Categoria que tinha uma demanda forte no Brasil desde o início da fabricação nacional de automóveis ainda na década de '50 e que mantinha alguma relevância até a década de '90 diante da chegada de uma concorrência ampla com a reabertura das importações de veículos, as pick-ups full-size também eram frequentemente modificadas para atender a necessidades e preferências específicas para as quais uma falta de variedade nos modelos normais também afetava outros segmentos. Uma antiga prevalência das conversões para cabine dupla feitas em escala mais próxima da artesanal mesmo no caso de modelos que chegaram a oferecer tal opção de fábrica em algum momento durante o ciclo de produção como a Chevrolet D20 exemplifica bem essa peculiaridade do mercado brasileiro, apesar de outras motivações além do uso a trabalho fomentassem a transformação de utilitários, desde uma escassez de veículos de alto luxo e grande porte até escapar às restrições ao uso de motores Diesel em automóveis. Por mais que a rusticidade inerente a veículos de carga parecesse incoerente em tentativas de usar uma caminhonete "cabinada" no lugar de um sedã grande de luxo, o amplo espaço facilitava instalar toda sorte de acessórios, e um bom conjunto de bancos proporcionava conforto em diversas condições de terreno mesmo que as suspensões permanecessem totalmente originais para levar carga.
Uma industrialização e urbanização intensas que o Brasil experimentou durante o regime militar poderiam levar a crer caminhonetes fossem menos propensas a serem alçadas à condição de um veículo de luxo, como talvez fizesse mais sentido em um país totalmente devotado à agropecuária, mas o Brasil nunca foi exatamente o país mais fácil de entender, e o mercado automobilístico também refletia uma forma absolutamente improvisada que caracterizou a industrialização brasileira no âmbito da substituição de importações desde as duas grandes guerras mundiais. Portanto, a impressão que uma pick-up full-size seria a opção mais coerente para suprir a demanda reprimida pelos automóveis importados de luxo acabou favorecendo as transformações principalmente enquanto durou a proibição às importações de '76 a '90, ainda que tenha mantido uma certa relevância especialmente em estados como o Paraná e o Rio Grande do Sul ou em partes do Centro-Oeste e do Norte onde colonos sulistas formaram algumas das mais importantes potências agropecuárias do Brasil. E apesar do mercado brasileiro ter passado por muitas transformações ao longo do tempo, como as pick-ups mid-size vindas inicialmente importadas principalmente do Japão durante a reabertura das importações e os SUVs consolidando a preferência entre o público mais generalista, tendo causado uma retração no segmento das pick-ups full-size tanto pela percepção de mais praticidade em utilitários menores quanto pelo fogo amigo à medida que opções como a cabine dupla de fábrica e a tração 4X4 eram priorizadas nas mid-size pelos grandes fabricantes, é difícil negar que as adaptações de cabine dupla já abriram o caminho para essa moda de SUV.
E além das transformações mais voltadas ao público que ainda desejava o compartimento de carga separado do habitáculo, também foi relativamente comum o encarroçamento de perfil mais semelhante ao de um SUV, e uma demanda surgiu pela ausência de vans dos fabricantes generalistas para enfrentar uma espécie de monopólio que a Volkswagen teve com a Kombi, em parte até pelo comodismo da concorrência mesmo que fosse possível a General Motors por exemplo usar os mesmos conjuntos motrizes da D20 para nacionalizar a fabricação de vans full-size. Apesar de ter ocorrido uma experiência desastrosa com a tentativa de oferecer tração 4X4 de fábrica nas pick-ups Chevrolet full-size por causa da suspensão dianteira independente, mesmo com a Engesa já tendo oferecido um sistema com eixo dianteiro rígido antes, realmente era desencorajador tentar vender no Brasil uma van de motor dianteiro e tração traseira porque a capacidade de incursão off-road já ficaria inferior à Kombi cujo motor traseiro favorecia uma distribuição de peso entre os eixos sempre mais próxima ao eixo motriz. A bem da verdade, nada impedia um uso mais frequente de transformações semelhantes a uma van para aplicações mais especializadas a trabalho, como por exemplo ambulâncias ou no transporte alternativo de passageiros em algumas localidades do Nordeste onde as linhas de ônibus intermunicipais deixam a desejar ou até inexistem.
Por mais que possa ser traçado um paralelo entre a antes pujante indústria das cabines duplas e a fabricação de carrocerias para ônibus que o Brasil ainda tem um destaque a nível internacional, e as regulamentações de segurança veicular mais recentes tornem um tanto inviável homologar modificações para as quais uma antiga demanda basicamente desapareceu, também é justificável lembrar que o México e a Argentina já tiveram uma situação parecida no tocante a uma falta de variedade no mercado de veículos utilitários quando as importações foram restritas em diferentes momentos e contextos históricos. A concorrência mais acirrada da Volkswagen no Brasil e no México com a Kombi, que pelo custo operacional reduzido era conveniente no uso comercial, certamente retardou mais incursões no segmento de vans, enquanto na Argentina o encarroçamento de pick-ups e até do Jeep também já foi muito mais forte no contexto de substituição de importações, levam a crer que circunstâncias complexas às vezes exigem uma flexibilidade que só as pick-ups eram capazes de proporcionar na busca por uma solução. Mas enfim, talvez o antigo sucesso comercial das transformações de pick-ups full-size para cabine dupla seja uma mistura entre causas e consequências que apenas refletiu condições da época no Brasil.
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