terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Biocombustíveis e segurança alimentar: é possível driblar esse polêmico impasse

Estamos vivendo uma época em que a renovação da matriz energética vem sendo apontada como uma necessidade urgente para amenizar o impacto da atividade humana sobre o ambiente. A meu ver, o meio mais fácil de atender à demanda por energia limpa para fins automotivos acaba sendo através dos biocombustíveis, bem como para geração de eletricidade em alguns locais ermos e menos favoráveis à instalação de equipamentos como turbinas eólicas ou painéis fotovoltaicos. Há, no entanto, quem prefira ignorar as melhorias proporcionadas por uma maior participação da biomassa na matriz energética. O principal ponto que os interessados em prejudicar o desenvolvimento de ações favoráveis ao uso de biocombustíveis insistem é a questão do impacto na produção de gêneros alimentícios. Entretanto, implementar soluções para conciliar a demanda por combustíveis e alimentos não é tão difícil quanto alguns politiqueiros parasitas tentam fazer com que pareça. É muito fácil criticar o agronegócio pela incompetência de ditadores administradores públicos imediatistas que contribuem menos para o desenvolvimento da nação do que os produtores rurais sugados por uma carga tributária obscena e expostos à violência no campo praticada por guerrilhas visceralmente ligadas a politicagens falsamente comprometidas com o "desenvolvimento social" prometido a cada ilusão eleição. Muito se fala sobre "terras improdutivas" ou "especulação imobiliária", mas não é tomando terras à força para dar espaço a verdadeiras favelas que vão ser solucionados os problemas relacionados à segurança alimentar.

Falar sobre as dificuldades em se praticar a agricultura em algumas localidades do sertão do Nordeste, que sofrem com as secas, já é considerado clichê, ainda que alguns projetos de infra-estrutura que poderiam facilitar a vida dos produtores rurais, como a polêmica transposição do Rio São Francisco (à qual eu sou extremamente favorável), sejam especulados desde a época do Império. Entretanto, não precisa ir tão longe para encontrar locais em que seja possível promover um desenvolvimento econômico e social de forma sustentável com relativa facilidade, até mesmo na periferia dos grandes centros urbanos, sem a necessidade de avançar mata adentro para abrir novas fronteiras agrícolas. A algumas semanas atrás eu fui no município de Alvorada, na região metropolitana de Porto Alegre, que tem várias áreas degradadas pela favelização, e precisei ir a um boteco mercadinho de esquina comprar uns pães para o café da tarde, e comecei a lembrar de alguns comentários feitos pelo meu pai e um tio meu sobre a antiga existência de uma zona rural naquela região entre Alvorada e os bairros Rubem Berta, Parque Santa Fé, Parque dos Maias e outros pontos do extremo norte da capital do Rio Grande do Sul, em que a cultura campeira ainda é bastante valorizada embora a favelização do campo tenha se tornado um problema sério. Hoje, chega a ser até difícil encontrar alguma casa que tenha uma árvore frutífera no quintal. Há quem pense o contrário, mas a meu ver a devastação dos "green belts" ao redor dos grandes centros consumidores é uma ameaça maior à segurança alimentar do que o entusiasmo de algumas pessoas ligadas à produção agroindustrial pelos biocombustíveis.

No caso específico de Porto Alegre, em que as vergonhosas carroças estão em vias de serem finalmente proibidas, não me parece inadequado considerar as oportunidades de geração de emprego e renda com algum programa agroecológico a ser levado a sério. Na região das ilhas há algumas áreas que poderiam perfeitamente ser aproveitadas para a produção de gêneros alimentícios, facilmente absorvida devido ao custo mais competitivo em função da simplificação de processos logísticos por estar incluída diretamente em um grande centro consumidor, além de atender à demanda da própria comunidade. E atualmente é bastante comum alguns dos que se dizem "ecologistas" alegarem que o consumo de alimentos produzidos na própria região, reduzindo o gasto de recursos energéticos com o transporte, é uma medida eficiente para poupar recursos naturais... Levando em conta a escala de produção, não seria difícil promover o uso de métodos orgânicos, biodinâmicos, ou seja lá como inventem de chamar algum sistema semelhante, que acabaria por trazer vantagens na estabilização biológica do solo e melhorias na qualidade do ar, devido à umidade relativa ficar mais equilibrada e diminuir a quantidade de poeira em suspensão, o que inclui o teor de material particulado liberado pelo escapamento de ônibus e caminhões devido à pessima qualidade do que a Petrobras insiste em chamar de óleo diesel, com uma qualidade bastante inferior aos similares americano, europeu, asiático e africano, e infinitamente inferior ao biodiesel e outros combustíveis derivados da biomassa. Também seria válido considerar algumas áreas favelizadas no entorno da Arena do Grêmio, em que se pode às vezes ver até o smog com bastante nitidez ao transitar pela "freeway" e ainda encontra-se uma grande extensão favelizada. Considerando o tamanho dos terrenos, não seria difícil fazer reassentamentos em pequenos prédios de até 4 andares (para não prejudicar o tráfego do Aeroporto Salgado Filho nem da Base Aérea de Canoas) mais espaçados do que são hoje as residências (melhorando a circulação de ar ao redor, evitando o acúmulo de ar viciado e a conseqüente proliferação de mofo e bactérias) usando rampas de inclinação suave ao invés de escadarias para acesso aos pavimentos superiores. Tal medida viria a melhorar a acessibilidade para deficientes físicos sem um comprometimento significativo do custo condominial, acabando com a limitação dos atuais projetos de edifícios populares em só poder ter apartamentos acessíveis no pavimento térreo como acontece em alguns condomínios às margens da Avenida Baltazar de Oliveira Garcia, e liberando os pavimentos térreos para instalação de pontos comerciais.

Obviamente, além da produção de gêneros alimentícios, seria possível aproveitar algumas áreas para a produção de oleaginosas para fins energéticos, visando por exemplo atender à frota de ônibus urbanos e metropolitanos. E ainda há a possibilidade de consorciar a criação de alguns animais como galinhas à pequena agricultura, que além da exploração comercial da carne acabaria contribuindo com o controle biológico de pragas. Por mais que hoje nem o Rio Grande do Sul, cujo desenvolvimento em outros tempos se deveu à produção de charque e onde a atividade agropastoril ainda tem um importante peso na balança comercial, esteja livre da existência de vegetarianos, incluindo alguns com um fervor quase religioso, o consumo de proteína animal ainda é tratado pela maioria da população quase como um ritual sagrado.

A meu ver, é uma oportunidade que não deve ser deixada de lado pela possibilidade de inserir trabalhadores na economia formal, dificultar a proliferação de doenças devido a condições precárias de moradia, e ainda proporcionar uma redução de danos ambientais provenientes de instalações de esgoto clandestinas que se vê nas atuais favelas. Além do uso de biocombustíveis contribuir para uma estabilização do ciclo de carbono de forma mais efetiva que um combustível fóssil, um projeto habitacional conduzido de forma adequada desde o início, já prevendo um plano de saneamento básico, acaba por reduzir o lançamento de dejetos no Lago Guaíba, favorecendo a estabilidade biológica. O lodo que sobra do processo de tratamento, por exemplo, ao invés de ser simplesmente descartado, é uma boa matéria-prima para a produção de fertilizante orgânico, vindo a atender bem ao interesse pelo reestabelecimento de um "green belt" portoalegrense...

Eu não sou tão entusiasmado por combustíveis gasosos devido à impossibilidade de fazê-los operar puros em motores de ignição por compressão (ciclo Diesel) e pelo manejo mais complicado que o de um combustível líquido, mas ao se considerar o gás metano (às vezes citado como "biometano") atualmente liberado à atmosfera em aterros sanitários, "lixões" clandestinos e estações de tratamento de efluentes, não seria inadequado considerar o aproveitamento do mesmo para fins energéticos. Ao invés de importar gás da Bolívia para atender aos táxis de Porto Alegre, por exemplo, não me parece inadequado aproveitar a ampliação da capacidade de tratamento de esgotos proporcionada pelo atual Projeto Integrado Socioambiental (PISA) para ao menos considerar o uso de um subproduto que viria a ser descartado precariamente como se não pudesse ter algum valor agregado.

Aos que hoje "condenam moralmente" o setor sucroalcooleiro pela prioridade que o etanol vem recebendo em detrimento ao açúcar, ou o uso da soja para produção de biodiesel, sugiro que reflitam sobre o atual desperdício de outras fontes de energia, incluindo o biometano, e sobre a falta de assistência técnica para que produtores rurais em áreas degradadas da Caatinga e do Cerrado possam desenvolver o cultivo de variedades mais direcionadas a fins energéticos como a mamona, o pinhão-manso e a macaúba, antes de tentar chupar bala de oitão para ver se tem gosto de açúcar invadir uma fazenda produtora de cana ou uma usina sucroalcooleira apenas para vandalizar gerando prejuízos financeiros aos investidores e atrapalhando a vida dos trabalhadores. Ao menos uma vez na vida arregacem as mangas e efetivamente trabalhem pelo povo a quem vocês dizem defender e representar, saiam do conforto do maconhódromo da sala de aula da faculdade de Filosofia e vão a uma favela incentivar a implantação de uma horta comunitária em algum terreno baldio que esteja relegado a depósito irregular de lixo e criatório de ratos e insetos como o mosquito da dengue. Preferencialmente ajudem em alguma coisa ao invés de ficar só olhando, e plantem umas mudas que não sejam de maconha...

sábado, 3 de dezembro de 2011

Considerações sobre a operação brasileira da Chevrolet e as minivans asiáticas

Já faz algum tempo que a filial brasileira da General Motors vem perdendo a sintonia com a Opel, e passando a se alinhar mais com operações asiáticas do grupo. Desde a reestruturação judicial da matriz americana, por exemplo, as filiais latino-americanas e africanas estão subordinadas à GM China, incluindo a brasileira. Entretanto, a "orientalização" vem sendo mais lenta devido a particularidades do mercado local, que vão desde a preferência por um padrão de acabamento menos rústico passando pela tributação diferenciada para motores até 1.0L.

Atualmente, um dos segmentos em que a estagnação da operação brasileira da Chevrolet está mais evidente é o das minivans. Mesmo a Opel Meriva de 2002, que teve projeto nacional, em 2010 deu lugar a uma geração mais avançada na Europa, que acabaria ficando cara demais para os padrões brasileiros.

Enquanto isso, em outros países da América do Sul a oferta de minivans compactas esteve mais vinculada aos modelos da Suzuki japonesa e da Daewoo coreana. Hoje o destaque é a participação dos modelos produzidos na China pela Wuling, joint-venture entre a GM e a SAIC (Shanghai Automobile), especialmente a N200, um sucesso na Colômbia e no Equador.
Apesar da aparência até mais delicada que a Meriva e da oferta de um único motor S-TEC II 1.2L com valores de potência menos empolgantes que os da minivan nacional nas versões básicas com motor EconoFlex 1.4L (que pode ser, no entanto, facilmente adaptado, assim como algum 1.0L para gozar de uma tributação menor), a N200 é bastante usada como veículo de serviço nos mercados onde é oferecida, muitas vezes ainda rodando com sobrecarga, e oferece uma característica técnica bastante apreciada que é a tração traseira. Tal sistema é ainda hoje defendido com entusiasmo por alguns usuários por ser considerado mais reforçado e adequado a topografias mais irregulares. Vale destacar a possibilidade de se obter um diâmetro de giro mais reduzido devido à ausência de semi-árvores de transmissão ocupando espaço no eixo dianteiro, o que acaba facilitando manobras em espaços mais confinados como vielas estreitas de grandes centros em cidades de colonização tipicamente açoriana como Porto Alegre e Florianópolis ou mesmo vagas de estacionamento em edifícios. Entretanto, eu não duvido que o modelo pudesse acabar sofrendo uma reestilização para ficar mais ao gosto brasileiro e manter a atual "identidade visual" da marca Chevrolet, tomando como referência o Agile.

Substituir a Opel Zafira, no entanto, seria uma missão um pouco mais difícil. Apesar do projeto de 1998 nacionalizado em 2001 ser até mais antigo que o da Meriva, superado pela 2ª geração européia em 2004 (e com uma 3ª geração já em 2011), disputa um segmento superior em que um acabamento mais esmerado é um bom argumento de vendas, e a qualidade ainda supera a modernidade na Zafira. A provável sucessora, provisoriamente identificada como PM7, já foi vista em testes no Piauí pelo meu amigo Júlio Max. Inicialmente ele não acredita que possa vir a compartilhar o layout mecânico com algum modelo da Wuling, embora aparente um porte semelhante à Wuling CN100 MPV que apareceu na edição de dezembro de 2011 da revista Quatro Rodas numa foto em testes na Alemanha. Ainda existe a possibilidade da PM7 substituir de uma só vez tanto a Zafira quanto a Meriva, mas a meu ver seria adequado manter a oferta de modelos dferenciados para segmentos distintos, dando espaço à N200, que eventualmente pudesse ser oferecida numa versão orientada ao transporte de cargas e substituir gambiarras feitas atualmente instalando baús de fibra na Chevrolet Montana...