesmo sendo mais pesado e portanto sendo desejável um motor mais vigoroso;

4 - não-inclusão de utilitários na regulamentação: pode parecer incoerente diante da glamurização que se criou em torno de certas categorias de veículo como jipes, mas ignorar o eventual uso de um modelo como o Suzuki Jimny tanto como veículo particular ou até mesmo familiar simultaneamente a eventuais aplicações a trabalho não deixa de ser algo estúpido. Atualmente a alíquota de IPI para os utilitários não faz qualquer distinção por faixas de cilindrada, de modo que só compensa trazer para o Brasil o Jimny Sierra com motor de 1.5L ao invés de vir também alguma versão kei com motor de 0.66L turbo que é oferecida no mercado japonês onde modelos nessa faixa de cilindrada que também estão sujeitos a restrições quanto às dimensões externas e potência máxima de 64cv contam com alguns benefícios específicos;

5 - a presepada dos "compactos premium": por mais que em mercados como o sudeste asiático um modelo como o Toyota Yaris XP150 seja reconhecido como o pé-duro que de fato é, chegou ao Brasil com uma imagem de prestígio que não faz jus. A bem da verdade, a imagem da Toyota em qualquer mercado desenvolvido é a de um "Fusca japonês" que não decepciona mas também não empolga, e o fato do Yaris brasileiro ser na verdade um modelo simplificado derivado do Vios desenvolvido em função da China e da Tailândia onde o Yaris comercializado no Japão e na Europa seria demasiado caro apenas reitera o quão abusivo é a Toyota do Brasil fazer o consumidor de trouxa ao vender uma mula de cigano a peso de ouro.

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