quinta-feira, 27 de setembro de 2012

Uma reflexão sobre modificações automotivas e a estupidez burocrática brasileira

Em determinadas situações, pode haver o interesse ou a necessidade de se fazer alguma modificação num veículo, pelas mais diversas razões. Com conhecimento técnico e bom senso, é possível obter bons resultados, mas às vezes o resultado final pode ser de gosto duvidoso...

Como o inferno está cheio de boas intenções, entidades governamentais sempre aparecem com alguma resolução esdrúxula, e não foi diferente com o Conselho Nacional de Transito (Contran) que, sob o falso pretexto de promover a segurança veicular, simplesmente proíbe ou cria entraves burocráticos sem nenhum fundamento técnico. Se por um lado podem argumentar que a intenção é evitar alterações feitas nas coxas precárias que realmente ameaçam a segurança, por outro apenas atrapalham a vida do cidadão que deseja ter um veículo mais adequado a uma determinada condição operacional...
Para os adeptos do off-road recreativo, por exemplo, é comum o uso de pneus mais altos, mas tal modificação é "perigosa" de acordo com os burocratas do Contran. De fato, um diâmetro maior dos pneus altera a calibração do velocímetro, ainda que não seja tecnicamente inviável recalibrar para permanecer de acordo com margens de segurança.

Alterar a suspensão é um ponto que acende polêmicas: há quem acredite ainda ser proibido o rebaixamento, quando as restrições em vigor referem-se às suspensões reguláveis, sem diferenciação entre suspensões "de rosca", eletropneumática (a ar), ou eletro-hidráulica (Hydroactive) como é usada em diversos modelos da Citroën.
Não havendo embasamento técnico para justificar a proibição, a altura do facho dos faróis serve de pretexto. Nada impede, no entanto, a adaptação de um sistema de ajuste automático do facho, já exigido para o uso de faróis de xenônio, e que resolve facilmente o entrave com as suspensões auto-ajustáveis.
Não custa nada recordar a evolução notável proporcionada pela suspensão eletropneumática ao conforto nos ônibus, filtrando melhor as irregularidades de diferentes terrenos, e por manter o nivelamento da carroceria sob condições adversas até melhora a estabilidade direcional. Em caminhões, promove uma maior segurança no transporte de cargas sensíveis e/ou perigosas.
Além disso, ao permitir alterações no vão livre de acordo com os obstáculos a serem encontrados no trajeto, viabiliza uma significativa redução no consumo de combustível ao trafegar numa via com boa pavimentação devido a uma diminuição no arrasto aerodinâmico ao manter uma menor distância livre do solo, sem impor um comprometimento definitivo à capacidade de incursão em terrenos hostis.

Outro ponto que trouxe incomodações está relacionado à substituição de chassis, atrapalhando colecionadores de modelos antigos. Por exemplo, substituir o antigo chassi original de uma International KB-1 da década de 40 pelo chassi de uma Ford F-1000 mais recente, mantendo o veículo documentado de acordo com a carroceria ao invés do chassi.

A substituição de chassi uma boa alternativa para manter a segurança veicular quando o original está muito deteriorado ou danificado, além de eventualmente ser uma forma de facilitar a manutenção de um modelo mais raro ou com peças escassas, como foi o caso de alguns carros franceses durante o período em que a importação de automóveis e componentes estava mais restrita devido às leis de reserva de mercado. Pode-se dizer sem medo de errar que, durante a década de 70, a adaptação de chassis de Fusca em carros franceses, como o Simca 8, salvou alguns exemplares de um destino sombrio em algum ferro-velho...

E com as substituições de chassi, vem outro ponto controverso: alterações no sistema de suspensão. Trocar um vetusto eixo rígido com feixe de molas por uma suspensão dos tipo McPherson, Double Wishbone, braços semi-arrastados com mola helicoidal ou até mesmo os arcaicos semi-eixos oscilantes usados na traseira do Fusca e na dianteira de pickups Ford, por mais que possa melhorar o conforto e na maior parte dos casos a estabilidade, vem sendo usado em alguns casos como pretexto para impedir a emissão do Certificado de Segurança Veicular. Diante do cenário em alguns mercados mais desenvolvidos, onde é possível comprar um chassi 0km para uso em modelos clássicos já com os upgrades adequados para enfrentar as atuais condições de tráfego com o máximo de segurança e conforto, parece uma piada de extremo mau-gosto...

Outro aspecto controverso é quanto a freios: no caso da Chevrolet S10 da foto acima, transformada num monster truck, o uso de freios a tambor nas 4 rodas me parece um contra-senso, ao considerar que no modelo original há discos ao menos para as rodas dianteiras. Trata-se de um veículo restrito a exibições, não podendo trafegar por vias públicas, mas o caso serve apenas para fins ilustrativos. Em outras situações, onde há o interesse em substituir precários freios a tambor por freios a disco, o proprietário do veículo pode enfrentar uma verdadeira via-crucis junto ao Detran caso a alteração seja constatada numa inspeção veicular...

Mais um absurdo burocrático está relacionado à substituição de motores: de acordo com as atuais diretrizes, só seria permitido substituir um motor por outro que tivesse uma diferença de potência até a ordem de 10%. Na prática, não é difícil encontrar alguns motores às vezes com mais do que o dobro da potência original, ou em outros casos menos da metade, sendo adaptados em veículos diferentes. Fatores como o torque e relações de marcha são tão importantes quanto a potência considerando a manutenção de um desempenho compatível com a segurança.
Tomando por referência o Gurgel BR-800, cujo motor original tem modestos 32cv, atualmente é mais fácil encontrar motores motociclísticos numa faixa de potência semelhante. No entanto, apresentam faixas de rotação mais elevadas e curvas de torque inadequadas ao uso em um carro popular. O torque, em valores absolutos, também é uma bosta se mostra insuficiente a essa aplicação.
Logo, como em tantas outras situações, é fácil constatar que a estupidez burocrática habitual na República das Bananas é uma ameaça mais grave à segurança veicular e rodoviária do que algumas modificações em automóveis...

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Uma reflexão sobre a tração elétrica e as contradições do marketing

Um dos pontos mais controversos com relação aos carros elétricos, além de questões conjunturais e eventuais limitações técnicas dos veículos, é a percepção de tais veículos como uma ameaça à virilidade/heterossexualidade do proprietário. E em alguns casos o departamento de marketing põe todo o esforço da engenharia a perder, como na peça publicitária acima veiculada pela General Motors para fazer o Chevrolet Volt conquistar a simpatia do público gay. Numa analogia à "saída do armário", a tração elétrica é equiparada ao homossexualismo e, por mais que agrade aos bambis "politicamente-corretos" de plantão, é um tanto arriscada como argumento publicitário...
Ironicamente, o design do Volt chega a sugerir mais virilidade que o do Chevrolet Cruze, modelo de concepção mecânica mais tradicional com o qual compartilha elementos estruturais básicos.

Não custa recordar que, ao contrário do que alega o controverso anúncio, o Volt não chega a ser nem 100% elétrico como o Nissan LEAF e tampouco um "elétrico de autonomia estendida"  (E-REV - Extended-Range Electric Vehicle) como insistem os marqueteiros. Por prover tração mecânica diretamente às rodas dianteiras quando a carga das baterias atinge nível crítico, na prática o Volt é tão híbrido quanto o Fusca do Pikachu Toyota Prius.

Invariavelmente, o Volt vem sendo aclamado como uma das vedetes da "mobilidade sustentável", ainda que a experiência da General Motors com a tração elétrica seja mais antiga. Por exemplo, já em 1912 a empresa produzia elétricos puros, bastante usados como táxi à época (aplicação que recentemente despertou interesse do vereador Valter Nagelstein, de Porto Alegre, que apresentou um projeto de lei visando a introdução de táxis elétricos e híbridos, e uma futura obrigatoriedade dos mesmos).
No entanto, a rápida evolução dos motores de combustão interna começaram a torná-los mais práticos, tendo a introdução da partida elétrica representado o tiro de misericórdia que relegou os elétricos a um longo ostracismo até as crises do petróleo provocadas pelo embargo da OPEP. Logo, por mais que sejam apresentados como uma inovação, carros elétricos não chegam a ser o expoente máximo de modernidade...

Convém considerar, ao escolher o modelo mais adequado, a diferença entre o custo de aquisição e o custo operacional ao longo da vida útil dos veículos: um carro compacto como o Nissan Versa, comparativamente equipado, custa aproximados USD$20.220,00 a menos que um Nissan LEAF, o que com o custo da gasolina a 4 dólares por galão ainda possibilitaria a compra de 5055 galões de gasolina (19107,9 litros), suficientes para rodar 151650 milhas (243853,2 km) em tráfego urbano considerando o consumo estimado em 30 milhas por galão, ou cerca de 12,7 km/l. Na prática, sem considerar o custo da energia elétrica usada para recarregar as baterias do LEAF nem o leasing das mesmas (que não são vendidas diretamente ao consumidor) e alguns insumos usados no Versa (óleo e filtros), seriam necessários cerca de 8 anos rodando uma média de 18656,7 milhas (cerca de 30000 km) anuais para o investimento no modelo elétrico começar a render algum ganho financeiro, por mais que o custo operacional mais baixo seja constantemente alardeado nas propagandas do Nissan LEAF.
Mesmo com a gasolina chegando a um custo de 5 dólares por galão, acabariam sendo necessários aproximadamente 6 anos e meio para amortizar o custo de aquisição mais elevado.

Os híbridos também acabam padecendo do mesmo problema: numa reflexão de acordo com a realidade brasileira, o Toyota Prius levaria mais de 10 anos para compensar o custo mais elevado em comparação com o Toyota Corolla...

Outro aspecto controverso envolve o manejo de baterias e outros componentes do sistema elétrico ao atingirem o fim da vida útil: devido à quantidade de elementos químicos muito reativos, alguns cuidados especiais são requeridos, e o descarte inadequado torna-se mais prejudicial ao meio-ambiente (ou menos "sustentável", como virou moda dizer) do que ocorreria com um motor.
Diga-se de passagem, ainda é mais barato retificar um motor do que substituir uma ou mais baterias tracionárias nos híbridos e elétricos puros mais recentes, além da presença de equipamentos eletrônicos mais complexos e um circuito de alta tensão aumentarem a complexidade dos procedimentos de manutenção rotineira durante a vida útil de um veículo híbrido.
Um ponto que me parece particularmente contraditório é a pouca ênfase dada ao uso de combustíveis alternativos na atual geração de híbridos. Assim, na prática, até um carro bicombustível, ou "flex", acaba por ser mais coerente com uma proposta ecológica, além de reduzir a dependência do petróleo.

Com os elétricos puros, o maior temor está relacionado com a instabilidade no fornecimento de energia elétrica, como na época do racionamento de energia, ou "apagão", que trouxe significativos transtornos à população brasileira. Mesmo atualmente podem ocorrer cortes abruptos no fornecimento de energia, principalmente em função de intempéries, como chuvas e ventanias que possam levar galhos de árvores a encostar nas linhas de transmissão e provocar um curto-circuito.
Logo, por mais que os marqueteiros prometam milagres, a tração elétrica ainda tem uma série de limitações até que possa ser considerada atraente para um consumidor mais generalista...

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Breve observação sobre carros compactos "premium"

Em meio ao trânsito caótico das principais cidades brasileiras, agravado pela incompetência dos departamentos de engenharia de tráfego, veículos compactos se mostram uma boa opção para deslocamentos urbanos.
Alguns modelos, como o Fiat 500 e o Citroën DS3, destacam-se pelo design diferenciado, enquanto outros como o Fiat Punto só são considerados "premium" devido à pobreza do mercado brasileiro...

Considerando apenas o tamanho, modelos como o Mini Cooper podem parecer demasiado caros. No entanto, a união entre o tamanho próximo ao de alguns dos franciscanos "carros populares" com ítens de conforto mais usuais em veículos de porte mais avantajado, como o câmbio automático que hoje é bastante apreciado, é cada vez mais atraente e conquista até mesmo consumidores anteriormente ávidos por espaçosas "banheiras" como o Chrysler 300C.
Embora um veículo de maiores dimensões seja atraente como símbolo de opulência, na prática mesmo um modelo de dimensões mais contidas como o Mercedes-Benz Classe B podem apresentar um bom nível de conforto sem abrir mão da praticidade.