Emblemática foi a inclusão do Fusca no programa do carro popular em '93, quando o então presidente Itamar Franco precisou instituir uma equiparação de motores até 1600cc (no caso do Fusca 1584cc para ser mais específico) refrigerados a ar com relação aos motores até 1000cc de refrigeração líquida, tendo em vista que diminuir o motor do Fusca para a mesma faixa de cilindrada dos 1.0 teria um resultado tão insatisfatório quanto potencialmente perigoso, inviabilizando um uso nos eventuais trajetos rodoviários que seriam inevitáveis a um carro destinado a ser eventualmente o único de um núcleo familiar. Talvez até fizesse mais sentido impor o limite de cilindrada até 1300cc para os motores refrigerados a ar, tendo em vista que o próprio Fusca chegou a usar um motor de exatos 1285cc que diga-se de passagem foi o primeiro a ter opção por uma versão a álcool ainda durante o regime militar quando a homologação dos primeiros motores a álcool acabava sendo bastante específica naquela fase inicial do ProÁlcool, sendo usado o motor 1300 a álcool também em outros modelos cujo motor 1600 era o único especificado nas versões a gasolina. Mas a princípio o Fusca Itamar ter recorrido ao motor 1600 tinha outras conotações, inclusive de cunho político e para "marcar território" diante da "ousadia" do antigo cliente Amaral Gurgel que se distanciava do uso de motores Volkswagen no projeto do carro popular, ao invés de se ater a critérios estritamente técnicos, e que se revelaram cruciais para a Volkswagen avaliar a viabilidade do relançamento do Fusca em meio a uma economia conturbada e um governo que de modo geral se revelava impopular.
Embora os custos da reativação da linha de produção do Fusca tenham sido amortizados, e gerado lucro ainda que pequeno para os padrões de um fabricante generalista, um benefício maior para a Volkswagen foi a Kombi também ter sido contemplada com o IPI reduzido para os carros populares enquanto durou a equiparação dos motores 1.6 refrigerados a ar e 1.0 de refrigeração líquida, descontinuados já durante o primeiro mandato presidencial de Fernando Henrique Cardoso. É impossível deixar de fazer analogias entre essa medida tão específica e o caso dos carros japoneses da categoria kei, limitados em cilindrada até 660cc e potência até 64cv com ou sem recurso ao turbocompressor, e também restrições ao tamanho externo que se aplicam sem distinções por tipo de carroceria ou se a espécie dos veículos em questão é automóvel ou utilitário, situação que deixou de ter qualquer similaridade no Brasil tão logo o IPI para utilitários deixou de ter qualquer distinção por faixas de cilindrada e a Kombi mesmo continuando com o motor 1600 refrigerado a ar deixou de contar com tal benefício. Embora a rede de concessionárias e oficinas autorizadas da Volkswagen fosse a mais abrangente do Brasil, e tanto o Fusca quanto a Kombi fossem um parâmetro conhecido por todos os mecânicos e oficinas independentes tanto nas principais capitais quanto pelos mais distantes rincões do interior, a Kombi ter figurado no programa dos carros populares foi certamente útil para o modelo resistir à reabertura das importações na década de '90 com a chegada de vans modernas com motores Diesel de alta rotação e mais equipamentos de conforto como ar condicionado ao menos como opcional e direção hidráulica de série tornando-se uma concorrência particularmente acirrada...
Observando ainda aquela peculiaridade do Japão com os veículos da categoria kei, bem como a moda de SUV que ganhou força a nível mundial se refletindo também no Brasil, o exemplo da Suzuki com o clássico Samurai e o Jimny Sierra chama a atenção pela forma como o IPI para utilitários sem distinção por faixas de cilindrada tornar difícil de justificar a importação de versões com os motores de 660cc que se usa nas versões enquadradas no que pode ser considerado o análogo japonês ao programa dos carros populares brasileiros. Com o Samurai tendo vindo principalmente com um motor 1.3 a gasolina que foi o mais usado em mercados internacionais, embora o F10A também tenha sido oferecido na Europa e na Indonésia exatamente para recolher menos impostos e até alguns exemplares tenham chegado ao Brasil, e o Jimny Sierra vindo somente com um motor 1.5 a gasolina que é o único oferecido fora do Japão, até pode parecer mais atraente para o representante da Suzuki no Brasil um apelo mais prestigioso inerente à forma como a tração 4X4 é vista como uma "especialidade", deixando de lado alguma possibilidade de atender bem a efetivas necessidades de uma parte do público rural enquanto atende bem à proposta de uso recreativo e mais eventual das capacidades de incursão off-road. Por mais que motores turbo das versões kei enquadradas no limite de 660cc em vigor no Japão pareçam mais difíceis de justificar por ficarem muito abaixo do limite de cilindrada para um carro popular no Brasil, e o fato de hoje um motor 1.5 ser o único usado no Suzuki Jimny Sierra fomentar alguma desconfiança quanto à viabilidade de um motor 1.0 aspirado e a aerodinâmica de um tijolo impor maiores esforços durante um eventual tráfego rodoviário, ainda é um exemplo que limitar o conceito de carro popular a hatches pode ser equivocado.
Com a preferência de uma parte do público por modelos mais espaçosos, e tomando como referência na linha Chevrolet as versões sedan e wagon do Corsa, jé é possível observar que uma maior versatilidade hoje cada vez mais direcionada a modelos mais lucrativos como pick-ups compactas de cabine dupla e SUVs invariavelmente afasta potenciais clientes mais austeros para os fabricantes tradicionais, levando a uma procura pelos carros usados, pela percepção de se estar levando "mais carro" a preço menor tanto com relação ao tamanho e eventualmente motorização acima de 1.0 quanto ao nível de equipamento. O fato do Corsa Sedan ter contado com o motor 1.0 com 8 ou 16 válvulas, e da Corsa Wagon ter oferecido por um período bastante breve o motor 1.0 com 16 válvulas, também acabavam evidenciando uma certa preocupação com a redução dos custos de manutenção quando motores com duas válvulas por cilindro ainda eram o mais habitual, embora hoje motores com 4 válvulas por cilindro sejam mais aceitos pelo público generalista e um motor 1.0 de hoje também acabe sendo competitivo diante de motores maiores nos modelos de 10 a 20 anos atrás. A aptidão para atender melhor às necessidades de uma família tanto nos deslocamentos urbanos cotidianos quanto para viagens a lazer ou o rancho do mês no supermercado é algo que convém recordar, ao invés de deixar prevalecer uma idéia medíocre de restringir a apenas um tipo de carroceria as opções para quem se vê compelido a optar pelo carro popular.
Considerando ainda como o motor 1.0 aspirado às vezes é visto equivocadamente como uma jabuticaba que só existiria no Brasil em contraste com a forma como um congênere turbo é tratado como algo mais alinhado às premissas do downsizing e portanto justificável num contexto internacional, com o caso do Chevrolet Onix tendo versões 1.0 tanto aspiradas quanto turbo para o mercado brasileiro enquanto para exportação regional o 1.0 turbo é complementado pelo 1.2 aspirado, a carga tributária um tanto obscena aplicada de um modo geral é um problema para o qual o conceito de carro popular é um mero paliativo. Por mais justificável que seja estabelecer uma alíquota mais favorável de impostos a veículos com um motor mais eficiente, que por sua vez proporcionariam também índices de emissões de poluentes menos exacerbados, o fato dos carros mais básicos à venda hoje no Brasil incorporarem uma quantidade maior de equipamentos de conforto e conveniência ao invés de simplesmente atenderem a um mínimo exigido quanto a normas de segurança pode tornar mais difícil justificar uma depauperação a título de "renovar" o conceito de carro popular promovendo um retrocesso. Enfim, por mais que uma parte do público dos carros novos hoje até pudesse se dar por satisfeito com a supressão de alguns equipamentos visando um custo inicial menor, seria como enxugar gelo, e uma carga tributária excessiva é o maior problema.
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