Partindo daquela premissa que o carro popular como nós conhecemos na década de '90 praticamente já deixou de existir, e deixando um pouco de lado o quão estúpido pode soar simplesmente definir como o parâmetro que atribuía tal condição a um carro seja tão somente a cilindrada, só o fato da versão 1.0 do Escort Mk.4 ter sido desenvolvida até mais por uma iniciativa direta da Abradif (Associação Brasileira de Distribuidores Ford) que por interesse da própria Ford já soava curioso. E como no Brasil o Escort foi inicialmente equipado com motores 1.3 e 1.6 cujo projeto básico proveniente da Renault havia caído nas mãos da Ford em meio ao espólio da antiga subsidiária local da Willys-Overland, e que já previa até versões 1.0 na Europa mas com diferenças em comparação à forma um tanto improvisada como ocorreu no CHT brasileiro, acabou havendo uma síndrome de vira-lata com relação à redução de cilindrada que, se por um lado estava longe de ser algo efetivamente desejável, foi útil para a Ford ter um modelo mais fácil de desovar durante a consolidação do segmento de carros populares. Sem precisar fazer alterações muito extensas no ferramental da antiga fábrica de motores em Taubaté, o motor CHT 1.0 até atendeu bem a uma implementação um tanto imediatista e tinha a facilidade de serem possíveis instalações tanto transversal no Escort quanto longitudinal como era usado no Gol.
Tendo em vista que era a época da AutoLatina, e que no Brasil a Volkswagen só fabricava motores AP e o clássico boxer de refrigeração a ar antes da inauguração da fábrica de motores em São Carlos quando lançou os motores EA-111 no Brasil, exatamente na versão 1.0 que substituiu o CHT que já vinha sendo usado no Gol 1000 desde o modelo quadrado, também podia parecer imprescindível para quem esquece que ao menos até '98 a configuração de motor longitudinal marcava presença em todos os carros feitos pela Volkswagen no Brasil desconsiderando os rebadges da Ford durante a AutoLatina. Portanto, parece até mais fácil justificar um hipotético uso do motor boxer 1.6 refrigerado a ar que poderia ter facilitado o enquadramento até de outros modelos derivados do Gol como populares para reter e satisfazer a um público mais abrangente, para o qual o motor CHT 1.0 seria efetivamente insuficiente enquanto o boxer 1.6 já era capaz de proporcionar um desempenho mais razoável tanto na cidade quanto na estrada, algo a ser levado em consideração especialmente dada a proposta do carro popular que acabaria necessitando atender a todas ou ao menos à grande maioria das condições de uso. Talvez o fato da Volkswagen ainda ter usado versões 1.6 do CHT em versões básicas do Gol e derivados a princípio até mais por questões contratuais inerentes à AutoLatina e ao fornecimento do motor AP para a Ford ao invés de estritamente técnicas tenha pesado até mais a favor do uso do CHT e dando origem ao Gol 1000, ironicamente numa mesma época que havia pleiteado a equiparação do motor 1.6 refrigerado a ar aos 1.0 com refrigeração líquida como condição para poder relançar o Fusca para agradar ao então presidente Itamar Franco mas beneficiou até a Kombi com o IPI reduzido dentro do contexto do carro popular.
Mesmo que pudesse ter radicalizado e basicamente partido um motor AP 2.0 ao meio para dar origem a um hipotético motor 1.0 de só 2 cilindros, e que francamente me pareceria uma idéia até razoável tanto em função de uma facilidade para compartilhar ferramental de produção com um motor já fabricado no Brasil, a exemplo do que a General Motors fez nos motores Chevrolet 153 e posteriormente 151 com 4 cilindros que eram baseados no motor de 6 cilindros, quanto por um motor mais curto deixar o peso um pouco mais recuado e forçando menos a estrutura do Gol. Nesse caso, convém lembrar como além de se associar a cilindrada de um motor à percepção de prestígio do veículo que o usasse, seria previsível que uma menor quantidade de cilindros também acabasse sendo rotulada como "pobreza" e "inferioridade" a exemplo do que ainda se ouve falar do projeto de carros populares da Gurgel que foi um antecedente à entrada dos fabricantes generalistas nessa disputa que viria a se revelar bastante acirrada. Enfim, se por um lado pode-se dizer que o principal benefício para a Volkswagen com uma equiparação do motor 1.6 refrigerado a ar foi enquadrar a Kombi como carro popular, e "desperdiçar" o motor no Gol ao invés de direcionar à Kombi e de maneira meramente protocolar ao Fusca, por outro pode-se chegar à conclusão que na prática só a Ford realmente necessitava de uma versão 1.0 para o motor CHT.
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