Originalmente lançado na Europa em 2011, e no Brasil só em 2014, o Volkswagen up! acabou sendo cercado de muita esperança em torno da possibilidade de que viesse a preencher a lacuna deixada por modelos como o Fusca e o Gol "bola" (desde o modelo original até as remodelações conhecidas como "geração 3" e "geração 4"). No entanto, uma série de fatores pesaram contra o up! ao menos no Brasil e dificultam que essa missão seja cumprida, sem que os mesmos representem efetivamente uma falha do projeto. De fato, algumas características do modelo contrastam com expectativas já tradicionais do público-alvo de modelos de entrada no Brasil, enquanto outras podem depender de interpretações um tanto subjetivas. Ainda assim, é possível destacar ao menos 5 possíveis motivos para o up! não ter se firmado como uma espécie de "sucessor espiritual" do Fusca.
1 - preço: embora o up! tenha vindo com a proposta de suceder versões mais antigas do Gol, hoje já é R$6300,00 mais caro que um Gol contemporâneo comparativamente equipado e portanto fica claro o desvio dessa estratégia inicial. Mas ao considerarmos também vendas corporativas, para as quais não se pode ignorar a importância do espaço interno para acomodar não apenas materiais de trabalho mas também eventualmente uma equipe que vá executar o serviço, e justamente nesse cenário ficou difícil para o up! ganhar espaço.
2 - muito "especializado" para o uso urbano: embora essa característica faça muita diferença tanto no mercado europeu quanto em grandes metrópoles brasileiras, onde o crescente volume de tráfego e a escassez de espaços para estacionar (principalmente em regiões centrais) são um problema cada vez mais evidente, o comprador de carro "popular" no Brasil tende a priorizar a versatilidade para atender também outras necessidades no momento de escolher um o veículo que às vezes vá se tornar o único à disposição de um núcleo familiar ou pequena empresa. Não que o up! seja inapto a trafegar também por rodovias, mas sem dúvidas o tamanho não parece tão convidativo a encher de bagagens e juntar a família toda para ir à praia num feriado prolongado...
3 - tração dianteira como qualquer outro "popular" de hoje: ao contrário do Fusca, que ao voltar à linha de produção entre '93 e '96 valia-se da tração traseira para tentar atrair uma parte do mercado que não abria mão de uma maior capacidade de incursão fora de estrada tão facilmente, o up! segue a mesma receita básica de motor dianteiro transversal com tração dianteira. Ironicamente, o primeiro conceito do up! apresentado em 2007 previa o uso de motor e tração traseiros, numa óbvia referência ao Fusca como um ícone entre os projetos de carros "populares". Apesar dos tempos serem outros, o Brasil ainda está longe de oferecer uma infraestrutura rodoviária comparável à da Alemanha e demais países desenvolvidos, e mesmo a versão com pretensões aventureiras cross up! está longe de ser vista como bruta o suficiente para enfrentar muitas das condições de rodagem severas que fizeram e ainda fazem do Fusca o compacto favorito de uma boa parte dos colonos por tanto tempo. E mesmo que a tração dianteira não chegue a ser um impedimento para atender às necessidades da população rural, como nos casos do Citroën 2CV na Argentina e mais recentemente do Fiat Uno no Brasil, não se pode negar que no Fusca a tração traseira favoreceu a concentração de peso próxima ao eixo motriz em diferentes condições de carga e assim garantindo uma capacidade de tração mais consistente em terrenos inóspitos.
4 - capacidade de passageiros: embora no Brasil seja homologado com 5 lugares já considerando o do motorista, na prática não é a melhor idéia trafegar com a lotação máxima do up! se o objetivo for preservar algum conforto para os ocupantes do banco traseiro, e assim faz mais sentido tratar como um carro de 4 lugares. Infelizmente, carros de 4 lugares estão longe de ser muito bem aceitos no Brasil, com uma rara exceção sendo a 1ª geração do Ford Ka cujo formato talvez até lembre o Fusca numa proporção que o up! não conseguiu igualar...
5 - apresentação ao público: embora muitos brasileiros reclamem da falta de segurança dos carros vendidos localmente em comparação aos similares estrangeiros, não se pode ignorar que esse acaba não sendo o aspecto mais relevante na aquisição do veículo. A plebe rude não dá muita importância à pontuação em crash-tests ou outros fatores que não saltam aos olhos fora de uma circunstância muito específica, e portanto uma central multimídia de qualidade duvidosa ou um acabamento de painel com um desenho mais pretensamente sofisticado podem atrair mais que uma estrutura corretamente dimensionada para evitar que o motorista e passageiros sofram ferimentos graves num acidente. Outro ponto que poderia ter sido melhor trabalhado pelos publicitários seria estabelecer referências mais claras à proposta utilitária do modelo, enfatizando aspectos práticos no uso cotidiano e talvez até explorando na medida do possível o fator nostalgia ao traçar um paralelo com o contraste que a chegada do Fusca causou num país mais acostumado às barcas americanas. Eventualmente até a primeira propaganda do up! veiculada na televisão, com um jingle baseado na música Girls Just Want To Have Fun da cantora Cyndi Lauper, tenha gerado antipatia ao up! por parte de um público mais conservador.
2 comentários:
Acho que o tamanho não deva ter sido o maior problema, pelo contrário, até uma solução mesmo. Quanto ao jingle, realmente era meio bobinho e cansativo de ouvir.
Cheguei numa concessionária da Volkswagen pensando em comprar um Up, mas pelo preço eu preferi um Gol mesmo.
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