sexta-feira, 25 de julho de 2014

Triciclos: prejudicados pela arrogância brasileira

Houve um breve momento em que triciclos utilitários pareciam destinados a se tornar um grande sucesso no mercado brasileiro já a partir de 2007, ganhando força após o impacto global da crise hipotecária americana de 2008, mas que começou a esfriar um pouco a partir de 2010. Nesse meio-tempo, uma infinidade de triciclos chineses foram importados regularmente, além de muitas conversões semi-artesanais baseadas em motocicletas de baixa cilindrada, principalmente a linha Honda CG 125/150, na quase totalidade orientados ao transporte urbano de cargas fracionadas.
O custo operacional é um forte atrativo dos triciclos, aproximando a economia de uma motocicleta à capacidade de carga de um automóvel compacto, além da boa manobrabilidade em espaços cada vez mais confinados em função do pesado volume de tráfego nas principais cidades.
É impossível negar que em modelos de cockpit aberto há algumas desvantagens, principalmente pela exposição do condutor a condições climáticas e ambientais mais severas, e outros fatores que possam gerar alguns riscos, incluindo objetos que possam ser arremessados de forma intencional ou acidental em direção ao condutor e provocar a perda de controle do veículo. Em alguns modelos até há um teto e um fechamento frontal, mas as laterais totalmente abertas devido ao posicionamento do motor e do tanque de combustível fazerem necessária uma menor restrição à circulação de ar pelo interior da cabine.

Entre as décadas de 50 e 60, chegou a haver algum interesse por triciclos de cabine fechada no Brasil, tendo como principais destaques os modelos Lambrecar, baseado no Innocenti Lambro italiano e equipado com motor da Lambretta, e o Vespacar, que usava o motor da Vespa e era baseado no também italiano Piaggio Ape. Além da notável contribuição que deram à reconstrução da Itália após a 2a Guerra Mundial, os modelos serviam bem às condições operacionais da época e já se destacavam pela economia de combustível mesmo antes que esse ponto se tornasse uma prioridade absoluta, ainda que a velocidade máxima numa faixa de 60km/h acabasse desencorajando percursos rodoviários por mais breves que fossem, e ainda podem atender com alguma desenvoltura ao serviço em cidades como Porto Alegre onde mesmo as principais avenidas ainda tem o limite de velocidade especificado em 60km/h. No caso específico do Lambrecar da foto acima, o modelo fabricado em '62 foi resgatado pelo atual proprietário em '79 num ferro-velho, situação um tanto irônica ao considerar que naquele momento ainda se vivia o impacto das crises do petróleo, e desprezar um triciclo utilitário que apresenta médias de consumo menores do que qualquer automóvel de concepção tradicional da época não parecia uma opção muito sensata...
Entre 2001 e 2004, houve uma tímida tentativa de introduzir outro modelo similar ao Piaggio Ape no mercado nacional, dessa vez com a Kasinski importando da Índia algumas versões modificadas do triciclo Bajaj FE2S, substituindo o motor 2-tempos de 150cc pelo 4-tempos de 175cc que equipava o modelo RE4S de motor traseiro destinado ao transporte de passageiros, que também chegou a ser importado mas em menores quantidades que as versões cargueiras.
Considerando a inegável importância que os triciclos tiveram para a reconstrução da Europa no pós-guerra, bem como a economia operacional que os torna uma alternativa adequada às condições econômicas e sociais da Índia e também os posiciona como uma opção eficiente para atender à demanda da China por veículos motorizados de baixo custo e fácil manutenção, chega a ser intrigante que o grande público brasileiro atualmente os veja com ceticismo, e até alguma arrogância por parte dos críticos de plantão...
Não é incomum que as motocicletas sejam percebidas como algo "inferior" a um automóvel, e por extensão a mesma imagem acaba associada aos triciclos, mesmo que já tenham provado grande versatilidade e aptidão a diferentes condições operacionais e levado a Europa a se reerguer. Um país com condições econômicas e sociais tão críticas quanto as do Brasil não deveria se dar ao luxo de direcionar um olhar de desprezo a esses veículos.
No caso específico de Porto Alegre, a aplicação mais usual é a distribuição de água engarrafada e botijões de gás GLP, e até se vê uma quantidade razoável de modelos semi-artesanais nesse serviço entre os bairros Auxiliadora, Bom Fim, Floresta e Moinhos de Vento.

Cabe mencionar, ainda, o caso de algumas empresas que contam em suas frotas tanto com motos quanto com furgonetas convencionais de 4 rodas, como é o caso dos Correios. Em algumas operações a motocicleta se mostra ideal, tanto pela manobrabilidade em espaços mais restritos quanto pela economia, enquanto outras podem exigir uma capacidade de carga mais próxima à de um utilitário tradicional, e um triciclo poderia se encaixar perfeitamente para atender essa necessidade.
Além dos aspectos práticos, vale destacar argumentos de cunho ecológico que podem ser usados em defesa dos triciclos nessa comparação: além do consumo de combustível mais contido, também deve ser levada em consideração a menor quantidade de materiais a serem empregados tanto na fabricação do veículo quanto para peças de reposição que se façam necessárias durante a vida útil operacional, bem como a energia necessária para os processos de beneficiamento desses materiais, ao mesmo tempo que a simplicidade mecânica é mantida. Outro tópico relevante é quanto à refrigeração do motor: normalmente ainda se usa muito a refrigeração a ar, dispensando fluidos de arrefecimento, mangueiras e uma bomba d'água que acaba impondo uma pequena carga parasitária sobre o motor ainda que praticamente irrisória, e mesmo no caso de modelos que usem motor de refrigeração líquida normalmente o volume de fluidos necessário é menor.
Relembrando uma conversa recente entre eu e o meu amigo Kiko Molinari, do blog CarrosRarosBR, nós levantamos mais um ponto que reforça a hipótese da arrogância brasileira prejudicar comercialmente os triciclos. Não é incomum que sejam feitas referências depreciativas ao Uruguai quando se comenta sobre a Revolução Farroupilha e algumas idéias separatistas que ainda encontram entusiastas no Rio Grande do Sul, como quando professores de História dizem que um Rio Grande do Sul independente se tornaria "mais um Uruguai" ou uma "republiqueta agropastoril" e dando como exemplo o país vizinho.
Diga-se de passagem, por lá os triciclos utilitários tem grande popularidade, e além de alguns modelos que ainda preservam o posto de condução num padrão mais motociclístico já se encontram outros com cabine fechada e comandos no padrão automotivo.
Além do preço favorável, as médias de consumo de gasolina na faixa de 25km/litro atraem uma parcela significativa do público, principalmente após a imposição de restrições ao uso de motores a diesel em veículos leves de forma semelhante ao que ocorre no Brasil. Enquanto isso, do lado de cá da fronteira a prioridade é ostentar, e muitos que poderiam se servir de um triciclo acabam os tratando como mera curiosidade enquanto se dividem entre o carnê do financiamento de uma pick-up compacta tradicional e a conta do posto de combustível...

domingo, 20 de julho de 2014

Riquixá em Porto Alegre

Um veículo de propulsão humana muito tradicional na Ásia, muito estereotipicamente associado à Índia e à China e também presente no sudeste asiático em países como a Indonésia e as Filipinas onde é mais conhecido como "pedicab", mas em vias de extinção, o riquixá acaba por atrair ao menos alguns olhares curiosos. O modelo das fotos, ao que tudo indica, foi trazido da Indonésia, mais especificamente de Bali, e estava exposto numa loja de artigos de decoração nas imediações da Praça da Encol.

O modelo conta com um farol alimentado por um magneto movimentado pela roda dianteira, e portanto só funciona enquanto o veículo estiver em movimento.

O farol tem uma chave que permite ser desligado durante o dia, mesmo que o magneto esteja permanentemente ligado à roda dianteira. O assento do condutor fica apoiado em molas para atenuar impactos e vibrações.

O esmerado trabalho de metalurgia se nota também em detalhes como o enfeite em forma de pássaro e a armação da capota.

sábado, 19 de julho de 2014

Parachoque de impulsão: um acessório controverso

Um daqueles elementos que surgiu com uma função mas passou a ser mais apreciado pela forma, o parachoque de impulsão, também conhecido como "quebra-mato", serve basicamente para proteger a frente do veículo de pequenos danos enquanto algum obstáculo fosse impulsionado para fora da trajetória a ser percorrida, e mais adequado a veículos de porte mais avantajado como uma Blazer ou uma D20.

Porém, acabou virando mais uma modinha, influenciado pela popularidade em utilitários-esportivos que se tornaram símbolo de status no país, e hoje se vê até hatches "populares" como Fiat Uno e Celta com o equipamento. Às vezes, não são lá tão robustos como os que são usados em caminhonetes, mas ainda assim há controvérsias devido à interferência que podem provocar na absorção de impactos em caso de acidente, considerando que a estrutura dos modelos mais básicos não prevê pontos adequados para a fixação desse tipo de estrutura externa. No caso do Celta, a própria Chevrolet ofereceu o equipamento como parte do já extinto "kit Off-Road".

No tocante à segurança, criaram-se alguns mitos quanto a uma maior proteção que o parachoque de impulsão poderia proporcionar em veículos com posto de condução avançado e basicamente nenhuma zona de deformação programada para absorção de impactos, caso da Kombi e de caminhões de cabine avançada como o Daihatsu Delta, mas na prática se não for bem ancorado no chassi os benefícios se revelariam nulos.

Há até quem considere os parachoques de impulsão algo "brega" e que só pelo aspecto visual discutível deveria ter o uso e especificações disciplinadas, e outros que apontam os riscos do agravamento de lesões em casos de atropelamento, e realmente é um tema que deve ser tratado com alguma seriedade.

Desde 2002 a União Européia vem impondo restrições ao uso de parachoques com superfícies metálicas aparentes, e o que parecia ser o fim do quebra-mato foi contornado. Modelos como o Land Rover Discovery 4 da foto acima tem a opção por parachoques de impulsão devidamente homologados pelo fabricante, e com revestimento em material plástico que acabam por absorver melhor alguma parte do impacto em caso de colisões com outros veículos ou em atropelamentos, diminuindo a intensidade dos danos. No entanto, em alguns países como a Inglaterra, ainda há lacunas na legislação que permitem o uso de parachoques com superfície metálica desde que tenham suporte para guincho, os chamados "winch bumpers" como o usado no Land Rover Defender abaixo.

Como a maioria dos veículos comercializados no Brasil é derivado de plataformas homologadas na União Européia, seria até mais fácil seguir os padrões europeus mesmo. Um exemplo a ser analisado é o Ford Fiesta Trail: o pacote de acabamento com inspiração num estilo soft-roader oferecido na 5a geração do hatch compacto teve inicialmente um parachoque de impulsão tubular, mas posteriormente passou a adotar uma simples moldura decorativa apenas pelo aspecto visual, mas que acabava sendo mais adequada ao projeto original por não interferir de forma prejudicial na absorção de impactos, nem no acionamento do airbag.

A própria Ford já chegou a ter problemas com consumidores do Ecosport de 1a geração em função do uso de parachoques de impulsão, contra-indicados explicitamente pelo fabricante mas ainda comercializados como "acessórios originais" em concessionárias. Em alguns casos, o airbag não disparou em caso de colisões, e tanto a Ford quanto algumas concessionárias que vendiam os equipamentos chegaram a ser acionadas judicialmente.

Mesmo a Fiat, que iniciou o modismo dos soft-roaders no Brasil com a Palio Adventure, deixou de lado os parachoques de impulsão.

Portanto, além de ponderar as prioridades entre forma e função, é importante também refletir se um parachoque de impulsão é mesmo adequado ao veículo ou teria efeitos mais prejudiciais que benéficos.

sexta-feira, 18 de julho de 2014

Momento nostalgia: modelos clássicos da Yamaha Ténéré

Yamaha XT 600 Z Ténéré '88-'91 (BR: '90-'93): lançada nos principais mercados mundiais em '88, incorporava uma carenagem parcial e paralama dianteiro mais rente à roda, em oposição à série anterior introduzida em '83 com paralama dianteiro alto e uma minicareganem para o farol e levemente atualizada para '86. Curioso notar que o ciclo de evolução da Ténéré brasileira acabou se mantendo defasado em 2 anos diante da similar estrangeira.
Com um motor monocilíndrico refrigerado a ar de 595cc com carburador, partida elétrica, 4 válvulas com comando simples no cabeçote, potência de 42cv e torque de 5,1kgf.m, o desempenho era bastante satisfatório, indo de 0 a 100 km/h em 7,5 segundos e alcançando 158km/h de velocidade máxima. O amplo tanque de gasolina com capacidade para 24 litros proporcionava boa autonomia, tornando-a uma excelente opção para longas viagens e expedições, e o farol dianteiro duplo ajudava a proporcionar uma boa visibilidade.
A versão brasileira, além de 4cv a menos em função da gasolina de qualidade inferior usada no país, tinha freio traseiro a tambor ao invés de disco como os modelos estrangeiros, embora mantivesse ao menos o disco dianteiro. Foi substituída pela XT 600 E '93-2005, de aparência mais "magra" com tanque de 14 litros, paralama dianteiro alto, farol simples e freio a disco nas duas rodas.

Yamaha XTZ 750 Super Ténéré: lançada nos principais mercados mundiais em '89, veio para o Brasil apenas como importada. Permaneceu em produção até '98.
O motor de 2 cilindros paralelos e 749cc com 2 carburadores incorporava refrigeração líquida, 5 válvulas por cilindro com comando duplo no cabeçote (DOHC), gerando 70cv e 6,8kgf.m, que a faziam chegar nos 196km/h de velocidade máxima. O tanque de combustível comporta 26 litros.
Apesar do projeto antigo, o modelo ainda é uma das melhores referências entre todas as big-trail já produzidas...