terça-feira, 22 de abril de 2014

Momento nostalgia: Fiat Palio Autonomy na edição de setembro de '96 da revista Quatro Rodas

Houve uma época que a revista Quatro Rodas tinha um padrão editorial muito mais primoroso, apesar de toda a tecnologia atual facilitar em alguns aspectos a elaboração de gráficos e edição de imagens. Também merecia destaque o primor com que mesmo alguns artigos que viessem a atingir um público mais segmentado eram editados, com bom detalhamento tanto de imagens quanto aspectos técnicos. Uma matéria até bastante curta mas que eu considero marcante, publicada na edição de setembro de '96 com autoria de Celso Unzelte e fotografias de Germano Lüders, foi um teste de versões do Fiat Palio adaptadas à condução por motoristas paraplégicos logo na época da introdução do programa Autonomy no mercado brasileiro. Àquela época eu tinha uns 6 anos e já me entusiasmava por automóveis, até tinha o modesto sonho de abrir uma oficina "boca-de-porco", mas nunca tinha parado para refletir sobre adaptações para condutores com algum tipo de deficiência física. Pode-se dizer que aquela edição da Quatro Rodas, de um certo modo, mudou a minha vida, me fazendo passar a ter um maior interesse pela parte de projeto e desenvolvimento de soluções integradas do que por gambiarras de fundo-de-quintal. Eu até tinha um exemplar impresso dessa edição da Quatro Rodas, mas foi destruído num incêndio criminoso que atingiu o meu acervo de publicações automobilísticas e motociclísticas em 22 de abril de 2002.
Chamava a atenção o fato das adaptações serem montadas na própria fábrica, agilizando e proporcionando economia ao eliminar a complexidade logística de encaminhar o veículo a uma oficina credenciada para efetuar o serviço, embora infelizmente as adaptações atualmente não sejam mais instaladas diretamente na fábrica. O piloto de testes escolhido para a reportagem foi o então presidente de uma entidade representativa de deficientes físicos de Minas Gerais, o economista Leonardo Mattos, que posteriormente chegou a ser eleito pelo Partido Verde para os cargos de vereador em Belo Horizonte e de deputado federal. Com uma experiência à época já de 15 anos conduzindo veículos adaptados, não foi tão difícil para que pudesse constatar algumas diferenças entre os sistemas fornecidos pela Guidosimplex italiana, Kempf franco-americana (citada incorretamente como alemã provavelmente pelo fato do fundador Jean-Pierre Kempf ser alsaciano) e Okey Technologie francesa, e o que predominava no mercado nacional onde o improviso e o amadorismo eram constantes. Até certo ponto, pode-se observar também algum temor de um público que pela falta de opções acabou adotando um posicionamento mais conservador no tocante às modificações, como a rejeição à porta esquerda corrediça para facilitar a acomodação da cadeira de rodas atrás do banco do motorista e até uma preferência pelo uso de uma alavanca única para acionamento manual de acelerador e freio, podendo integrar também um acionamento manual para a embreagem. Uma observação interessante foi quanto à questão da quantidade de portas: ao contrário do que muito se supunha à época, um carro de duas portas era mais prático, em função dos bancos dianteiros rebatíveis para o acesso ao banco traseiro também facilitarem a acomodação da cadeira de rodas, enquanto as portas traseiras ao serem abertas acabavam formando uma espécie de barreira. Baseado nessa explicação, não é difícil compreender os motivos que levaram um cadeirante que trabalha no meu bairro a adaptar num Honda Civic de 4 portas os assentos dianteiros da versão cupê de duas portas...
As adaptações no posto de condução eram, naturalmente, o maior destaque, com a embreagem automática e o freio por alavanca manual presentes em todos os sistemas enquanto as principais diferenças estavam no acionamento do acelerador. Da Guidosimplex era usado um aro que efetuava a aceleração ao ser puxado, montado atrás do volante mas se mostrando um tanto inconveniente por não acompanhar os movimentos do volante, mas por outro lado tinha na segurança uma vantagem ao não expor o condutor a algum elemento que pudesse agravar lesões em caso de acidente. Da Kempf era usado outro aro, que devia ser empurrado para acelerar, montado sobre o volante e acompanhando os movimentos do mesmo, mas impossibilitando o uso do airbag. Embora os acionamentos independentes de acelerador e freio tivessem as vantagens de possibilitar que o condutor mantivesse ambas as mãos no volante durante a maior parte do tempo e até o acionamento simultâneo de acelerador e freio (o popular "punta-tacco"), o convidado externou a preferência por um comando manual que incorporasse acelerador e freio na mesma alavanca, como ainda tem sido mais comum no Brasil. Da Okey Technologie vinha um sistema que usava alavancas interligadas e montadas atrás do volante, uma à direita e outra à esquerda, e ao qualquer uma ser puxada (ou ambas ao mesmo tempo) era feita a aceleração, e além de não interferirem no acionamento do airbag tinham a aparência mais integrada ao acabamento original do veículo.

O mercado de adaptações veiculares para deficientes físicos mudou muito de '96 para cá, e até certo ponto o público brasileiro segue um tanto conservador nesse aspecto, principalmente pela dificuldade em encontrar assistência técnica adequada a equipamentos mais sofisticados cujo custo elevado também acabe dificultando uma maior inserção, e a maior popularidade do câmbio automático ou automatizado ter reduzido o interesse nas complexas adaptações de embreagem automática. Convém salientar que atualmente tanto a Guidosimplex quanto a Kempf oferecem aros de aceleração que podem ser montados tanto acima quanto abaixo do volante sem interferir no acionamento do airbag, mas requerem o uso de uma interface eletrônica mais sofisticada. Nesse meio-tempo, Kempf e Okey Technologie não estão mais presentes no mercado brasileiro, e embora falte divulgação os condutores que preferirem o acelerador por alavancas podem encontrar na empresa paulista Adapt Auto um sistema produzido na Itália pela Kivi Allestimenti que tem o mesmo funcionamento do que era fabricado pela extinta Okey Technologie.

sexta-feira, 18 de abril de 2014

Microônibus Invel com chassi Chevrolet

Durante a década de '80, a Marcopolo teve uma divisão dedicada ao desenvolvimento de microônibus, a Invel. Apesar do modelo mais conhecido ser um que era baseado no layout mecânico da Kombi, houveram também versões encarroçadas sobre o chassi da Chevrolet D20 modificado para rodado traseiro duplo.
Até o fim da década de '90 ainda se via alguns sendo usados regularmente no transporte escolar ou como lotação em Porto Alegre. Pela cor e disposição de portas (uma convencional do lado esquerdo e outra de folha dupla na direita), leva-se a crer que o exemplar das fotos tenha sido usado originalmente para transporte escolar.

quarta-feira, 16 de abril de 2014

3 cilindros: quando menos pode ser mais

Não é de hoje que o consumidor brasileiro vê com algumas ressalvas um tanto injustificáveis a presença de motores com apenas 3 cilindros em alguns veículos, embora no segmento dos "populares" a resistência a esse layout esteja sendo vencida em modelos como o Hyundai HB20 e o Volkswagen Fox BlueMotion.
O próprio Fox, em versões anteriormente exportadas à Europa, contava com motores de 1.2L a gasolina e 1.4L turbodiesel de 3 cilindros. Apesar da menor quantidade de pulsos de torque, estes tem duração e intensidade maiores, favorecendo o desempenho em comparação a motores de 4 cilindros nas mesmas faixas de cilindrada. A menor quantidade de peças móveis gera menos atritos internos, e como cada cilindro passa a ter uma proporção maior sobre o deslocamento total do motor, há menos das chamadas "perdas por bombeamento", e assim ganha-se em eficiência geral.

Um caso emblemático foi quando o Opel Corsa B passou a ser produzido no Brasil em '94: o motor de 1.0L disponibilizado localmente tinha 4 cilindros, ao contrário do similar europeu que nessa mesma faixa de cilindrada já adotava o layout de 3 cilindros. A princípio, a decisão pelo motor de 4 cilindros deveu-se inicialmente a um menor investimento necessário em ferramental para a produção, podendo compartilhar mais elementos com o de 1.4L, mas naturalmente pode-se levar em consideração algum temor por uma rejeição de um mercado que, em função de um profundo isolamento técnico, manteve-se muito conservador. Para efeito comparativo, considerando motores de 1.0L com injeção eletrônica monoponto, duas válvulas por cilindro e comando simples no cabeçote, vale tomar por referência o Suzuki Swift: enquanto o Corsa rendia potência de 50cv a 5800 RPM e torque de 7,8 kgf.m a 3200 RPM, o Swift desenvolvia 55 cv a 5700 RPM e 8 kgf.m a 3300 RPM. Mesmo com o uso de carburador em algumas versões, o Swift não fazia feio com 48 cv a 5100 RPM e 7,8 kgf.m a 3200 RPM.

Durante a década de '80 chegaram até a haver aplicações de motores de 3 cilindros em caminhões leves, como o Agrale 1600D. Contava com o motor MWM D229-3 de 2.9L numa versão de 67 cv. Quando motores Diesel de 4 cilindros e alta rotação ainda não eram uma realidade consolidada no restrito mercado brasileiro, também encontrou alguma popularidade no repotenciamento de pick-ups full-size como as Chevrolet C10 e Ford F100/F1000 em substituição a sedentos motores de 6 ou 8 cilindros a gasolina.

Atualmente, embora não seja um ponto tão amplamente discutido como foi a transição dos motores de 6 cilindros para 4 cilindros em caminhões médios como os Ford Cargo 1317e e Volkswagen 17-190, não seria de se estranhar que num futuro não muito distante surgisse um interesse pela configuração de 3 cilindros, impulsionado sobretudo por uma perspectiva de redução nos custos associados a alguns componentes que vem ficando cada vez mais sofisticados para atender às novas normas de emissões de poluentes, como os bicos injetores. Um único bico usado num motor com injeção eletrônica common-rail chega a ser mais caro que todos os bicos de um motor com injeção 100% mecânica. Pois bem, tomando por referência os motores Cummins ISB4.5 de 4 cilindros com 4.5L de cilindrada, 189 cv a 2300 RPM e 600 Nm entre 1100 e 2100 RPM usado em algumas versões do Cargo até 17 toneladas, o MAN D08 de 4 cilindros com 4.8L, 186 cv a 2500 RPM e 700 Nm entre 1100 e 1600 RPM, e o Cummins ISL de 6 cilindros com 9.0L gerando 400 cv a 2100 RPM e 1700 Nm entre 1100 e 1500 RPM, não seria algo tão inconcebível um motor de e cilindros com 4.5L na faixa de 190 cv com um torque de 800 Nm para uso em caminhões médios...

Ainda com referência a utilitários, um caso interessante a se analisar é o da atual geração da Chevrolet S10: o motor básico oferecido no modelo tem 4 cilindros, 2405cc, e 141 cv a 5200 RPM e torque de 219 Nm (22,3 kgf.m) a 2800 RPM rodando com gasolina, valores que vão a 147 cv e 236 Nm (24,1 kgf.m) nas mesmas faixas de rotação ao usar etanol. Embora pareça absurdo comparar um motor de caminhonete a um motor de motocicleta, considero conveniente mencionar o motor de 3 cilindros e 2294cc da Triumph Rocket III Roadster, que gera 148cv a 5750 RPM e 219 Nm a 2750 RPM ao usar gasolina, levando portanto uma ligeira vantagem na faixa de rotação do pico de torque, que seria até bem apreciável num utilitário. O tamanho mais compacto do motor e o menor peso também seriam benéficos ao aproximar mais a concentração de peso ao centro do veículo.
Para quem considere injusto comparar um motor de 4 válvulas por cilindro e comando duplo no cabeçote contra o de duas válvulas por cilindro e comando simples usado na S10, vale destacar que o motor da Triumph Rocket III Roadster também leva vantagem no torque em comparação com o Duratec de 2.3L usado em algumas versões antigas da Ford Ranger, que entrega 145 cv a 5250 RPM e 209 Nm a 4250 RPM.

No Japão os motores de 3 cilindros fazem ainda bastante sucesso entre os kei-cars, como o Subaru Vivio e o Daihatsu Mira/Cuore que chegaram a ser importados oficialmente durante a década de '90. No caso do Vivio, com 660cc, dentro dos mesmos padrões impostos pelo governo japonês para se encaixar numa faixa de tributação menos pesada, enquanto o Cuore recorria a um motor de 800cc oferecido apenas em mercados de exportação.
Num país com escassos recursos naturais, a menor energia a ser gasta na produção de componentes e montagem final dos motores, além da menor quantidade de matérias-primas requeridas, faz com que esse layout se consolidasse nessas faixas de cilindrada, além do tamanho mais compacto facilitar a otimização do espaço em carros tão pequenos. Até utilitários como o Suzuki Jimny recorrem a essa configuração de motor por lá...

Por mais que um motor de 3 cilindros inicialmente possa soar como uma "economia porca", as vantagens são evidentes em distintos cenários operacionais...

segunda-feira, 14 de abril de 2014

Motores 2-tempos: relação custo/benefício ainda os favoreceria

Os motores 2-tempos, notórios pela simplicidade construtiva e relação peso/potência superior, não chegam a ser um ilustre desconhecido do mercado automobilístico, tendo feito fama nos antigos DKW, que no Brasil tiveram a produção licenciada à Vemag. Muito antes que se pensasse em injeção eletrônica, ignição transistorizada, comandos de válvulas variáveis e outros recursos que diminuíram a desvantagem dos 4-tempos do ciclo Otto em desempenho, o velho "decavê" com seus 981cc desenvolvia em 1964 seus modestos 50cv a apenas 4500 RPM, e o torque de 8,5kgf.m a 2250 RPM, valores respeitáveis diante da limitada tecnologia de 50 anos atrás, obtidos com carburador de corpo simples e ignição por platinado. Modelos com motor 4-tempos em faixas de cilindrada semelhante, como o Suzuki Swift, só foram alcançar faixas de desempenho semelhante a partir da década de 90, e mesmo assim dependendo tanto da injeção eletrônica quanto do deslocamento dos picos de potência e torque para faixas de rotação mais elevadas, evidenciando uma vantagem conceitual do ciclo 2-tempos.

Embora atualmente seja um grande tabu qualquer especulação sobre um eventual retorno dos motores 2-tempos aos automóveis, convém recordar uma experiência desenvolvida entre as décadas de '80 e '90 pela empresa australiana Orbital Engines, que chegaram a despertar até o interesse da Ford: alguns exemplares do Fiesta de 3a geração chegaram a ser equipados com motores 2-tempos de injeção direta assistida por um jato de ar, apresentando desempenho e economia de combustível mais favoráveis do que com o velho motor Kent/Valencia com comando de válvulas no bloco que o Fiesta espanhol usava, e mesmo com sucesso em testes de campo a tecnologia acabou engavetada.

Outro caso emblemático foi o do Chrysler Neon, desenvolvido desde fins da década de '80 prevendo inicialmente o uso de um motor 1.5L 2-tempos de 3 cilindros que tinha o cabeçote já integrado ao bloco, dispensando juntas de cabeçote e proporcionando uma refrigeração mais uniforme. No entanto, foi lançado com motores 4-tempos.

Oficialmente, a razão para descartar qualquer retomada do uso de motores 2-tempos em aplicações automotivas era relacionada às emissões de poluentes, com destaque para os óxidos de nitrogênio, embora o sistema de injeção desenvolvido pela Orbital Engines seja hoje largamente utilizado em aplicações náuticas, certificadas mesmo nas mais rigorosas normas de emissões que são as instituídas pela California...
Havia quem apontasse como "incômodo" a necessidade de reabastecer o tanque de óleo lubrificante com mais freqüência do que normalmente se trocaria o óleo num motor 4-tempos, mas aí já se pode rebater com argumentos práticos. Além do procedimento em uma simples adição de óleo ser mais rápida, é mais fácil manter um controle sobre o volume disponível no veículo do que manter um controle mais rigoroso sobre os intervalos de troca baseados numa quilometragem pré-definida. A meu ver, no entanto, se o consumidor brasileiro conviveu com gambiarras como o tanquinho auxiliar de gasolina para partida a frio nos carros a etanol, e posteriormente nos "flex", não seria tão difícil se acostumar a completar o nível em um tanque separado para o óleo. Outro aspecto particularmente crítico, convenientemente negligenciado pelos que se opõem ao 2-tempos, é que o consumo do óleo junto ao combustível reduz os riscos de contaminação ambiental inerentes ao descarte inadequado de lubrificantes usados. Embora esse problema pareça irrelevante para um europeu acostumado a protocolos rígidos de descarte de resíduos, é um tópico que ainda merece atenção quando se trata dos "macaquitos" brasileiros...

Em algumas aplicações mais específicas, como motocicletas off-road, é comum que os motores 2-tempos funcionem mais regularmente mesmo quando submetidos a inclinações mais intensas, que num 4-tempos acabariam por fazer com que algumas partes do motor ficassem mais "encharcadas" enquanto outras ficariam "secas". Embora ultimamente a Yamaha, antigamente bem sucedida com modelos como a DT 180, venham abandonando o 2-tempos, a KTM ainda investe pesado neles...

Outros pontos que merecem atenção são a adaptabilidade a combustíveis alternativos e o uso de lubrificantes de origem renovável: fórmulas à base de álcool (tanto etanol quanto metanol) com óleo de mamona já são conhecidas e largamente usadas em competições de kart. Convém salientar que em motores 4-tempos ainda há preocupações quanto à formação de depósitos de glicerina polimerizada pelos dutos de lubrificação ao se usar óleos vegetais, além de sofrer variações mais intensas na viscosidade que acabam por interferir na eficiência da redução dos atritos internos.

Particularmente no caso do Brasil, onde a tributação em função de faixas de cilindrada faz com que motores 1.0L sejam usados em sedãs como o Hyundai HB20S e até em utilitários como o antigo Fiat Fiorino 1000 Electronic, faria algum sentido reabilitar os motores 2-tempos em aplicações automotivas, tanto em função do menor custo devido à menor quantidade de materiais e processos de usinagem necessários à fabricação quanto pelo maior desempenho associado a uma redução de peso.

Com a atual prioridade em se desenvolver soluções práticas direcionadas a uma maior eficiência energética, evidenciada em modelos como o Volkswagen Fox BlueMotion que, embora seja equipado com um motor 4-tempos, poderia servir para demonstrar vantagens inerentes ao ciclo 2-tempos. A maior simplicidade, dispensando válvulas e respectivos comandos e outros componentes móveis, já diminui não apenas peso e volume do motor como também atritos e inércias internos, favorecendo a conversão da energia liberada pelo processo de combustão em força motriz por reduzir a quantidade de energia térmica a ser dissipada. Convém destacar que, devido ao fato da DKW ter sido incorporada ao Grupo Volkswagen em '67 e das medidas de diâmetro e curso dos pistões ser muito parecida entre o atual motor 4-tempos 1.0MPI de 3 cilindros, comando de válvulas duplo no cabeçote e 12 válvulas com injeção eletrônica multiponto usado pelo Fox (74,5 x 76,4) e o motor 2-tempos DKW com 3 cilindros, carburador e zero válvulas (74 x 76), chegaram a correr boatos de que o atual seria derivado do antigo, o que não é verdade.

Outro cenário operacional em que os motores 2-tempos poderiam ser bem aproveitados é nos veículos híbridos, como o Toyota Prius. Devido ao desligamento e arranque automáticos do motor de combustão interna, a maior sensibilidade de um 4-tempos a variações na pressão do óleo lubrificante às vezes também pode se mostrar problemática, ou requerer recursos como uma válvula na base do filtro de óleo para diminuir a velocidade de retorno do óleo ao cárter e manter o cabeçote mais lubrificado. O mesmo também se aplicaria a um veículo convencional que fosse mais submetido a trajetos curtos, o popular "ciclo da dona de casa", em que os repetidos atritos no cabeçote insuficientemente lubrificado durante a partida acentuam o desgaste em mecanismos de acionamento de válvulas. Logo, por mais que o layout de motor 2-tempos venha sendo desprezado, as vantagens que oferece associadas a um custo reduzido mostram que ainda tem um bom potencial para atender a necessidades de um mercado automobilístico desenvolvido...

sábado, 12 de abril de 2014

Momento nostalgia: Opel Vectra A brasileiro

Lançado em '88 na Europa, chegando ao mercado brasileiro apenas em '93, o Opel Vectra A teve um ciclo bastante curto do lado de cá do Atlântico, visto que usava muitos componentes de carroceria e acabamentos importados do similar alemão, que saiu de linha em '96 para a introdução da 2a geração (Vectra B) que por lá durou até 2002 e aqui ganhou sobrevida até 2005. Para atender à estratégia da General Motors do Brasil, que não contava com a marca Opel, teve ainda de ser rebatizado como Chevrolet Vectra. Projetado para substituir o Opel Ascona C, do qual o Chevrolet Monza brasileiro era derivado, devido ao custo acabou que o Monza reestilizado em '91 acompanhou o Vectra de 1a geração por todo o ciclo do modelo no mercado local, até que ambos fossem substituídos pela 2a geração do Vectra.
Nas versões GLS e CD, usava o mesmo motor 20NE OHC de 2.0L com 8 válvulas, injeção eletrônica multiponto e 116cv e câmbio manual de 5 marchas do Monza, com opção por um automático de 4 marchas com overdrive, ao contrário do direct-drive de 3 marchas usado no antecessor.
Um caso à parte era o Vectra GSi, que lançava mão do motor C20XE DOHC de 2.0L e 16 válvulas que desenvolvia 150cv e só era disponibilizado com câmbio manual de 5 marchas. Alcançava velocidade máxima de 207km/h e aceleração de 0 a 100km/h em 9,22 segundos. A título de curiosidade, os eixos de comando de válvulas eram ocos por dentro, para reduzir a inércia, e o C20XE foi o único motor usado nas versões brasileiras a ser equipado com catalisador.

terça-feira, 8 de abril de 2014

Câmbio manual de 4 marchas: será mesmo tão inadequado?

Até os anos '90 ainda era relativamente bem-aceito mesmo em alguns dos principais mercados mundiais que se oferecesse o câmbio manual de 4 marchas numa ampla variedade de modelos. Alguns, como o Nissan Sentra de 3a geração produzido entre '91 e '94, embora considerados "de entrada" em mercados como o americano, acabavam sendo um tanto glorificados em um certo país terceiro-mundista que recém tinha sido novamente aberto aos importados, e mantinham a opção por câmbio manual de 4 marchas paralelamente a um de 5 marchas. Se por um lado pode parecer um contra-senso, por outro tinha alguma lógica que sustentava essa estratégia: o consumidor americano médio não era tão apreciador do ato de trocar marchas manualmente, então para aqueles que não se entusiasmavam com as pretensões "esportivas" de um câmbio com mais marchas e um menor espaçamento entre as mesmas (close-ratio), além do diferencial encurtado para que ainda fosse proporcionada uma certa agilidade em arrancadas, mas também não queriam pagar mais caro pela comodidade do câmbio automático, tinham a opção por um câmbio que, apesar da menor quantidade de marchas e o maior espaçamento entre as mesmas (wide-ratio), acabava por ser escalonado de uma forma mais eficiente e ainda podia contar com um diferencial mais longo que possibilitasse manter a mesma velocidade de cruzeiro a um regime de rotações igual ou até ligeiramente inferior ao de um similar com uma marcha adicional e mais longa.
No caso específico do Sentra, havia uma controvérsia: a EPA (Environmental Protection Agency, uma espécie de IBAMA) americana atribui médias de consumo urbano idênticas (25MPG, cerca de 10km/l) tanto para as versões com câmbio manual de 4 marchas quanto para as de 5, enquanto no consumo rodoviário as médias são listadas em 35MPG (cerca de 14km/l) com 5 marchas e 33MPG (aproximados 13,2km/l) com 4 marchas. Convém recordar, no entanto, que as médias obtidas nos ciclos de testes da EPA são muito contestadas pelo método como são feitos, e proprietários de Sentra com o câmbio de 4 marchas normalmente obtém resultados mais satisfatórios em condições reais de uso em comparação com o de 5 marchas. Além da questão do escalonamento de marchas e relações de diferencial, convém levar em consideração a redução de peso (ainda que pareça irrisória diante do veículo completo) e de atritos internos na caixa com uma marcha a menos, o que também acaba por ter um peso significativo nos resultados obtidos.

No cenário brasileiro, vale tomar por referência a linha Volkswagen durante a década de '80: mesmo após o lançamento do câmbio manual de 5 marchas como opcional, o de 4 marchas permanecia disponível e até era a opção para quem preferisse um escalonamento otimizado para a economia de combustível.
Vale salientar que no Voyage e na Parati o câmbio de 4 marchas foi o único a ser oferecido durante o programa de exportação para Estados Unidos e Canadá, tanto pelo tamanho do "túnel" central não acomodar o câmbio automático de 3 marchas oferecido no Santana sem modificações estruturais mais extensas quanto pela menor quantidade de trocas de marcha requeridas, tornando a condução menos desgastante para os americanos.

Outro ponto a se destacar era a maior resiliência ao ser submetido a estilos de condução mais severos, como o que o Passat LSE era dimensionado para enfrentar nas mãos dos desleixados motoristas iraquianos, e nas condições de carga mais intensa, como no Gol Furgão.

Mesmo com uma consolidação dos câmbios de 5 marchas mesmo em versões mais simples de modelos como o Gol e a Parati, que na geração "bolinha" já não contavam com nenhuma opção pelos antigos câmbios de 4 marchas, ainda que por razões diversas ainda pudessem se encaixar satisfatoriamente em alguns cenários operacionais.

Mesmo quando a Kombi passou a ser equipada com motor de refrigeração líquida em 2006, enquanto alguns esperavam uma 5a marcha, permanecia com apenas 4. Um argumento para embasar a decisão da Volkswagen era a questão do espaço já limitado para a instalação do câmbio, além de considerações sobre os esforços aos quais estaria submetido.

Cabe salientar também fatores de ordem logística e operacional: ainda tomando a Volkswagen como exemplo, devemos lembrar que a carcaça dos transeixos de 4 marchas para montagem longitudinal era basicamente a mesma, independentemente de ser aplicada num modelo de motorização dianteira como o Gol ou traseira como a Kombi. Naturalmente, isso acabava por reduzir os custos de desenvolvimento de produto. Além disso, em aspectos gerais a menor quantidade de algumas peças que iriam da engrenagem de uma 5a marcha até o respectivo sincronizador também se refletia em menos gasto com material e energia durante a fabricação do câmbio.
Na geração split-window, também conhecida como "corujinha" ou "jarrinha" e produzida no Brasil até '76, a Kombi era dotada de cubos redutores nos semi-eixos traseiros, portanto era necessário inverter o sentido de rotação interna do câmbio em comparação com as demais aplicações de motor traseiro sem os redutores. Valendo-se dessa reversibilidade não foi difícil adaptar, por exemplo, ao Passat.

Atualmente, tem sido comum em modelos de porte médio como o Nissan Sentra de 7a geração e o Toyota Corolla de 11a geração, a única opção de câmbio manual ter 6 marchas e um escalonamento "esportivo" que destoa tanto de um estilo "executivo" evidenciado no primeiro quanto pelo status de "carro de avô" do segundo. Considerando o status de ambos no mercado americano sendo quase como o dos "populares" brasileiros, um câmbio de 4 marchas mais espaçadas associado a um diferencial mais longo para favorecer a economia de combustível caso fosse oferecido a um custo menor que o atual de 6 marchas agradaria aos poucos consumidores budget-conscious que ainda optam pelo manual por lá, enquanto por aqui apesar da participação cada vez menor do câmbio manual entre os sedãs médios certamente haveria alguma polêmica tanto pela percepção de um número menor de marchas como "inferioridade técnica" quanto pela suposta "esportividade" desejada por alguns tiozões em crise de meia-idade. Logo, apesar do mercado vir demonstrando um posicionamento contrário, me parece que o câmbio de 4 marchas não é tão inadequado...