domingo, 19 de junho de 2011

Veículos leves a (bio)diesel: o mercado brasileiro está de braços abertos


Os motores a diesel são famosos pela robustez e economia de combustível, mas ainda enfrentam alguns preconceitos. A fumaça considerada característica, mais opaca devido a material particulado em suspensão e de odor forte, por exemplo, é provocada mais pela baixa qualidade do diesel brasileiro e de falta de manutenção preventiva que por qualquer outro motivo - com o sistema de injeção mantido bem regulado já alivia tal efeito indesejado. E o funcionamento um pouco áspero, acentuado pelo som do motor, ainda hoje sofre uma grande oposição por parte de alguns consumidores, mesmo que outros tantos estejam ávidos por um fim das restrições jurídicas ao uso de diesel em carros para valer-se da maior eficiência - e cada vez mais compradores de caminhonetes e sport-utilities se rendam cada vez mais à redução proporcionada nos gastos com combustível, alguns até saindo de sedãs de luxo para aderir aos utilitários...


Ainda que a imagem de tais motores esteja associada a alguns modelos anteriores à proibição do uso de diesel em veículos leves (com capacidade de carga inferior a uma tonelada, exceto os 4X4 com reduzida ou veículos com capacidade de transportar o motorista e 9 ou mais passageiros), caminhonetes como a Saveiro e alguns Mercedes-Benz da década de 80 até o começo dos anos 90 que mesmo com esse tipo de motorização chegaram a ser oferecidos no mercado brasileiro, uma verdadeira revolução tecnológica fez com que se aproximassem da suavidade e potência específica mais associadas aos motores do ciclo Otto. Passando pelo uso mais freqüente do turbo e resfriador de ar da admissão (intercooler) até a injeção eletrônica do tipo common-rail, hoje em outros mercados é possível encontrar motores a diesel mais compactos e leves fazendo os mesmos trabalhos com mais economia e até melhorando o desempenho - um caso notável é o motor Fiat Multijet 1.3 de 90hp, o dobro do antigo 1.3 aspirado de injeção indireta e 45hp, igualando o 1.9 turbo oferecido no Marea, superando até o 1.7 turbo de 70hp ainda usado em algumas versões de modelos como o Fiorino destinadas à exportação. Isso para não falar do torque que chega a superar o de veículos a gasolina, álcool e/ou gás de cilindrada igual ou até mais elevada.



Um outro bom exemplo claro da evolução é visto ao tomar como referência o motor V6 a gasolina de 3.1L usado na antiga Chevrolet Lumina APV, que foi igualado em potência e superado em torque por ligeira margem pelo Multijet 1.6 de 120hp da Fiat. Houve uma época em que, visando agradar a mercados europeus, a minivan foi oferecida com o clássico motor Oldsmobile Quad-4 de 4 cilindros, 2.3L e 137hp a gasolina, tendo como alternativa um 1.9L turbodiesel que, apesar da potência (92hp) sensivelmente menor (mesmo não comprometendo a segurança e conforto ao dirigir), tinha um torque apenas um pouco mais favorável e que já é superado pelo Multijet 1.3 de 90hp atualmente oferecido pela Fiat em versões do Punto destinadas ao mercado argentino (e fabricadas no Brasil). Se o pequeno propulsor é capaz de mover com desenvoltura uma soccer-mom van certamente dá conta de uma grande variedade de modelos oferecidos no mercado brasileiro, de hatches compactos a sedãs executivos passando por pequenos utilitários como o Fiat Doblò, bastante usado como ambulância em cidades do interior do Rio Grande do Sul. Vale destacar que, apesar dos modernos sistemas de injeção eletrônica, continuam emitindo menos radiação eletromagnética que um similar do ciclo Otto devido à ausência de um sistema de ignição por faísca, reduzindo o risco de interferência em equipamentos eletrônicos como os usados em ambulâncias e hospitais.


Ainda há outra vantagem: motores a diesel não demandam alterações tão radicais para usar alguns combustíveis alternativos como o biodiesel ou mesmo óleo de fritura velho - e até o etanol pode ser usado, apesar de demandar algumas modificações um tanto extensas. Talvez uma presença maior de modelos leves a diesel no mercado brasileiro tivesse fomentado um programa sério de produção de biodiesel, como aconteceu com o ProÁlcool...

Como se pode ver, o mercado brasileiro tem espaço de sobra para veículos leves movidos a (bio)diesel, só falta interesse político para liberá-los para vendas localmente, visto que alguns já tem até fabricação brasileira...

terça-feira, 14 de junho de 2011

Considerações sobre os "cicloativistas" e acidentes com bicicletas

Com a grande repercussão da morte do presidente de uma grande indústria que durante a II Guerra Mundial obteve destaque no uso da biomassa como combustível para automóveis mas que hoje é mais conhecida pelos chuveiros e aquecedores de água elétricos, vale recordar que um assunto extremamente pertinente e vem sendo negligenciado é a segurança ao se conduzir uma bicicleta. Atropelado por um ônibus ontem, após perder o equilíbrio e cair, não dando tempo para o motorista do veículo coletivo frear e evitar o impacto, morreu logo ao dar entrada no Hospital das Clínicas de São Paulo. Através de rápida mobilização na internet, poucas horas depois do óbito, um grupo de "cicloativistas" organizou um ato político (apesar de ser classificado como "apartidário" não deixa de ter algum aspecto político) a título de "homenagem" ao empresário. Dessa vez, entretanto, eu não tive conhecimento de atos violentos praticados contra motoristas que tentassem trafegar pela via como aconteceu numa outra ocasião após a morte de uma conhecida "cicloativista", também atropelada por um ônibus.

Não é incomum nas grandes cidades brasileiras a existência de bicicleteiros que se intitulam "cicloativistas" e dizem defender o uso prático da bicicleta como instrumento de mobilidade urbana quando na verdade atacam o uso de veículos motorizados. Uma das ações que costumam fazer são "bicicletadas", quando saem em bando passando por ruas com grande movimento de veículos, gerando um transtorno ao trânsito enquanto desfilam em bicicletas que não raro custam mais do que uma motocicleta de baixa cilindrada ou um automóvel popular com mais de 10 anos de uso.

Recentemente, um funcionário público de Porto Alegre teve uma superexposição na mídia por ter atropelado um grupo de bicicleteiros que participavam da "massa crítica", que normalmente ocorre na última sexta-feira de cada mês. O grupo, que se inspirou na "critical mass" de Nova York, tem o hábito de ocupar todas as faixas de rodagem nas ruas por onde transitam, prejudicando não só os automóveis, que costumam classificar como um símbolo de "individualismo e opressão", mas também veículos de transporte coletivo. Ou seja, um trabalhador exausto depois de uma semana inteira de labuta vai ter que esperar mais tempo pelo ônibus para chegar à casa para o merecido descanso por causa de alguns veículos de transporte individual, mas que vem sendo promovidos por serem considerados ecológicos e, principalmente, "anti-consumistas". Chega a ser extremamente contraditório quando dizem que a bicicleta não estimula o "consumismo" quando alguns saem com aquelas roupas justinhas de competição e sapatilhas para pedalar bicicletas com quadro de fibra de carbono, repletas de peças de titânio, freios hidráulicos, lanternas de LED, uns aros especiais com pneus sem câmara para corrida (um único pneu desses em alguns casos chega a custar mais que 2 pneus para uma Honda CG 150, por exemplo) e umas campainhas barulhentas (criticam os motores dos automóveis tanto pela emissão de gases quanto pelo barulho, mas não pensam duas vezes antes de tocar a campainha em frente a uma clínica ou hospital), tal qual um "playboy" que sai de casa parecendo um manequim de loja da Nike para dar uma volta de carrão.

Já se tornou praxe em discursos desses bicicleteiros com pretensões políticas a alegação de que "respeito aos ciclistas" é mais importante que uma via segregada para a circulação de bicicletas, assim como é fácil ver alguns expondo pedestres ao risco de um atropelamento ao pedalar em velocidade excessiva pelas calçadas. Logo, por mais que tentem vilanizar o automóvel, é melhor segregar a circulação de bicicletas onde seja viável implantar uma ciclovia ou ciclofaixa devidamente sinalizada (preferencialmente com algum obstáculo físico) também para evitar que provoquem danos ao patrimônio ou integridade física de terceiros enquanto quiserem fazer das ruas um velódromo. Eu quando era mais novo nunca fiquei esperando que motoristas me "respeitassem" enquanto eu estivesse pedalando, não transferia a minha responsabilidade pela minha própria segurança aos outros tentando forçar a passagem em meio a veículos motorizados por excesso de confiança, nem ameaçava a integridade física de pedestres ao pedalar por calçadas quando não havia uma ciclovia ou ciclofaixa e o fluxo de veículos automotores estivesse alto a ponto de me causar medo - alguns "cicloativistas" mais fanáticos ou moleques exibicionistas me chamariam de covarde por não tentar "conquistar espaço na rua", mas eu prefiro ser julgado por 12 que carregado por 6 e tenho consciência de que não preciso exibir "coragem" para provar nada a ninguém.

Apesar de tudo, além de moleques que por causa da idade ainda não podem obter carteira de habilitação, não é difícil encontrar ciclistas cometendo abusos mesmo quando não são, necessariamente, "cicloativistas". Um depósito de água e gás na movimentada Avenida Osvaldo Aranha, além de motos, triciclos motorizados e uma pequena caminhonete, usa bicicletas para fazer entregas. Eu mesmo já escapei de ser atropelado por alguns entregadores usando o veículo não-motorizado. Em horários de pico é possível ver os "bike-couriers" trafegando pelas calçadas cheias de pedestres a uma velocidade superior à dos automóveis nas pistas...

sábado, 11 de junho de 2011

Quais seriam motivos plausíveis para preferir o uso de hub-motors no eixo traseiro de um modelo como o Toyota Prius ou o Ford Fusion Hybrid ao invés de acoplar um único motor elétrico ao transeixo dianteiro como se faz atualmente?

Uma das vantagens que vem sendo atribuída à tração elétrica é a possibilidade de se eliminar algumas perdas por atrito, justamente pelo uso dos hub-motors acoplados diretamente às rodas que se deseje tracionar, dispensando um sistema de transmissão tradicional que ainda acrescenta peso e complexidade de manutenção.

Ainda que em alguns casos usar 2 hub-motors no eixo traseiro possa representar um acréscimo de peso ligeiramente maior no veículo do que simplesmente acoplar um único propulsor elétrico à transmissão convencional usada no eixo dianteiro, passa a apresentar algumas vantagens tanto por diminuir a demanda por energia acumulada na(s) bateria(s) tracionária(s) durante os momentos em que a tração do veículo é realizada somente pelo sistema elétrico, devido à anulação de perdas por atrito já citada, como também na maioria dos casos em que se inicia a movimentação do veículo ocorre uma transferência de peso em direção ao eixo traseiro por ação da aceleração gravitacional, e tanto no Toyota Prius quanto no Fusion Hybrid e outros veículos que usam um layout similar no sistema de tração em baixas velocidades a atuação do motor elétrico é mais intensa.

Outro aspecto que eu considero de extrema relevância é a dirigibilidade em condições mais críticas de pavimentação e em aclives. Nessas circunstâncias, mesmo em velocidades mais altas seria adequado o auxílio da tração elétrica às rodas posteriores, tanto por reduzir o consumo do motor a combustão interna quanto por melhorar a segurança e estabilidade ao se dirigir na neve tão comum nos rigorosos invernos americano e japonês, por exemplo, e devido a uma transferência de peso mais acentuada em direção à traseira ao se enfrentar um aclive acaba havendo uma compensação pela redução da concentração de peso sobre o eixo principal de tração, melhorando tanto o consumo de combustível pelo motor principal quanto a dirigibilidade. E com todo o interesse de alguns setores políticos dos Estados Unidos em tornar obrigatório o uso de controle eletrônico de estabilidade nos veículos novos, não ficaria tão difícil ajustar os parâmetros que permitam regular com mais precisão o auxílio da tração elétrica em situações críticas...

terça-feira, 7 de junho de 2011

Híbridos: será que fazem mesmo tanto sentido?


Ainda que o conceito de tração elétrica num veículo equipado com motor a combustão interna já seja conhecido desde a época do Lohner-Porsche, produzido entre 1900 e 1905 usando hub-motors individuais em cada uma das 4 rodas (algumas versões mais simples tinham os motores elétricos apenas em duas rodas), só começou a se tornar um fenômeno mundial depois do lançamento do Toyota Prius, em 1997.

Ao contrário do modelo austríaco, que segue o conceito de híbrido seriado, no qual o motor a combustão interna atua exclusivamente como gerador a exemplo do Chevrolet Volt, o modelo japonês usa o que a Toyota chama de "tração híbrida sinérgica" (Hybrid Synergy Drive), em que a unidade também atua na tração do veículo, associada ao propulsor elétrico, mais conhecido por "híbrido paralelo", e bastante usado em outros modelos como o Ford Fusion Hybrid, oferecido até no mercado brasileiro apesar de não haver incentivos do governo a esse tipo de veículo como acontece no Equador, onde atualmente não se comercializa outra versão do sedã mexicano, e a Chevrolet segue a mesma estratégia com a Silverado.

Ao contrário do que alguns podem pensar, eu não me oponho totalmente aos híbridos, mas não vejo sentido em se fazer com que uma das vantagens do motor elétrico, a reversibilidade, não seja aproveitada quando se usa uma transmissão convencional para fazer a força motriz elétrica chegar às rodas devido ao peso extra e a geração de perdas por atrito. Assim, sou favorável ao uso dos hub-motors para tração elétrica, como no Lohner-Porsche original ou mesmo no sistema paralelo proposto pela Protean Electric para modelos como o Opel Vivaro.

No momento, o único automóvel híbrido disponível comercialmente que me parece fazer sentido é o Peugeot 3008 HyMotion4, também chamado de Hybrid4, em que o motor elétrico atua no eixo traseiro sem usar uma caixa de transmissão tradicional, enquanto a tração dianteira e a recarga da bateria do sistema híbrido ficam a cargo do motor 2.0 turbodiesel.
Outra vantagem poderia ser o uso de biocombustível (biodiesel) sem demandar tantas alterações, enquanto modelos como o famoso Prius ainda dependeriam de modificações para poder usar etanol ou biometano, por exemplo. Mas, devido a uma barreira jurídica arcaica, o modelo não pode vir ao mercado brasileiro por ser movido a diesel...

Diga-se de passagem, uma empresa de terceirização de frota importou de forma independente 5 Prii para o Brasil, destinando-os ao transporte de executivos.

Possivelmente o que pesou mais para a aquisição do modelo seja a aparência, que já indica tratar-se de um veículo que hoje é considerado um ícone de ecologia ao contrário do Ford Fusion e do Peugeot 3008 facilmente encontrados aos montes em suas versões convencionais, mesmo que tal argumento possa estar sujeito a algumas ponderações.

Além do custo de aquisição superior a um modelo mais tradicional, a composição química das baterias é um ponto polêmico: enquanto atualmente as caras baterias de lítio-ferro-fosfato são a menina dos olhos da indústria, o níquel-hidreto metálico ainda é largamente utilizado, bem como outros compostos à base de metais como chumbo, cádmio e mercúrio em veículos de tração elétrica mais antigos ou naquelas scooters elétricas chinesas que estão sendo importadas em grande quantidade. No caso de um acidente podem acabar vazando e gerar contaminação de solo e lençol freático, ou num incêndio emitir mais vapores tóxicos. Ainda há a questão da reciclagem de baterias, ainda um processo caro e que pode ser considerado perigoso. Isso para não falar de outra quantidade de e-waste proveniente dos módulos e painéis de controle dos sistemas híbridos. Não que um automóvel convencional seja livre de e-waste nesses tempos atuais em que o carburador vem sendo relegado às motocicletas, mas já o reduz durante o descarte. O mesmo vale para a bateria. Quanto ao consumo de combustível durante a vida útil, uma boa resposta está no (bio)diesel...

Devido à falta de opções de modelos leves a diesel no mercado brasileiro, um veículo que tem alguma aceitação entre os entusiastas desse tipo de motor é o Suzuki Vitara, que não sofre restrições jurídicas aos mesmos por ter tração 4X4 com reduzida. Não é incomum encontrar relatos de exemplares do utilitário alcançando médias de consumo de 18km/l no trânsito urbano e 20km/l na estrada ao se adaptar o obsoleto motor Volkswagen 1.6D de 50cv que equipava a Kombi Diesel e versões de exportação do Passat, Gol, Parati, Saveiro e Voyage nas décadas de 80 e 90, e certamente não seria impossível melhorar esse consumo ao se usar motores mais modernos como o 1.4 TDI atualmente disponibilizado em versões do Fox destinadas ao mercado europeu, podendo até igualar os cerca de 21km/l da atual geração do Prius em trânsito urbano e superar com folga os 20km/l que o híbrido faz na estrada.
Um tio meu chegou a ter um Vitara convertido para diesel, e com o combustível brasileiro de péssima qualidade o consumo em tráfego urbano era o mesmo de um Lexus CT 200h rodando com gasolina de primeiro mundo, e mais econômico em uso rodoviário. Ou seja, apesar do coeficiente aerodinâmico pior e de  ser mais "arcaico", pode-se dizer sem falsa modéstia que um Vitara a diesel é mais ecológico que uma grande quantidade de modelos híbridos hoje tão enaltecidos...

Curiosamente, a grande maioria dos híbridos paralelos tem um consumo pior em estrada, mesmo rodando mais "soltos". Isso se deve ao fato do sistema de tração elétrica ser normalmente usado apenas no trânsito urbano em baixas velocidades ou para auxiliar em arrancadas, no momento de vencer a inércia. Na prática, acabam tornando-se um peso morto em altas velocidades. Logo, não podem representar adequadamente toda a visão quase "messiânica" que se tem dos mesmos...

Aos que argumentam as "vantagens incontestáveis" da assistência elétrica de tração para os veículos com motores do ciclo Otto (na maioria dos híbridos atualmente disponíveis no mercado é comum se referirem aos motores como sendo do ciclo Atkinson pelo fato das válvulas de admissão ficarem abertas um pouco mais de tempo, aliviando a compressão para reduzir "perdas por bombeamento"), e que apontam o torque pleno dos motores elétricos desde o zero, o torque em baixas rotações dos motores a diesel e a redução de peso devido à ausência de pesadas baterias tracionárias já é de grande valor, e no anda-e-para constantemente enfrentado no tráfego pesado das principais cidades um sistema start-stop, curiosamente chamado por algumas fábricas de automóveis como a Mahindra e a Porsche de "sistema micro-híbrido" reduz as emissões nessa situação sem prejudicar o desempenho em vias com maior fluidez.

Sem sombra de dúvidas, é possível dizer que, dentro do atual cenário, não basta um veículo ser "híbrido" para realmente ser ecológico. Há que se explorar, além da tecnologia para racionalizar mais o uso de recursos energéticos tradicionais como o petróleo, outras fontes realmente limpas a partir da biomassa. E nisso eu ainda me posiciono favorável ao biodiesel como uma resposta mais viável do ponto de vista prático e imediato do que os ainda bastante caros híbridos.

quarta-feira, 1 de junho de 2011

Turbo: do descrédito à esperança

Já faz algum tempo que o turbo é conhecido dos adeptos dos motores a diesel, e a ele é creditada a verdadeira revolução nesses que antes eram considerados essencialmente uma ferramenta agrícola e hoje dominam alguns mercados automotivos como a Alemanha. Mas ainda divide opiniões quanto à aplicacão em motores movidos por outros combustíveis, geralmente operando no ciclo Otto.

Cultuado por entusiastas do automobilismo, desprezado durante décadas por profissionais da indústria automotiva mas hoje considerado a salvação nesses tempos de downsizing, o turbocompressor (ou simplesmente turbo) vem experimentando um momento de grande prestígio até em segmentos onde antes era visto como um mero improviso ou gambiarra. Por aproveitar energia cinética expulsa junto com os gases do escapamento para impulsionar mais ar na admissão, acaba sendo visto como uma forma de se ter um processo de combustão mais completo e eficiente, gerando melhor desempenho e menor emissão do monóxido de carbono, gás letal (chegou a ser usado como veneno pelos nazistas) e mais poluente que o dióxido de carbono. Foi-se o tempo em que um sedã executivo, por exemplo, precisaria de um motor de no mínimo 2.0L para ser considerado um carro "de respeito", quando hoje com todo o desenvolvimento de uma "consciência ambiental" um motor 1.4L com turbo acaba conquistando um espaço nesse segmento. Ainda está um tanto longe da realidade brasileira, na qual apenas o Fiat Linea conta com tal opção (e ainda assim numa versão com pretensões mais esportivas, longe de ser levada a sério num mercado mais formal - não conta nem com o câmbio Dualogic como opcional enquanto o 1.8L sem turbo o oferece), mas em outros mercados mais desenvolvidos até modelos com um porte maior como o Opel Insignia (que compartilha a plataforma com o Chevrolet Malibu) são equipados com esse tipo de propulsor. Vale destacar que, por exemplo, no mercado português o Insignia não está sendo oferecido com nenhum motor aspirado para as versões wagon (Sports Tourer).

Alguns consumidores, no entanto, ainda associam o turbo aos rachas de rua, ilícitos no Brasil, bem como a uma lentidão a baixas rotações, fenômeno conhecido como turbo-lag e que era mais difícil de se contornar nos tempos em que o carburador era a majestade. Hoje, porém, com diversos controles eletrônicos de injeção e ignição, é possível reduzir os efeitos do turbo-lag desde o momento em que se dá a partida no motor, para que o turbo já fique "cheio" mais cedo. Ainda deve ser lembrado que um turbo com tamanho proporcional ao motor e adequado à faixa de rotação faz com que o turbo-lag seja menos sentido, principalmente agora quando já existem ainda os turbocompressores de geometria variável, em que a posição das palhetas é alterada de acordo com as rotações do motor e da pressão dos gases de escapamento passando dentro da própria carcaça quente do turbo para que "encha" mais rápido.

Talvez o consumidor brasileiro ainda tenha algum receio com o turbo devido à forma como o mercado local ficou restrito tanto devido às circunstâncias de uma economia mais fechada durante o regime militar quanto pela péssima qualidade da gasolina obrigarem ao uso de motores com taxa de compressão mais baixa para evitar as "batidas de pino", inviabilizando, por exemplo, o uso de motores mais compactos em alguns carros nacionais das décadas de 70 e 80. Um caso notório é o "Dodginho" 1800/Polara, baseado no Hillman Avenger britânico. Enquanto na terra do chá das cinco usava motores de 1.2L e 1.5L, aqui acabou com um de 1.8L. E com o advento do álcool acabou surgindo outro mito: de que tal combustível era o único que suportava adequadamente o uso do turbo, tanto que até hoje não é difícil encontrar mecânicos que defendam o mesmo com unhas e dentes, devido à maior facilidade de se acertar um motor turbo devido à octanagem superior do combustível vegetal o tornar menos propenso a falhas quando atingida a temperatura ideal de funcionamento, e essa "cultura" faz com que muitos bons profissionais venham a ser considerados "amadoristas" e "relaxados" por trabalhar com turbo. Vale destacar que na Argentina o "Dodginho" chegou a usar o motor 1.5, ainda que com uma taxa de compressão diferente do similar europeu, mas não tão baixa quanto o modelo brasileiro.

Outro caso que pode ser analizado sob tal perspectiva é o Ford Sierra, de tamanho próximo ao Maverick e que em alguns mercados como o argentino chegou a usar o motor Georgia 2.3L OHC fabricado em Taubaté compartilhado com o próprio Maverick e que chegou até a ser exportado para os Estados Unidos em versão turbo com injeção eletrônica Holley, cujo uso no mercado brasileiro estava vetado devido à Lei da Informática, reservando o mercado para produtos de fabricação local - tal opção poderia ter dado uma boa sobrevida ao Landau, por exemplo. Mas a oferta de propulsores para o Sierra em outros mercados chegava a incluir até mesmo alguns motores que por aqui ficariam restritos a modelos como o Escort e o Corcel, como o 1.3L que por vários anos foi beneficiado por uma tributação mais favorável no mercado sueco, que levou a concessionária Stockmann a oferecer um kit turbo para o mesmo, fazendo com que viesse a ter um desempenho comparável ao 2.0L aspirado então oferecido em versões superiores. Curiosamente, algumas empresas brasileiras como a Larus chegaram a comercializar kits turbo para modelos de fabricação argentina como o próprio Sierra, o Renault Fuego e os clássicos Peugeot 504 e 505.

Caso semelhante ocorreu entre 2001 e 2004 no Brasil quando a Volkswagen passou a comercializar o Gol e a Parati com um motor 1.0 turbo de potência semelhante ao 2.0 aspirado (ainda que com torque ligeiramente inferior), que acabou fazendo com que o 1.6 aspirado movido somente a gasolina acabasse saindo de cena por um breve momento. E a própria Ford chegou a usar o supercharger (popularmente conhecido como "blower") no motor Zetec RoCam 1.0L para os mercados brasileiro, venezuelano e colombiano entre 2002 e 2005, no Fiesta e no EcoSport (no qual tal motorização foi restrita ao mercado brasileiro devido à tributação diferenciada), usando na Colômbia e na Venezuela um argumento publicitário atribuindo "esportividade" ao compressor mecânico, mesmo quando o motor 1.6 aspirado tinha desempenho um pouco melhor (e o uso do turbo poderia trazer mais benefícios ao 1.0 por aproveitar uma energia desperdiçada ao invés de tomar força motriz para ser acionado como o blower).

E atualmente o turbo vive outra vez um bom momento. Com toda a repercussão de assuntos ligados à ecologia, vem sendo apontado como a solução mais fácil para reduzir a curto prazo a emissão de poluentes em automóveis com motor do ciclo Otto, tanto a gasolina quanto a álcool ou combustíveis gasosos como o GNV amplamente usado no Brasil (ainda que existam mitos acerca de seu uso em motores com turbo, principalmente devido à ainda grande penetração dos "kits aspirados" ou "torneirinha" no mercado brasileiro de conversão para GNV) ou o gás liquefeito de petróleo que por aqui é proibido para fins automotivos mas amplamente usado em países como Japão (em que a oferta de motores turbo abrange desde os kei-jidosha com seus motores de 660cc e desempenho semelhante aos 1.0 brasileiros até alguns superesportivos de prestígio como o Nissan GT-R), Hong Kong, Itália, Austrália e mesmo nos Estados Unidos. Não só pela combustão mais eficiente, como também pela possibilidade de um motor menor desempenhar o mesmo serviço que outro eventualmente com mais do que o dobro da cilindrada. Um caso que me parece particularmente interessante para se analizar é a tradicional pickup americana Chevrolet Silverado/GMC Sierra, que nas versões básicas conta com um motor 4.3L V6 de 195HP de potência a 4600RPM e 36kgf.m de torque a 2800RPM, enquanto a própria Chevrolet chegou a oferecer em alguns modelos médios como o Cobalt e a HHR um motor 2.0L de 4 cilindros turbo com injeção direta, 260HP a 5300RPM e os mesmos 36kgf.m já a baixos 2000RPM - está certo que aí entra um aspecto "cultural" da terra do Tio Sam, lar de entusiastas de grandes motores, e a agência responsável por estabelecer limites de emissões para os veículos, a EPA, está infestada de burocratas que não estão assim tão comprometidos com a proteção ambiental. O que me interessa nesse caso específico é que a fábrica de motores da Chevrolet em Sào José dos Campos atualmente produz motores 2.0 turbo para exportação, e tal propulsor cairia como uma luva na Blazer, amplamente usada por forças policiais, e onde o motor V6 é ainda hoje cultuado pelo desempenho invejável e que depois de ter sido retirado do catálogo da Blazer brasileira ficou sem um substituto à altura. Mas apesar de uma resistência inicial de alguns consumidores a usar um motor significativamente menor, a arqui-rival Ford até está tendo algum sucesso com a linha Ecoboost de motores turbo, podendo servir de pretexto para a gigante GM contra-atacar. Vale destacar que a GM tem uma experiência considerável com a aplicação do turbo, oriunda tanto dos tempos em que controlava a divisão automotiva da SAAB quanto pelo uso do sistema em modelos da Opel e da Isuzu, atualmente parceira no projeto de pickups médias, e que em alguns mercados usa a rede de vendas e assistência técnica da tradicional empresa americana para comercializar caminhões.

Ainda que algumas desconfianças ainda o rodeiem, o turbo vem cada vez mais aparecendo como uma solução bastante adequada para atender a um mercado consumidor amplo e diversificado a nível mundial, podendo contribuir até com uma redução no custo operacional das empresas fabricantes de automóveis ao viabilizar o desenvolvimento de um design mais compacto a alguns veículos (criando uma barreira menor à resistência do ar e melhorando ainda mais o desempenho e consumo) que passam a abrigar motores menores  e ainda possibilita um ganho na escala de produção, ao tornar possível que um mesmo propulsor com diferentes estágios de preparação possa estar adequado a atender aos consumidores de veículos de diversas classes, desde um pocket-rocket a um sedã executivo médio, passando por um veículo utilitário-esportivo ou uma caminhonete de trabalho.