1 - conjuntos mecânicos provenientes de fornecedores terceirizados: destacando um uso de motores Cummins, como o polêmico ISF2.8 usado na F-4000 desde o relançamento em 2014 até 2019 quando o modelo saiu de linha definitivamente, até o argumento em torno de uma suposta dificuldade em adequar a normas de emissões mais rígidas cai por terra, tendo em vista que a própria Cummins já fornecia todo o sistema de pós-tratamento de gases de escape plenamente integrado aos motores. Os câmbios e eixos motrizes também eram fornecidos por terceiros, facilitando ainda mais a operação, e os modelos tinham basicamente uma necessidade de investimento direto menor por parte da Ford comparados aos similares de fabricação americana, ou mesmo turca em que pese a Otosan que administra a operação Ford Trucks na Europa e partes da África e Ásia ter uma certa autonomia perante a Ford no tocante à engenharia. A receptividade do público brasileiro ao outsourcing de motores Diesel, ao que tudo indica em proporção até maior que nos Estados Unidos para o mesmo segmento, também favorecia esse aspecto na operação de caminhões da Ford no Brasil;
2 - força da marca: é inegável que a Ford já foi muito mais apreciada no Brasil de um modo geral, em que pese ter cometido alguns erros principalmente no tocante às linhas de motores para veículos leves e mantido uma defasagem prolongada da Série F perante os congêneres americanos e até argentinos antes dessa linha ter a produção para o Mercosul concentrada no Brasil. E mesmo com a Ford deixando muito a desejar em alguns aspectos como a escassez de opções para o mercado local enquanto eram oferecidas para exportação à Austrália e também à África do Sul, a exemplo da tração 4X4 que a Série F perdeu ao final de '98 para retomar apenas ao final de 2005, ainda era especialmente forte no interior em boa parte por causa da F-4000;
3 - similaridade com o processo de fabricação dos calhambeques: a princípio um caminhão guarda uma certa semelhança com os calhambeques ao manter o uso de um chassi separado da carroceria e a tração traseira por eixo rígido, e o eixo dianteiro tanto nas versões de tração simples quanto nas 4X4 ser predominantemente rígido, e em ambos os casos a suspensão por feixes de molas, bem como o motor na posição dianteira longitudinal. E mesmo que as longarinas dos últimos modelos da Série F nacional já tivessem seção quadrada (boxed) na área do motor, o restante era de seção aberta (C-Channel como se diz nos Estados Unidos), característica que seguia facilitando a implementação a ponto de ainda ser mantida a seção aberta em modelos americanos mais recentes no espaço destinado ao encarroçamento enquanto a seção quadrada passou a abranger também o habitáculo nas versões de chassi e cabine, em que pese as pick-ups já terem as longarinas de seção quadrada por toda a extensão (fully-boxed frame). E a bem da verdade, considerando também os chassis com as longarinas de seção totalmente aberta e perfil reto que ainda eram usados em outros modelos antes da Ford encerrar a fabricação de caminhões no Brasil, a flexibilidade para fazer diferentes variações a um custo relativamente reduzido facilitava o comodismo ao menos enquanto tal configuração permita manter a adequação tanto a normas de emissão de poluentes quanto de segurança. Às vezes, considerando uma histórica indiferença da Ford perante os clientes brasileiros, até me surpreende nunca ter feito nenhuma gambiarra para usar o mesmo chassi das versões menores do Cargo na F-4000 ao invés de ter trazido um chassi idêntico ao americano de '98 na chegada da última geração do modelo;
4 - falta de atenção a alguns segmentos especiais: em que pese a disponibilidade de tração 4X4 para a F-4000 ter proporcionado uma vantagem competitiva à Ford por algum tempo, a empresa foi demasiado acomodada em outros aspectos. Ter parado de comercializar chassis para ônibus em 1999, considerando a prevalência de chassis de motor dianteiro no Brasil que acabam sendo basicamente uma adaptação de chassis de caminhão com alterações na posição de alguns subconjuntos facilitada pelo perfil reto e pela seção aberta das longarinas, foi uma daquelas decisões especialmente estúpidas, à medida que mesmo as cidades que impuseram algumas restrições ao uso de ônibus com motor dianteiro acabaram por ceder ao menos em parte e derrubado ou flexibilizado tais normas. E até a Série F, que ainda tinha apelo tanto junto a operadores estritamente profissionais quanto entre usuários com um perfil mais recreativo, ficou subaproveitada devido à retomada da produção em 2014 somente com a cabine simples, e por nunca ter contado nas versões de fabricação brasileira algumas opções que passaram a ter maior demanda como o câmbio automático;
5 - timing infeliz: tendo em vista o aumento no e-commerce e nos volumes de carga movimentada pelo segmento de logística em reação à crise do coronavírus e aos infames lockdowns cujos efeitos ainda são percebidos em lojas físicas, encerrar em definitivo a produção de caminhões impediu que a Ford tivesse boas oportunidades de negócios que certamente levariam a um incremento na lucratividade da operação de caminhões no Brasil, além do mais considerando que a retomada desse mesmo mercado na Europa Ocidental ainda era algo recente e havia gerado expectativa junto a uma parte do público da marca até no Brasil. A recente concentração de esforços da Ford no mercado de veículos utilitários de modo geral, como caminhonetes e SUVs, também tem um aspecto contraditório com o encerramento da fabricação de caminhões no Brasil.
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