terça-feira, 8 de abril de 2014

Câmbio manual de 4 marchas: será mesmo tão inadequado?

Até os anos '90 ainda era relativamente bem-aceito mesmo em alguns dos principais mercados mundiais que se oferecesse o câmbio manual de 4 marchas numa ampla variedade de modelos. Alguns, como o Nissan Sentra de 3a geração produzido entre '91 e '94, embora considerados "de entrada" em mercados como o americano, acabavam sendo um tanto glorificados em um certo país terceiro-mundista que recém tinha sido novamente aberto aos importados, e mantinham a opção por câmbio manual de 4 marchas paralelamente a um de 5 marchas. Se por um lado pode parecer um contra-senso, por outro tinha alguma lógica que sustentava essa estratégia: o consumidor americano médio não era tão apreciador do ato de trocar marchas manualmente, então para aqueles que não se entusiasmavam com as pretensões "esportivas" de um câmbio com mais marchas e um menor espaçamento entre as mesmas (close-ratio), além do diferencial encurtado para que ainda fosse proporcionada uma certa agilidade em arrancadas, mas também não queriam pagar mais caro pela comodidade do câmbio automático, tinham a opção por um câmbio que, apesar da menor quantidade de marchas e o maior espaçamento entre as mesmas (wide-ratio), acabava por ser escalonado de uma forma mais eficiente e ainda podia contar com um diferencial mais longo que possibilitasse manter a mesma velocidade de cruzeiro a um regime de rotações igual ou até ligeiramente inferior ao de um similar com uma marcha adicional e mais longa.
No caso específico do Sentra, havia uma controvérsia: a EPA (Environmental Protection Agency, uma espécie de IBAMA) americana atribui médias de consumo urbano idênticas (25MPG, cerca de 10km/l) tanto para as versões com câmbio manual de 4 marchas quanto para as de 5, enquanto no consumo rodoviário as médias são listadas em 35MPG (cerca de 14km/l) com 5 marchas e 33MPG (aproximados 13,2km/l) com 4 marchas. Convém recordar, no entanto, que as médias obtidas nos ciclos de testes da EPA são muito contestadas pelo método como são feitos, e proprietários de Sentra com o câmbio de 4 marchas normalmente obtém resultados mais satisfatórios em condições reais de uso em comparação com o de 5 marchas. Além da questão do escalonamento de marchas e relações de diferencial, convém levar em consideração a redução de peso (ainda que pareça irrisória diante do veículo completo) e de atritos internos na caixa com uma marcha a menos, o que também acaba por ter um peso significativo nos resultados obtidos.

No cenário brasileiro, vale tomar por referência a linha Volkswagen durante a década de '80: mesmo após o lançamento do câmbio manual de 5 marchas como opcional, o de 4 marchas permanecia disponível e até era a opção para quem preferisse um escalonamento otimizado para a economia de combustível.
Vale salientar que no Voyage e na Parati o câmbio de 4 marchas foi o único a ser oferecido durante o programa de exportação para Estados Unidos e Canadá, tanto pelo tamanho do "túnel" central não acomodar o câmbio automático de 3 marchas oferecido no Santana sem modificações estruturais mais extensas quanto pela menor quantidade de trocas de marcha requeridas, tornando a condução menos desgastante para os americanos.

Outro ponto a se destacar era a maior resiliência ao ser submetido a estilos de condução mais severos, como o que o Passat LSE era dimensionado para enfrentar nas mãos dos desleixados motoristas iraquianos, e nas condições de carga mais intensa, como no Gol Furgão.

Mesmo com uma consolidação dos câmbios de 5 marchas mesmo em versões mais simples de modelos como o Gol e a Parati, que na geração "bolinha" já não contavam com nenhuma opção pelos antigos câmbios de 4 marchas, ainda que por razões diversas ainda pudessem se encaixar satisfatoriamente em alguns cenários operacionais.

Mesmo quando a Kombi passou a ser equipada com motor de refrigeração líquida em 2006, enquanto alguns esperavam uma 5a marcha, permanecia com apenas 4. Um argumento para embasar a decisão da Volkswagen era a questão do espaço já limitado para a instalação do câmbio, além de considerações sobre os esforços aos quais estaria submetido.

Cabe salientar também fatores de ordem logística e operacional: ainda tomando a Volkswagen como exemplo, devemos lembrar que a carcaça dos transeixos de 4 marchas para montagem longitudinal era basicamente a mesma, independentemente de ser aplicada num modelo de motorização dianteira como o Gol ou traseira como a Kombi. Naturalmente, isso acabava por reduzir os custos de desenvolvimento de produto. Além disso, em aspectos gerais a menor quantidade de algumas peças que iriam da engrenagem de uma 5a marcha até o respectivo sincronizador também se refletia em menos gasto com material e energia durante a fabricação do câmbio.
Na geração split-window, também conhecida como "corujinha" ou "jarrinha" e produzida no Brasil até '76, a Kombi era dotada de cubos redutores nos semi-eixos traseiros, portanto era necessário inverter o sentido de rotação interna do câmbio em comparação com as demais aplicações de motor traseiro sem os redutores. Valendo-se dessa reversibilidade não foi difícil adaptar, por exemplo, ao Passat.

Atualmente, tem sido comum em modelos de porte médio como o Nissan Sentra de 7a geração e o Toyota Corolla de 11a geração, a única opção de câmbio manual ter 6 marchas e um escalonamento "esportivo" que destoa tanto de um estilo "executivo" evidenciado no primeiro quanto pelo status de "carro de avô" do segundo. Considerando o status de ambos no mercado americano sendo quase como o dos "populares" brasileiros, um câmbio de 4 marchas mais espaçadas associado a um diferencial mais longo para favorecer a economia de combustível caso fosse oferecido a um custo menor que o atual de 6 marchas agradaria aos poucos consumidores budget-conscious que ainda optam pelo manual por lá, enquanto por aqui apesar da participação cada vez menor do câmbio manual entre os sedãs médios certamente haveria alguma polêmica tanto pela percepção de um número menor de marchas como "inferioridade técnica" quanto pela suposta "esportividade" desejada por alguns tiozões em crise de meia-idade. Logo, apesar do mercado vir demonstrando um posicionamento contrário, me parece que o câmbio de 4 marchas não é tão inadequado...

5 comentários:

Valdemar Cardoso disse...

O progresso traz coisas boas mesmo como mais marchas numa caixa automática, mas num carro pequeno não é lá tão vantagem ter que ficar trocando de marcha tanto quanto um motorista de carreta. Se voltassem a usar caixa de 4 marchas em carro novo seria até melhor. Já vi caminhões novos com caixa de 7 e de 8 marchas onde antes se usava de 12, e olha que com a carga que vai nos brutos seria até bom ter mais marcha, mas em carro pequeno não faz sentido mesmo.

Renan disse...

Já que Corolla é carro de velho mesmo, não faz tanto sentido ficar empurrando câmbio de 6 marchas para os tios que ainda querem manual. De qualquer jeito, se for para levar um carro desses pelo conforto faz mais sentido o automático mesmo.

cRiPpLe_rOoStEr a.k.a. Kamikaze disse...

Ainda mais agora que o Corolla tem câmbio automático CVT, oferecendo um bom conforto sem sacrificar tanto o desempenho e o consumo de combustível.

Mouhammad Ismayil disse...

Um primo meu que mora na Jordânia comprou um Passat já usado no Iraque, é um carro muito resistente.

Ariane disse...

Faria sentido se tivesse mais desse câmbio de 4 marchas mesmo, se na cidade dificilmente se usa todas as 5.

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