sábado, 24 de novembro de 2012

Diesel: não faltam razões para liberar o uso

Não é de hoje que os motores do ciclo Diesel revelam-se uma alternativa tecnicamente superior, conciliando bom desempenho com economia de combustível. A maior aptidão a enfrentar ambientes severos também agradava, sobretudo aos proprietários de utilitários-esportivos, como o Isuzu Bighorn. A curva de torque, mais farta desde regimes de rotação mais baixos, de certa forma tornavam menos sensível a menor potência em comparação com um motor do ciclo Otto na mesma faixa de cilindrada, proporcionando uma boa dirigibilidade.

Em inúmeros casos, mesmo um Diesel com cilindrada ligeiramente menor já se mostrava mais adequado, como ocorria com as primeiras Chevrolet D-20, cujo motor Perkins 4-236 (também conhecido como Q20B) de 3.9L prevaleceu sobre o Stovebolt Six de 4.1L da C-20 e da A-20, respectivamente nas versões a gasolina ou etanol.

Hoje, a forte presença do turbocompressor em motores Diesel fez com que mesmo uma diferença de cilindrada quase 50% maior não representasse uma desvantagem tão significativa em comparação a um 4-tempos a gasolina, colaborando ainda para uma diminuição no acréscimo de peso inerente às motorizações Diesel. Assim, um turbodiesel Mercedes-Benz de 4.3L usado num microônibus com PBT de 9 toneladas na faixa dos 150cv não seria uma má opção para suprir a lacuna deixada na linha da Chevrolet Suburban a partir do ano 2000, quando passou a contar apenas com opulentos motores V8 a gasolina (e posteriormente alguns flex) entre 5.3L a 6.0L (posteriormente ampliado para 6.2L) culminando num big-block de 8.1L.
Convém recordar as infelizes restrições que limitam o uso do óleo diesel aos "veículos utilitários" definidos arbitrariamente em função de capacidade de carga (igual ou superior a 1000kg), tração (4X4 com reduzida) ou capacidade de passageiros (9 além do motorista), mesmo que alguns modelos como a supracitada Suburban acabem tendo o mesmo perfil de utilização de um suntuoso Ford Landau, que com o motor Windsor 302 V8 de 5.0L dificilmente supera os 4km/l em tráfego urbano.
Alguns exemplares do sedan full-size repotenciados no Uruguai com o motor Isuzu 4JB1 de 2.8L, segundo relatos de proprietários, chegam facilmente a 9km/l na cidade - enquanto com o motor original dificilmente supera os 8km/l na estrada...

Mesmo para o consumidor de carros populares, o Diesel também seria uma boa opção a se considerar. Mesmo que o custo de aquisição seja um fator crucial, levando sistemas mais primitivos como injeção indireta a uma sobrevida no mercado em países onde é permitida a comercialização de carros de passeio movidos a óleo diesel, apresenta resultados comparáveis com os híbridos no tocante à economia de combustível, a um preço significativamente menor.

O uso de motores Diesel também é um bom pretexto para o fomento à atividade agroindustrial, considerando a possibilidade de usar óleos vegetais como combustível, provenientes de diversas matérias-primas como a mamona, que cresce facilmente mesmo em solos empobrecidos sem requerer a abertura de novas fronteiras agrícolas. Além de manter um saldo de emissões favorável, em virtude da reabsorção de compostos pós-combustão durante o crescimento das oleaginosas, é uma boa alternativa para fazer frente à tirania dos sheiks do petróleo.

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Câmbio automático em veículos pesados: uma boa opção para melhorar a produtividade

Velhos estereótipos associando caminhões e uma condução muito difícil estão em vias de se tornar menos presentes. Se antes predominava a extrema rusticidade em modelos lendários como o Scania "jacaré", hoje há um nível de sofisticação mais apurado nos modelos de concepção mais recente, e alguns já oferecem equipamentos que os colocam no mesmo nível de conforto de um bom sedan de luxo.
O que alguns ignorantes classificariam como "frescura", como controles de tração e estabilidade, freios a com ABS, suspensão a ar e faróis de xenônio tem apresentado resultados significativos no tocante à segurança, mas não pode-se esquecer do conforto: ar condicionado (ou mesmo um simples climatizador evaporativo) e uma melhor ergonomia do cockpit proporcionam uma significativa redução do desgaste físico do operador, fazendo com que se mantenha um maior nível de atenção às condições da estrada, favorecendo as práticas de direção defensiva.

Outro equipamento que agrega significativas vantagens ao conforto é o câmbio automático e, apesar de alguns preconceitos relacionados à manutenção vem se mostrando bastante adequado aos mais distintos cenários operacionais. Ainda que provoque alterações no consumo de combustível (atenuadas com novos desenvolvimentos em sistemas de gerenciamento, terrain response e bloqueio do conversor de torque), tem intervalos de manutenção mais espaçados e com procedimentos de menor complexidade. Ao invés de usar uma embreagem convencional, que torna necessário remover o câmbio para trocar o disco (material de atrito), rolamento e em alguns casos até o platô, o acoplamento de um câmbio automático ao motor normalmente é feito por meio de um conversor de torque hidráulico, cuja substituição do fluido (ATF - Automatic Transmission Fluid) é muito mais rápida, o que também representa um custo menor de mão-de-obra. Convém lembrar que o acoplamento hidráulico apresenta uma maior precisão, favorecendo a operação em ambiente urbano com tráfego intenso associado a uma maior frequência nas mudanças de marcha e regiões com topografia mais irregular que exijam um melhor gerenciamento do torque. Tal fator levou a uma significativa aceitação do câmbio automático também em ônibus urbanos.
É interessante destacar o caso dos ônibus articulados: recentemente o câmbio automático passou a ser obrigatório em todos os chassis produzidos para esse tipo de veículo. Convém recordar que o melhor gerenciamento do torque promove um menor desgaste mecânico.

Um segmento que seria particularmente beneficiado pela aplicação do câmbio automático em veículos pesados é o de veículos de emergência, como viaturas de bombeiros: eliminando o risco de algum eventual erro do condutor durante mudanças de marcha em deslocamento emergencial, ganha-se em agilidade na resposta aos chamados. Os menores e mais espaçados intervalos de manutenção também devem ser recordados, visto que a viatura permanece em condições operacionais por mais tempo.

Em operações rodoviárias, tem despontado uma alternativa de custo inicial mais baixo, que conjuga algumas vantagens do câmbio automático a uma menor complexidade técnica, os câmbios automatizados, ou AMT (Automated-Manual Transmission). Baseadas em câmbios manuais convencionais, incorporam acionamento automático da embreagem e atuadores elétricos (ou eletro-hidráulicos) para efetuar as trocas de marcha automaticamente de acordo com as condições de velocidade, topografia, terreno e carga interpretadas por um módulo eletrônico ou manualmente conforme o operador. No modo automático, por trocar as marchas sempre "no tempo", promove uma redução no consumo de combustível em comparação com modelos equipados com câmbio manual convencional, além de limitar o uso da embreagem às paradas e arrancadas. Alguns caminhoneiros ainda tem o costume de trocar as marchas "no tempo" sem o uso da embreagem, mas tal técnica só deve ser aplicada a câmbios não-sincronizados (como os que servem de base para os automatizados), mas atualmente predominam os sincronizados, que apesar da maior precisão no engate das marchas sofrem desgaste mais acentuado. Portanto, além do prolongamento da vida útil do conjunto de embreagem e redução nas médias de consumo de combustível, ainda ocorre um incremento na durabilidade do próprio câmbio e o custo de eventuais reparos é menor.
Um caso curioso é o da Scania, uma das pioneiras a oferecer câmbios automatizados, que na primeira geração do sistema Opticruise manteve o pedal de embreagem para o uso em arrancadas, paradas e controle fino de manobras, o que sempre me causou estranheza. Apesar de manter tal incoerência nos modelos direcionados a aplicações fora-de-estrada no mercado brasileiro, as versões rodoviárias mais recentes dispensam totalmente o pedal de embreagem. Cabe mencionar um fato que ocorreu comigo a pouco mais de 5 anos atrás, quando um motorista da Empresa Santo Anjo da Guarda me disse que é possível ir de Florianópolis a Porto Alegre ao volante de um Marcopolo Paradiso G6 1550LD montado sobre chassi Scania K124 Opticruise sem usar os pés...

Por mais que alguns operadores e, principalmente, gestores de frotas vejam o câmbio automático como supérfluo, as vantagens operacionais proporcionam vantagens cada vez mais incontestáveis no tocante à rentabilidade...

terça-feira, 20 de novembro de 2012

Breve reflexão sobre motocicletas e preconceito

O mercado motociclístico brasileiro tem um grande volume de vendas, e vem atingindo um estágio evolutivo tão alto que motivou até a conservadora Honda a introduzir localmente alguns modelos como a CBR250 importada da Tailândia e a Transalp já fabricada em Manaus.

O custo operacional reduzido em comparação com um automóvel de desempenho similar favorece a aceitação da motocicleta em diferentes aplicações, como por exemplo em operações policiais, mas ainda assim ocorre uma intensa estigmatização dos motociclistas, não importando se estão numa Honda Biz ou numa Yamaha YZF-R1...
Não é difícil encontrar quem brade aos quatro ventos que as motocicletas deveriam ser extintas, que "todo motoqueiro é irresponsável", aparentemente ignorando as vantagens trazidas pelas motocicletas ao proporcionar grande agilidade na movimentação de pequenas cargas, de pizzas a documentos. Mesmo o maior crítico já se beneficiou do serviço de um motociclista em algum momento...

Para muitos usuários, a motocicleta acaba se mostrando a alternativa mais viável para não depender do transporte coletivo, que não oferece a mesma liberdade na definição dos itinerários. Mesmo quando o custo de manutenção de um carro popular pode ser considerado alto, há alternativas com boa relação custo/benefício entre as motocicletas de baixa cilindrada.

Não é possível ignorar que a condução de motocicletas oferece alguns riscos, tanto pela exposição a diversos elementos quanto pela condução ser um desafio à lei da gravidade, mas a bem da verdade nas mãos de um mau condutor até mesmo um Volvo pode se tornar uma armadilha. E apesar de estar mais vulnerável a acidentes provocados por terceiros, técnicas de pilotagem defensiva acabam por proporcionar mais segurança...

É interessante notar que os usuários de motocicletas mais simples não são os únicos estigmatizados. Mesmo o proprietário de um modelo mais sofisticado como uma Ducati Multistrada ou uma Harley-Davidson Electra Glide, entre outras, pode eventualmente ser apontado pejorativamente como "playboy", partindo de uma visão simplória das motocicletas de alta cilindrada como um mero "brinquedão". Ironicamente, ao tomar por referência tanto a taxa de ocupação média de um automóvel nas grandes cidades, que não raro atinge menos de 2 passageiros por carro, e também as dimensões dos veículos, uma motocicleta pode ser considerada mais eficiente em termos de racionalização da plataforma de carga até mesmo que um automóvel subcompacto.

Na prática do off-road recreativo, eventualmente ocorrem animosidades contra motociclistas, mas de um modo geral julgar o caráter do condutor em função do tipo de veículo é incoerente. Além do mais, o impacto ambiental de uma motocicleta ao longo de toda a vida útil ainda é menor que o de um utilitário 4X4, tanto em função do menor consumo de combustível (e por conseguinte menor emissão de gases poluentes) quanto pela maior simplicidade técnica e menor necessidade de peças de reposição, levando também a um menor custo operacional. A pressão sobre o solo também é menos intensa numa motocicleta, favorecida pela leveza.

Logo, por mais que de vez em quando se demonize as motocicletas, não se pode negar que oferecem algumas qualidades...

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Chevrolet SSR: uma síntese da atração exercida pelas pickups

Ontem tive a oportunidade de observar uma rara Chevrolet SSR que encontra-se à venda em Porto Alegre. Modelo 2006, com um poderoso motor de Corvette, e o design retrô fortemente inspirado na atemporal geração de caminhonetes Chevrolet "Advanced Design", popularmente conhecida como "boca-de-sapo".
Apesar do perfil mais esportivo que utilitário, tanto que a capacidade de carga fica em torno de 611kg e a capacidade de reboque não passa dos 1134kg.

Considerando que atualmente muitos consumidores são atraídos pelas pickups pelos mais diferentes motivos, desde a capacidade de carga até uma eventual motivação cultural como o imaginário do cowboy que sempre esteve associado ao trabalho pesado para o qual as pickups eram originalmente direcionadas, percebe-se na SSR uma síntese dessa atração, ainda que mais particularmente focada no aspecto cultural, tomando as pickups como uma referência elementar do estilo de vida americano (American way of life).

segunda-feira, 5 de novembro de 2012

"Duplagem" de cabines: uma arte quase extinta

Por muito tempo, as pickups foram consideradas essencialmente um veículo de serviço, com poucas opções orientadas ao conforto dos passageiros, mais notadamente cabine dupla. Modelos como a Chevrolet 3100, popularmente conhecida como "Chevrolet Brasil", era um dos poucos que chegaram a oferecer tal opção em tempos mais distantes, numa versão conhecida como Chevrolet Alvorada, que trazia uma interessante configuração de 3 portas. Chupa, Veloster... A versatilidade em trabalhos que exigissem ajudantes era o principal argumento, mas o uso familiar e recreacional também era levado em consideração.

O segmento acabou posteriormente sendo deixado de lado, motivado sobretudo pela introdução de caminhonetes fechadas, como a Chevrolet Veraneio, que além do espaço para passageiros traziam o espaço para carga protegido contra intempéries. No entanto, para alguns usuários era mais interessante a versatilidade proporcionada pela carroceria aberta para a arrumação de algumas cargas mais volumosas. Era o pretexto para que empresas independentes começassem a fazer a "duplagem" de cabines de pick-ups. Teve algum destaque a Brasinca, que já produzia cabines avançadas para os caminhões FNM, e foi credenciada pela Chevrolet para fazer a adaptação de cabine dupla na C-10.
Ainda assim era algo rústico, e a situação das "duplagens" só começou a mudar a partir de 1976 com a imposição de maiores restrições à importação de automóveis, quando passaram a ser oferecidos acabamentos internos mais requintados, grande quantidade de itens de conforto e maior espaço interno, de modo a atender ao menos em parte a demanda reprimida por carros de luxo.

Mesmo modelos como a Chevrolet D-20/C-20/A-20, apesar de oferecerem cabine dupla de fábrica, também eram alvo das adaptações independentes.

Durante o mandato presidencial de José Sarney a "duplagem" teve sua época áurea, favorecida pela isenção do "empréstimo compulsório" que era depositado no Detran durante o licenciamento anual do veículo. Até modelos de pequeno porte como a Ford Pampa podiam ser transformados. As menores restrições impostas a quem desejasse converter uma pick-up compacta para funcionar com óleo diesel também eram um atrativo.

A reabertura das importações em 1990, já durante o governo Collor, abriu espaço para as pick-ups japonesas, com a opção de cabine dupla direto da fábrica. Se por um lado modelos como a Toyota Hilux tinham opções mais limitadas para personalização, passavam a ser vistas como uma boa alternativa em função do custo/benefício numa comparação com as cabines duplas brasileiras produzidas em escala praticamente artesanal.
O segmento sofreu um duro revés, e algumas empresas como a Cia. Santo Amaro, que usava a marca Engerauto, retiraram-se do mercado das "duplagens".
Pode-se dizer que a oferta de versões da Ford F-1000 com a cabine estendida de fábrica pesaram na decisão, visto que a empresa é até hoje um dos distribuidores mais tradicionais da marca americana.

Porém, não se pode afirmar que as "duplagens" estão extintas. Apesar da complicada burocracia dificultar a homologação de modificações em automóveis, ainda há a procura pelo serviço em alguns nichos menos explorados pelos fabricantes, com destaque para as pick-ups compactas que contam com a Fiat Strada e alguns modelos de fabricação chinesa como únicas opções com cabine dupla de fábrica no mercado brasileiro. O consumidor que prefira por uma Ford Courier, por exemplo, tem que recorrer às adaptações.

Até alguns modelos que já ofereceram cabine dupla de fábrica, como a Ford F-250, também despertavam interesse por esse tipo de serviço. No caso da F-250, especificamente, o atraso na disponibilização da cabine dupla direto da fábrica servia como pretexto para a "duplagem"

Mesmo que hoje seja considerado brega, como muitos ícones culturais dos anos 80, a "duplagem" de cabines foi uma interessante alternativa à falta de opções de um período sombrio para o mercado brasileiro, que a atual política tributária ainda ameaça trazer de volta...