terça-feira, 28 de março de 2023

Ford: em vias de se tornar uma Agrale com pedigree?

Um dos fabricantes que mais se destacaram em meio a tantos momentos históricos no Brasil, bem como em outros mercados mundo afora, a Ford já reinou absoluta especialmente no segmento de pick-ups, e a F-1000 é um bom exemplo do quão poderosa a empresa foi no mercado brasileiro. Embora a Ford tenha cometido alguns erros no tocante à linha de motores enquanto manteve a operação industrial no Brasil, a forma como o outsourcing costumava ser relevante à medida que motores Diesel foram consolidados na preferência do público facilitava contornar essa deficiência no caso da F-1000 quando dispunha dos ainda hoje cultuados motores MWM de fabricação brasileira, que predominavam enquanto os motores a gasolina de fabricação própria da Ford eram importados da Argentina. É natural alguma similaridade do processo produtivo básico de uma caminhonete tradicional e o que se fazia na época dos calhambeques, facilitando um comodismo da Ford em torno dos utilitários e que tem sido ainda mais relevante agora.
Levando em consideração também uma defasagem técnica entre os modelos brasileiros e os americanos das caminhonetes full-size da Ford, interrompido somente no fim de '98 quando houve a substituição da F-1000 pela F-250, é inevitável fazer alguma comparação com as estratégias de outros fabricantes tanto de origem estrangeira como a própria Ford quanto brasileiros e especializados no ramo dos utilitários a exemplo da Agrale. Enquanto a F-1000 brasileira ficava mais restrita ao mercado local e à exportação a países vizinhos como a Argentina e o Uruguai a partir da consolidação do Mercosul na década de '90, a F-250 que no Brasil sempre contou com motores mais austeros e câmbio manual chegou a ter opções de motores V8 tanto a gasolina quanto turbodiesel exclusivas para exportação à Austrália e Nova Zelândia, além da cabine dupla e da tração 4X4 também terem chegado antes a mercados externos que incluíam a África do Sul onde contava só com o motor turbodiesel MWM Sprint 6.07 TCA de 6 cilindros em linha e câmbio manual até 2005. Como seria de se esperar, a necessidade de atender a padrões mundiais fez a linha de motores para versões destinadas à exportação ser mais ampla, e a princípio tenha sido o único motivo para a defasagem técnica no tocante à configuração de chassi e a aparência ter sido interrompida até o encerramento das exportações para regiões de mão inglesa em 2005.
Além do mercado de pick-ups full-size no Brasil ter retraído à medida que os modelos superavam uma faixa de peso bruto total de 3500kg que é o máximo permitido para a condução por detentores da CNH categoria B, e passavam a ser enquadradas como caminhões no Brasil e portanto sujeitas a restrições ao tráfego em alguns centros urbanos e devendo ser observados limites de velocidade máxima menores em estrada, a mudança do perfil de uso deixando de ser mais estritamente profissional ficando mais voltado ao lazer também desfavorecia motores mais rústicos que então predominavam nas versões brasileiras. O motor Cummins com "só" 4 cilindros substituindo o MWM em 2005 e acompanhando a F-250 até 2011 quando a Ford parou de produzir caminhonetes full-size no Brasil contrastava com o maior alinhamento de outros modelos ao que já se oferecia em mercados internacionais no segmento, além da consolidação das pick-ups médias no Brasil desde a década de '90 em resposta à reabertura das importações. Apesar de uma parte do público brasileiro ter ficado praticamente sem opções de veículos essencialmene mais voltados a serviço pesado e com um custo operacional menor que o de modelos destinados ao lazer, fica mais fácil explicar até uma certa semelhança entre a atual situação da Ford e a estratégia da Agrale.

Um curioso precedente do que me parece uma "agralização" da Ford foi o antigo sucesso no segmento de pick-ups compactas derivadas de automóveis, com a Pampa e posteriormente a Courier que tiveram uma maior popularidade junto a operadores mais voltados ao uso estritamente profissional enquanto as concorrentes agradavam mais também a particulares, e portanto até a defasagem que apresentavam nos respectivos encerramentos de produção em '97 para a Pampa e 2013 para a Courier parecia irrelevante. A política de One Ford implementada no rescaldo da crise hipotecária americana de 2008 inviabilizou o investimento em novos modelos da categoria, cujo maior foco era o Brasil e numa escala muito menor a África do Sul, e no tocante a utilitários de um modo geral a moda de SUV ficava mais viável em escala global também entre modelos compactos, enquanto nas pick-ups a preferência por modelos maiores foi decisiva para a Ford adotar uma abordagem diferente. E naturalmente, o fim da produção de carros pela Ford no Brasil, onde predominavam modelos compactos no catálogo também prejudicaria a economia de escala, considerando que estruturas semimonobloco como a da Pampa ou monobloco propriamente dita como a da Courier acabam dependendo de ferramentaria mais específica em comparação ao que se usa na produção de chassis para outras categorias de veículo.

A continuidade de produção na Argentina, onde é feita a Ranger enquanto todo o restante da linha Ford é importado como acontece no Brasil, também fomenta comparações com a Agrale, pela dependência por um modelo utilitário cujo processo de produção é basicamente o mesmo, em que pesem diferenças entre alguns subconjuntos como suspensão e direção ou o perfil das longarinas, que nas gerações mais recentes de caminhonetes tem predominado o que se conhece por boxed-frame com longarinas de seção quadrada em contraste com a seção aberta das longarinas mais frequentemente usadas em caminhões e chassis para ônibus. Concentrar esforços no mercado de utilitários, e assim atender com mais facilidade a clientes institucionais/corporativos ou produtores rurais na modalidade de vendas diretas ao invés de priorizar o público generalista no varejo, é outro ponto que tem sido digno de nota desde que a Ranger passou a ser o modelo com maior volume de vendas de toda a linha Ford no Brasil com o encerramento da produção nacional e a retirada do segmento de carros compactos. Por mais que à primeira vista soe exagerado comparar um modelo mundial que é a Ford Ranger aos utilitários Agrale, desenvolvidos com uma maior ênfase no Brasil e na Argentina mas que também acabam alcançando outras regiões através de exportação, os processos produtivos guardarem uma certa semelhança e a busca da Ford para firmar uma imagem de "especialista" em utilitários como a Agrale é reconhecida tornam inevitável classificar a atual estratégia da Ford como ser uma Agrale com pedigree.

Até o recente relançamento dos furgões Ford Transit no Brasil, agora montado em CKD pela Nordex no Uruguai, me remete à experiência da Agrale com o antigo Furgovan, com as devidas ressalvas tendo em vista que a linha Transit é um projeto mundial em contraste com o evidente regionalismo que norteou o Agrale Furgovan, além da oferta de versões de rodado simples e PBT dentro do limite de 3500kg para a condução por detentores de CNH categoria B ter se tornado um fator mais relevante para o sucesso de furgões modernos em um mercado cada vez mais competitivo. Sem entrar no mérito de diferenças entre motores turbodiesel de diferentes gerações e os sistemas de controle de emissões que sejam associados a cada, outro ponto a se destacar é a linha Transit chegar ao Brasil somente com tração traseira mesmo que tenha versões de tração dianteira na Europa, tornando inevitável uma comparação com a concepção mais tradicional da linha Agrale. No caso da Ford, a possibilidade de compartilhar mais elementos como os câmbios manual de 6 marchas e automático de 10 marchas com as pick-ups de tração traseira ou 4X4 acaba favorecendo a logística entre modelos fabricados na Argentina e no Uruguai, enquanto a Agrale mesmo tendo deixado de lado o segmento de furgões usa basicamente a mesma configuração do Furgovan nos caminhões e chassis para ônibus que são as principais especialidades fora dos segmentos de tratores agrícolas e de viaturas militares que tem sido os mais destacados.

A idéia de uma maior percepção de valor agregado que vem sendo atribuída aos utilitários de diversas categorias é algo que tem pesado favoravelmente na atual estratégia da Ford, tanto no caso dos Estados Unidos onde os SUVs como o Bronco Sport conquistaram uma participação de mercado considerável por serem classificados como "caminhões leves" e ficarem sujeitos a normas mais lenientes de consumo de combustível e emissões quanto em outras regiões onde a proposta de veículos que externalizem uma imagem de "estilo de vida" agrada a uma parte considerável do público generalista mesmo em grandes centros urbanos, mesmo que configurações hoje consideradas um padrão em carros mais austeros sejam incorporadas também a essa categoria como o motor transversal e a tração dianteira ou integral, além da estrutura monobloco. A economia de escala ao compartilhar alguns subconjuntos com outros modelos é relevante a nível mundial, mesmo que tenham uma presença mais territorializada em diferentes regiões, e a Ford manter uma oferta de carros generalistas com configurações mais tradicionais de carroceria na Europa e na China parece até justificar essa estratégia, ao mesmo tempo que faz parecer menos próxima de se tornar uma Agrale de luxo. O caso específico do Ford Bronco Sport, com a produção concentrada no México de onde vai sobretudo para os Estados Unidos e Canadá sem impostos de importação devido ao NAFTA e chega ao Brasil com um benefício semelhante proporcionado por acordos bilaterais, acaba por enfatizar que a Ford tem de fato seguido uma estratégia semelhante com a Agrale, regionalizando as prioridades e focando nos respectivos mercados domésticos (Estados Unidos para a Ford e Brasil para a Agrale) com pontuais adequações a outros mercados onde pareça sustentável manter operações tanto de produção quanto de importação.

Quanto à retirada da Ford do setor de caminhões tanto no Brasil quanto em outros países da América do Sul, onde teve modelos marcantes como o "sapão" na época que a Série F era mais apreciada e o Cargo de 2ª geração que havia sido desenvolvido com participação da Otosan que é associada à Ford e voltada à produção de utilitários na Turquia, o mais curioso é a Ford ter voltado a vender caminhões na Europa Ocidental pouco antes do encerramento da operação brasileira nesse mercado, e justamente o Cargo de 2ª geração ter marcado esse retorno. Para um fabricante que cada vez mais tenta firmar uma imagem de especialista em utilitários, o mais lógico seria ter mantido a venda de caminhões no Brasil e nos países vizinhos que eram supridos pelos modelos de fabricação brasileira, e apesar da operação turca até poder eventualmente expandir ainda mais a presença global da Ford Trucks, certas peculiaridades da produção brasileira como o outsourcing de motores junto à Cummins ainda podiam ser mais favoráveis em alguns mercados. Enfim, mesmo considerando os diferentes segmentos e regiões que atendem, a Ford vem na prática se posicionando praticamente como uma Agrale com pedigree...

quarta-feira, 22 de março de 2023

Por quê o farol sealed-beam ainda encontra alguns adeptos bastante irredutíveis?

Obrigatórios nos Estados Unidos entre 1940 e 1982, os faróis sealed-beam costumavam ser um detalhe que saltava aos olhos e permitia a rápida identificação de versões US-spec até de carros feitos em outras regiões como o Jaguar XJS, que diga-se de passagem ainda os mantinha na época que esse exemplar de 1984 foi produzido. E embora o período da obrigatoriedade dos sealed-beams nos Estados Unidos possa dar a impressão de ter atrapalhado mais que ajudado, tendo em vista a lentidão de readequações que se fizeram necessárias para facilitar a adaptação de novos modelos à regulamentação americana no tocante ao tamanho e configurações permitidas para os conjuntos de faróis, bem como uma proibição ao uso de proteções e ornamentos à frente dos faróis em funcionamento para veículos de especificação americana a partir de 1968, os sealed-beams ainda encontram adeptos irredutíveis tanto para veículos de coleção como um Jaguar XJS quanto para outros tantos que se mantenham em uso frequente como por exemplo inúmeros veículos utilitários que permaneciam usando sealed-beams em função de um custo moderado.
Naturalmente o uso de faróis com o facho simétrico, da mesma intensidade tanto para o acostamento quanto para o meio da pista, já se revelava vantajoso quanto à logística ao viabilizar que o mesmo farol ou par de faróis pudesse ser instalado tanto no lado esquerdo quanto direito, embora também tenha sido comum em algumas regiões como a Ásia o uso de sealed-beams de facho assimétrico no farol baixo que direcionavam uma maior intensidade de luz no lado do acostamento. Os formatos padronizados, desde a época que era obrigatório um par de faróis redondos de 7 polegadas ou 178mm até ser autorizado em 1957 usar a configuração com 4 faróis ainda redondos mas com 5,75 polegadas ou 146mm e separação dos focos alto e baixo como usado no Jaguar XJS, até que em 1974 foram permitidos sealed-beams retangulares de 7,9 por 5,6 polegadas ou 200 por 142mm quando usados um de cada lado e de 6,5 por 3,9 polegadas ou 165 por 100mm que seria aplicável aos veículos com 4 faróis, no fim das contas tinha a vantagem de uma peça idêntica difiiclmente sofrer variações de preço de acordo com o veículo, até os modelos mais exóticos. E como nos Estados Unidos ainda é muito comum o uso de sealed-beams especialmente entre veículos utilitários de trabalho, basicamente por ser considerado barato e manter uma intercambialidade entre diferentes modelos na mesma frota, seria um argumento a favor para preservar a originalidade em modelos antigos, mesmo já sendo até fácil encontrar blocos ópticos de formato semelhante para uso de lâmpadas substituíveis como em qualquer farol moderno com formato específico para cada modelo.

Um caso peculiar foi da Mitsubishi L200 de 2ª geração, que ainda chegou a vir importada do Japão com sealed-beams retangulares que eram praticamente onipresentes nas caminhonetes médias japonesas das décadas de '80 e '90, mas durante o ciclo de produção estendida no Brasil recebeu faróis redondos, sem que fossem sealed-beams mas também valendo-se de uma percepção de facilidade de reposição porque já era bastante comum essa configuração desde motos até caminhões. Cabe ressaltar entre os pretextos a favor de sealed-beams o fato de serem basicamente imunes a infiltração de umidade ou até de partículas que possam ser encontradas em alguns ambientes onde os veículos trafeguem, especialmente desejável em situações off-road às quais uma pick-up 4X4 teoricamente seria mais orientada, em que pese faróis modernos com lâmpadas removíveis serem frequentemente mencionados como mais resistentes ou até mesmo "inquebráveis" devido ao uso de plásticos como o policarbonato para a fabricação das lentes em substituição ao vidro. Outro aspecto a considerar quanto às diferenças dos materiais é o fato do vidro ter uma maior resistência a danos por contato com alguns produtos químicos ou abrasivos e à degradação que pode ser causada pela exposição aos raios ultravioleta que torna opacas lentes de faróis de plástico.

Tendo perdido espaço no mercado de automóveis até nos Estados Unidos à medida que deixaram de ser obrigatórios, mas tendo permanecido popular em veículos pesados como caminhões por bastante tempo basicamente em função da modularidade e por ser algo que os operadores já eram bem familiarizados, os faróis sealed-beam também se mantiveram confortavelmente por causa das regulamentações que nos Estados Unidos são bem específicas, e portanto pouco convidativas a modernizações devido aos custos de homologação. Por mais que até caminhões americanos tenham deixado de usar apenas sealed-beams, é inegável que um certo conservadorismo entre operadores comerciais ainda os favoreça também fora dos Estados Unidos, embora os sealed-beams retangulares estejam mais difíceis de encontrar por terem menos demanda entre colecionadores de automóveis antigos em comparação a sealed-beams redondos. Enfim, por mais que até os sealed-beams halógenos pareçam demasiadamente defasados aos olhos do público generalista mesmo que em carros mais austeros ainda se usem lâmpadas halógenas nos faróis, é compreensível que os sealed-beams ainda encontrem alguns adeptos bastante irredutíveis.

quinta-feira, 16 de março de 2023

Chevrolet Montana de 3ª geração, um modelo que poderia ser melhor aproveitado para uma recuperação de presença global da GM

Em meio a tantas mudanças que o mercado automobilístico brasileiro vem passando nos últimos anos, a chegada da 3ª geração da Chevrolet Montana chama a atenção por exemplificar algumas circunstâncias recentes como a maior presença de mercado do câmbio automático e de motores turbo com 3 cilindros. Além de ser a primeira Montana a contar com a opção pelo câmbio automático, o mesmo proveniente da Coréia do Sul que agora equipa ao menos como opcional todos os modelos Chevrolet disponíveis no Brasil tanto de fabricação nacional quanto importados da Argentina ou do México, também representa o novo perfil mais essencialmente recreativo que de um modo geral se tem observado em pick-ups entre as diferentes faixas de tamanho, tendo em vista o lançamento apenas com cabine dupla sem uma opção pela cabine simples que era a única oferecida nas duas gerações anteriores. Com um tamanho que pode ser considerado menos inconveniente para o uso cotidiano em comparação a utilitários maiores e mais pesados, e um motor que devido ao downsizing seria conveniente até em mercados onde a tributação em função da cilindrada afetando utilitários chega a ser mais severa que no Brasil, a Chevrolet Montana cairia como uma luva no caso de um improvável retorno da General Motors a regiões tão distintas como a Europa Ocidental onde ainda mantém uma presença limitada da Cadillac e dos esportivos Chevrolet Camaro e Corvette, da Índia onde a operação funcionava em joint-venture com a SAIC tal qual ocorre na China e atualmente a própria SAIC tem usado parte da antiga estrutura para vender modelos próprios com a marca MG, e na África do Sul onde no momento que a GM se preparava para encerrar as vendas de veículos novos entre o final de 2017 e o começo de 2018 a Montana então denominada Chevrolet Utility era líder de vendas entre as pick-ups compactas.

Embora a princípio todos os modelos Chevrolet brasileiros e chineses, e Buick chineses, desenvolvidos a partir da plataforma Global Emerging Markets (GEM) terem cockpit à esquerda, característica que em regiões como a Índia e partes da África onde se usa a mão inglesa necessitaria de uma alteração para ter o cockpit à direita, é inegável que a engenharia da GM tem toda a capacidade técnica para implementar uma solução, e a própria Montana sempre foi uma prova sobretudo do quão competente é a engenharia brasileira que a bem da verdade foi pouco aproveitada a nível mundial e parecia subestimada à medida que projetos inicialmente direcionados à China ganhavam força. A tração somente dianteira, a princípio parece algo um tanto difícil difícil de alterar para oferecer a tração nas 4 rodas que seria especialmente útil para atender tanto ao uso estritamente recreativo quanto eventuais aplicações efetivamente laborais que uma pick-up mesmo compacta possa vir a ter, embora o câmbio automático sendo rigorosamente o mesmo usado em versões tanto de tração dianteira quanto 4X4 em outros modelos já pudesse facilitar a implementação desse recurso especialmente desejável à medida que uma pick-up compacta de hoje tem praticamente o mesmo tamanho de uma mid-size de 25 a 30 anos atrás. E por mais que um motor 1.2 de 3 cilindros seja a princípio muito diferente do que se espera ao abrir o capô de uma pick-up Chevrolet, é também digna de nota a presença do turbo, bem como os motores CSS Prime em versões 1.0 e 1.2 tanto aspirados quanto turbo em diferentes modelos Chevrolet e Buick serem perfeitamente competitivos em comparação a similares de outros fabricantes, em que pese as versões brasileiras permanecerem usando a injeção sequencial indireta ao invés de recorrer à injeção direta usada em versões chinesas e coreanas, lembrando que a injeção direta acaba sendo uma faca de dois gumes tanto ao adicionar complexidade e custo quanto ao dificultar conversões para gás natural e já ser exigido para motores de injeção direta um filtro de material particulado análogo aos que já se usavam em muitos motores turbodiesel certificados de acordo com as normas de emissões Euro-4 e Euro-5.
Naturalmente um europeu ficaria cético quanto ao uso de uma plataforma especificamente desenvolvida para mercados ditos "emergentes", embora a Renault através da subsidiária Dacia tenha algum sucesso em segmentos mais austeros do mercado automotivo europeu ocidental, além de parecer desanimador o uso de um motor que acaba escapando a diversos conceitos de "americanidade" que tendem a ser muito mais associados à marca Chevrolet e a motores de alta cilindrada entre 6 e 8 cilindros, que normalmente são usados em pick-ups full-size que às vezes são consideradas o jeito mais barato para aqueles fãs de motores V8 que existem até na Europa satisfazerem um gosto pessoal porque alguns impostos acabam sendo mais baratos em comparação aos que seriam aplicáveis a um carro esportivo ou de luxo que tenha um motor de alta cilindrada. Um americano poderia ficar particularmente cético quanto à segurança por se tratar de um modelo feito a partir de uma plataforma para a qual a princípio nunca teria sido prevista a "federalização", e com a transferência da produção do Chevrolet Onix de especificação mexicana para a China visando liberar espaço na fábrica de San Luís Potosí para a produção de SUVs para exportação sobretudo aos Estados Unidos também seria algo a considerar caso parecesse uma boa idéia exportar a Montana a partir do Brasil, tendo em vista que uma caminhonete brasileira teria o inconveniente de ser sujeita à Chicken Tax da qual as caminhonetes mexicanas são isentas por causa do NAFTA. Apesar de tais circunstâncias efetivamente levarem a alguma dificuldade para uma eventual internacionalização mais expressiva da Chevrolet Montana de 3ª geração além do Brasil e mercados regionais na América Latina, e a bem da verdade até me surpreende ser oferecido nesse modelo somente um motor turbo que pode sofrer nas mãos dos cupins de ferro de plantão, um crescimento nas dimensões externas também em caminhonetes de outras categorias como as médias ao longo das últimas 3 décadas fomenta o desejo por modelos modernos nessa faixa de tamanho até mesmo da parte de alguns americanos.

Um complexo de vira-lata infelizmente ainda tão comum no Brasil, com muitos brasileiros acreditando na inerente "inferioridade" de todo o nosso povo perante o mundo, às vezes leva à crença que qualquer produto especificamente destinado ao mercado local seja "refugo", e portanto a 3ª geração da Chevrolet Montana também pode ser alvo de preconceitos no Brasil mesmo. No entanto, ao observar uma série de características estritamente técnicas e também condições fomentadas pela burocracia em outras regiões, é perceptível que há espaço para uma maior internacionalização da Montana até mesmo para restaurar ao menos em parte uma maior presença global da General Motors até em mercados tão improváveis de ser receptivos a uma pick-up compacta quanto a Europa onde predominam furgões em uso profissional e os SUVs vão ganhando espaço junto ao público generalista, a África do Sul onde uma nova Chevrolet Utility seria especialmente bem-vinda, e até a Tailândia que chegou a ser mais relevante na estratégia de internacionalização da GM em outras décadas e ainda é um dos maiores mercados a nível mundial para pick-ups com destaque para as médias mas tem sido desafiador em função de algumas políticas voltadas à redução de consumo de combustível e emissões para as quais a experiência brasileira com os motores flex movidos a gasolina e etanol também poderia ter sido melhor aproveitada. Enfim, mesmo que seja improvável a GM voltar a ter a ousadia necessária para mostrar que ainda é um player competitivo tanto nos principais mercados mundiais quanto para marcar território em meio à hegemonia dos fabricantes japoneses mundo afora encabeçada pela Toyota e mais recentemente o impacto do dumping chinês em regiões onde o custo inicial dos veículos novos é mais crítico, a Chevrolet Montana de 3ª geração ainda poderia ser uma boa ponta de lança.

segunda-feira, 13 de março de 2023

LML Star 200-4S, uma cópia da Vespa clássica mas com motor 4-tempos

Fabricada entre os anos '99 e 2017 pela antiga Lohia Machinery Limited, que era sediada na cidade de Kanpur, no estado de Uttar Pradesh no norte da Índia, a LML Star passaria batida como tantas cópias da Vespa italiana feitas em países tão diversos quanto a Índia ou a Rússia.
Em função de regulamentações de emissões cada vez mais rígidas, em 2009 ocorreu a substituição do motor 2-tempos de 150cc que deu lugar a um de 200cc e 4-tempos que acompanhou o modelo até o fim da produção no mesmo ano que a fábrica encerrou as atividades, e havia sido desenvolvido em parceria com a Daelim que é uma das fábricas de motos mais importantes da Coréia do Sul.
Um modelo que poderia ter agradado a fãs da clássica Vespa, além do mais que a LML chegou a ter um convênio anterior com a Piaggio e portanto dizer que seja uma cópia clandestina seria um equívoco, e a combinação de um motor 4-tempos mais adequado às expectativas do público moderno com relação à economia de combustível e a políticas de controle de emissões mais rígidos, hoje é uma raridade, com esse exemplar do ano 2012 tendo sido o único que eu vi ao vivo em Porto Alegre.

quinta-feira, 9 de março de 2023

5 motivos para o Jeep CJ-5 ter sido um dos veículos mais importantes na história da indústria automotiva brasileira

Um daqueles modelos icônicos e facilmente reconhecíveis até por quem é pouco ou nada familiarizado com automóveis, o Jeep CJ-5 deixou um profundo legado por vezes ainda subestimado no tocante ao desenvolvimento do Brasil, tanto na atividade rural para a qual foi especialmente direcionado quanto na consolidação como um grande pólo de produção de automóveis de um modo geral entre países ditos "emergentes". Ao menos 5 motivos podem ser apontados para justificar tamanha importância:

1 - chegou em alguns momentos a ser o carro 0km mais barato do Brasil: naturalmente pelo fato de ser um veículo utilitário de concepção tradicional, priorizava a função sobre a forma, e assim apesar da complexidade da tração 4X4 que equipou a imensa maioria dos exemplares de fabricação brasileira, foi priorizada a austeridade desde o início da montagem no país em 1954 ainda com peças importadas até a produção efetivamente nacional entre 1957 e 1983. Certamente a carroceria aberta, que frequentemente recebia capotas e portas de lona fornecidas por fabricantes independentes de acessórios, era outro fator que diminuía o custo de fabricação e o preço de tabela;

2 - teve o primeiro motor a gasolina feito no Brasil: contrariando alguns céticos que apontavam o clima do país como um empecilho para a fundição de blocos de motor, já em 1959 a Willys-Overland do Brasil produzia o motor BF-161 "Hurricane" de 6 cilindros em Taubaté. Mais emblemático foi o fato dessa mesma fábrica, já após a operação brasileira da Willys-Overland ter sido vendida à Ford, ter até exportado motores de projeto mais moderno para os Estados Unidos;

3 - produção continuada por mais de 1 fabricante: com a fusão entre a Willys-Overland do Brasil e a Ford em 1967, a linha Jeep teve continuidade até 1983. Naturalmente a adoção do Jeep pelos militares já tornava a operação bastante rentável, bem como o desbravamento de novas fronteiras agrícolas e até o uso em serviços pesados no ambiente urbano;

4 - polivalência: embora o público urbano generalista já tenha chegado a subestimar ainda mais o Jeep CJ-5 em outras épocas, tanto pelos estereótipos depreciativos à população interiorana quanto a própria rusticidade contrastar com as pretensões mais sofisticadas de modelos declaradamente urbanos, no fim das contas o porte bastante compacto de um Jeep tradicional comparado a diversos carros compactos é mais conveniente do que poderia parecer num primeiro momento. E apesar de hoje ser mais visto em usos ocasionais de lazer, até relativamente pouco tempo atrás ainda era fácil ver com certa frequência exemplares do modelo em uso cotidiano normal;

5 - definição de parâmetros para homologação de SUVs modernos: quem hoje compra um SUV de concepção moderna, já muito distante das premissas estritamente utilitárias, se hoje pode contar com um motor Diesel é beneficiado pela classificação como "utilitário" com base nas capacidades de tração 4X4 definidas ainda durante o ciclo de produção continuada do Jeep CJ-5 nas mãos da Ford, permitindo a modelos com capacidade de carga abaixo de uma tonelada e acomodação para menos de 9 passageiros além do motorista serem equipados com motor Diesel se tivessem tração 4X4 com reduzida. O mais curioso é que, embora no exterior tenha sido oferecida a opção por um motor Perkins, nenhum Jeep CJ-5 brasileiro saiu de fábrica com motores Diesel.

quinta-feira, 2 de março de 2023

Polo Track: vencida a última barreira para a Volkswagen do Brasil ter uma linha mais próxima à de mercados internacionais?

Com a árdua missão de substituir o Gol, que na prática era o último resquício de quando a Volkswagen do Brasil podia e até precisava direcionar-se mais a projetos com um viés especificamente "emergente", o Polo da geração atual recebeu a versão Track visando atender a uma parcela mais austera do público da marca no país. Com o motor 1.0 apenas em versão sem turbo e o câmbio manual de 5 marchas, e um acabamento com simplificações bastante nítidas mas sem aparentar qualquer perda de qualidade, o Polo Track a princípio se destaca em comparação ao Gol por ter o projeto ainda atualizado diante das versões "normais" produzidas tanto no Brasil quanto em outras regiões, aparenta mais aptidão à utilização como carro familiar que o up! anteriormente apresentado com uma proposta de atender ao público tradicional do Gol, mas que havia falhado exatamente pela falta de uma percepção de polivalência necessária a um modelo que se propõe a ser "popular" de acordo com as peculiaridades do mercado brasileiro.

Em que pese os hatches estarem em desfavor aos olhos do público generalista, e mais recentemente as restrições ao uso de veículos dessa categoria como táxi ao menos nas principais capitais acarretarem nas perspectivas de mercado à primeira vista mais restritas, o fogo amigo que o Polo já apresentava sobre as versões mais sofisticadas (ou melhor dizendo menos depauperadas) do Gol justificou até a atualização da fábrica de Taubaté para atender ao maior rigor dos padrões internacionais que já eram aplicados para a fábrica de São Bernardo do Campo. Alterações discretas na altura de rodagem, bem como a calibração dos sistemas de controle de tração e estabilidade para atenderem com mais desenvoltura a condições de rodagem ainda muito comuns no interior, e que em outro momento histórico serviram para justificar um retorno do Fusca às linhas de produção durante o governo Itamar Franco mesmo quando o Gol já estava bem consolidado junto ao público generalista, denotam a importância que a "tropicalização" ainda tem, e reforçam a impressão que a Volkswagen busca "marcar território" com um modelo que acena para um perfil "histórico" de clientes que ainda comparam até os modelos mais recentes de qualquer automóvel generalista ao Fusca. E mesmo que alguns possam considerar uma "economia porca" alguns detalhes do acabamento, claramente simplificado como na ausência de pintura nas maçanetas das portas, e também o uso de rodas com 4 parafusos ao invés de 5 e os freios traseiros a tambor, são reduções de custos que se revelam perfeitamente aceitáveis aos olhos do público específico que essa versão precisa buscar com o fim da produção do Gol, e estão longe de comprometer a segurança e o conforto em uso normal.

Mesmo que em outras regiões como a Europa o Polo tenha perdido a opção pelo motor 1.0 MSI com a mais recente reestilização, enquanto o TSI permaneceu e até chega a me remeter a uma antiga intenção da Volkswagen de abolir os motores de aspiração natural a nível mundial, convém destacar que o Polo Track dispensar o turbo ainda faz sentido tanto pelo custo quanto pela manutenção mais simples, tendo em vista que modelos turbo são mais vulneráveis a danos causados por descuidos quanto à observância de especificações do óleo lubrificante e respectivos intervalos entre as trocas. Lembrando que em outros mercados principalmente na América Latina e África o motor 1.0 TSI também é preterido, por motivos que vão desde a tributação menos atrelada à cilindrada até exatamente a percepção de uma facilidade de manutenção e ficar livre do turbo-lag, e o motor 1.6 MSI oferecido no Polo brasileiro até 2022 ainda ser decisivo para outros modelos conseguirem uma participação de mercado em outros países, é impossível justificar alegações que o Volkswagen Polo Track estaria fora de contexto no tocante a um alinhamento efetivo da operação brasileira do fabricante com o que acontece em mercados internacionais. Enfim, em que pese substituir um modelo como o Gol que ainda tinha boa presença junto a clientes empresariais e outros com um perfil igualmente austero, aparentemente um alinhamento da Volkswagen do Brasil com mercados internacionais inclusive entre os mais rigorosos parece transpor uma das últimas barreiras.

quarta-feira, 1 de março de 2023

Yamaha Ténéré clássica na cor mais tradicional

Uma daquelas motos antigas que sempre se destacam, especialmente por ter dado origem à lendária linha Ténéré que consolidou o segmento das bigtrails. essa Yamaha XT 600 Z Ténéré ano '90 naquele tom de azul tão característico das motos de competição da Yamaha obviamente chama a atenção, tanto pelo porte imponente quanto por ser um modelo mais antigo em excelente estado de conservação.
Com exceção de um bauleto moderno, que acaba destoando do estilo do conjunto, a originalidade estava bem preservada nessa Ténéré quando eu a avistei a uma certa distância, sendo impossível resistir aos encantos de uma das motocicletas mais marcantes da história...